Caso Madero: parem de deixar essa gente famosa

Na história de Curitiba as lanchonetes do Durski tem importância minúscula, infinitamente menor que a da Montesquieu, cujo x-Montanha já alimentou milhares de mentes brilhantes

O Brasil, como toda sociedade capitalista, tem o hábito de endeusar quem consegue sucesso financeiro. Uma empresa, um negócio dá certo e pronto: o proprietário começa a ser chamado a opinar sobre tudo. O que, quando se trata de homem branco e rico, não é preciso muito esforço para conseguir.

Esta semana tivemos novos exemplos de falas infelizes do Junior Durski, queridinho das editorias de economia locais pela onipresença das lanchonetes Madero e afins em Curitiba. Não tenho nada contra a Durski e suas marcas.

O problema é que pessoas bem-sucedidas nem sempre são geniais em outras áreas. Às vezes não são nem particularmente geniais na área em que se destacam. E, como vemos neste caso, às vezes externam opiniões absolutamente dispensáveis.

Mas, vejam só, é justamente quando mostram o seu pior que pessoas como o Durski, o veio da Havan ou mesmo nosso “presidente” ganham mais visibilidade. Enquanto escrevo, Durski está na capa do UOL, um dos maiores portais de notícias do país, enquanto o vídeo do homem da Havan fazendo comparações absolutamente esdrúxulas entre Brasil e a Itália ilustra o texto.

Nós aqui do Plural não noticiamos esta última fala do homem do Madero. Mas sei que se tivéssemos noticiado certamente teríamos tido muita audiência. MUITA AUDIÊNCIA mesmo.

A raiva é uma força poderosa. E é em cima dela que toda lógica de viralização funciona. Quanto mais absurda a fala, mais raiva, mais engajamento, cliques, compartilhamentos, audiência e – naqueles sites que vivem disso – dinheiro de anúncios.

O triste é que toda essa raiva cria monstros e … aprendemos (ou não)… elege para a presidência gente completamente incapaz de gerir a própria vida. O que dizer de um país inteiro?

Também aumenta nossa tolerância a absurdos. Se cinco mil mortes dá para relevar, da próxima vez vamos tolerar quantas? Dez mil? Quinze mil?

Na concepção o Plural nunca considerou a receita de anúncios programáticos (aqueles que funcionam no mesmo modelo do Google Adsense de leilões simultâneos) entre suas principais estratégias de receita. Estamos, sim, insistindo em nos manter com assinaturas. (Quer nos ajudar a continuar esse trabalho? Clique aqui).

Nessa lógica que seguimos, a audiência que podíamos ter com as falas absurdas de um ou outro Durski é irrelevante. O que importa é o que está afetando ou pode afetar nosso leitor, é de interesse dele, mesmo que ele ainda não saiba.

Por isso que nós conseguimos ter tempo e condições de antecipar que a Sanepar está racionando água em Curitiba, já alertamos para a situação das UTIs na cidade e estamos diariamente lutando para aliviar um pouco da angústia de uma comunidade assustada com a pandemia, mas unida.

Mas também temos a obrigação moral de dizer o seguinte: temos que parar de deixar famosa gente que não tem nada a acrescentar. Porque, além do absurdo de relevar “5000 ou 7000 mortes”, o fato é que o Durski, o veio da Havan e mesmo nosso “presidente” se mostraram sem condições intelectuais de participar do debate.

Suas ideias são rasas, são limitadas, são isentas de qualquer raciocínio maduro que se espera de um homem adulto e, supostamente, escolarizado. O Brasil tem milhões de pessoas trabalhando desde o início da crise, reinventando negócios, se adaptando, propondo soluções, inclusive para a grave crise econômica que já estava instalada e que vai piorar.

Há muitos empresários e empresárias tão ou mais bem-sucedidos que esses dois e que, de fato, estão contribuindo com o país. Mas a sociedade, principalmente graças a maneira peculiar como as redes sociais nos fazem lidar com a informação, se mobiliza em torno de um ou dois que nem deveriam estar na mesa dos adultos.

Na história de Curitiba, com suas universidades, suas empresas, seu povo, as lanchonetes do Durski tem importância minúscula, infinitamente menor que a da Montesquieu, cujo x-Montanha já alimentou milhares de mentes brilhantes.

É hora de valorizar a inteligência e a criatividade. É hora de reconhecer a importância da opinião qualificada, do especialista. É hora de ouvir quem está liderando a luta para conter a pandemia no país (notadamente prefeitos, governadores e profissionais da saúde).

E é hora de relegar o irrelevante ao esquecimento. Junior Durski é irrelevante. O veio da Havan é irrelevante. Bolsonaro é irrelevante. O Brasil é grande demais para esse gente pequenininha.

Dar voz e atenção para quem não tem o que falar é desdenhar do talento e da inteligência que abundam no país, a despeito das dificuldades. Que a gente possa resistir ao impulso da raiva e lembrar disso.

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