Relatório aponta que pessoas em situação de rua são as principais vítimas de violência da GM

Levantamento feito pela Defensoria Pública do Paraná em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) aponta que em abordagens abusivas da Guarda Municipal de Curitiba a maioria das vítimas está em situação de rua

A morte de Joares da Silva, 29, ocorrida na Casa de Passagem de Curitiba nesta terça-feira (07) mais uma vez coloca a Guarda Municipal (GM) sob os holofotes em virtude da violência. Silva, de acordo com informações da própria GM, teria se envolvido em uma confusão no Rebouças, onde fica o abrigo, e agrediu um guarda, que reagiu atirando. O corpo da vítima foi encaminhado para o Instituto Médico-Legal (IML).

Casos como o de Silva, onde a Guarda Municipal de Curitiba emprega métodos violentos contra pessoas em situação de rua, não são raros. Um levantamento feito pela Defensoria Pública do Estado (DPE) em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), divulgado no último mês, aponta que pessoas em situação de rua são as principais vítimas de supostas abordagens abusivas da GM em Curitiba.

Os dados compilam 52 casos de denúncias de violência praticada pela GM entre 2017 e 2022 – partindo de um levantamento feito pelo Plural acerca do assunto. Do total de casos, 40% das vítimas de violência estavam em situação de rua. Já entre os tipos denunciados a agressão física é o mais comum, em 32% dos casos.

Segurança Pública

Para quem vive nas ruas a ação do Estado é uma faca de dois gumes. No caso de Silva, que buscava alimentação na Casa de Passagem que funciona na estrutura do Poder Público, o próprio Poder Público agiu como carrasco.

De acordo com o coordenador do Movimento Nacional de Pessoas em Situação de Rua, Leonildo José Monteiro, há uma inversão sobre o que se deve proteger. “A Guarda Municipal é o ‘cão de guarda’ da sociedade. Ela protege o bem e não a vida. É bem comum fazerem despejos de pessoas em situação de rua e retirarem os pertences e, quando a pessoa reage, apanha”, lamenta.

Não permitir que uma pessoa esteja na rua – um espaço público, portanto de todos – perpassa por questões higienistas. Em setembro deste ano um áudio vazado da presidente da Fundação de Ação Social (FAS) de Curitiba, Maria Alice Erthal, revelou um pedido à GM para que “colocasse medo” em pessoas em situação de rua que vivem no centro da cidade. A fala repercutiu e apesar da gravidade e de pedidos de demissão da presidente, ela segue à frente do cargo.

O modus operandi da GM, de acordo com o coordenador do Núcleo de Práticas Jurídicas da UFPR e responsável pela pesquisa, Leandro Franklin Gorsdorf, tem relação com a organização semelhante com as polícias militares.

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“A nossa proposta é também que seja feita uma revisão da estrutura, para que se reduza a sua militarização e as guardas tenham sua conduta vinculada a uma segurança comunitária e cidadã”, ressalta Gorsdorf.

Em Curitiba a GM está subordinada à Secretaria Municipal de Defesa Social e Trânsito, que é comandada pelo policial militar da reserva, coronel Péricles de Matos.

Recomendações

A DPE entregou o relatório para a direção da Guarda Municipal no último dia 23 de outubro. O coordenador do Núcleo da Cidadania e Direitos Humanos (NUCIDH) da DPE, Antonio Vitor Barbosa, também conversou com membros da Secretaria. A ideia é diminuir a incidência de registros de violência da GM.

Entre as recomendações do documento estão a preferência do uso por armamentos não-letais, ações voltadas exclusivamente para a proteção de bens, serviços e instalações municipais, a reorganização na hierarquia para reduzir a militarização, a criação de uma ouvidoria externa da Guarda Municipal e, entre outros, o uso de câmeras de segurança.

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“Esperamos que as recomendações possam coibir incidentes recorrentes e reduzam o índice de violência por parte da guarda municipal. Em nenhum momento há salvo conduto para atuações truculentas”, destacou Barbosa.

O uso de câmeras corporais enfrenta resistência pelos guardas municipais. Na Câmara Municipal o projeto foi rejeitado em plenário no ano passado, muito embora especialistas apontem a potencialidade na redução de casos de violência e abuso quando há uso do equipamento.

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