Mulher trans é agredida verbalmente em Condor de Curitiba

Episódio aconteceu no dia 22 de junho, em um supermercado no bairro do Xaxim, e foi denunciado ao Ministério Público do Paraná

No dia 22 de junho, a servidora da Caixa Econômica Federal Sheylla Goudiny, de 26 anos, foi atacada e constrangida publicamente por uma cliente e um funcionário de um supermercado da rede Condor, em Curitiba. Mulher transgênera, Goudiny foi impedida de utilizar o banheiro feminino do estabelecimento. Os acusados não foram identificados até o momento.

Condor

Goudiny é de Igarassu (PE), mas mora na capital paranaense há cinco meses. Ela conta que normalmente faz compras no Condor da Rua Francisco Derosso, no bairro do Xaxim, onde foi hostilizada, pois o mercado fica ao lado do local em que trabalha. “Nunca havia tido problemas lá antes”, diz.

Sheylla Goudiny é natural de Igarassu, Pernambuco, mas vive em Curitiba desde fevereiro deste ano. (Foto: Arquivo pessoal

No dia 22, uma quinta-feira, por volta das 19h20, Goudiny saiu do caixa após pagar pelas compras e se dirigiu ao banheiro feminino do estabelecimento. “Entrei e tinha outras mulheres lá também. Ninguém se preocupou ou se incomodou com a minha presença.”

Foi quando uma mulher que estava do lado de fora abriu a porta e olhou para a servidora da Caixa. “Eu vi que ela não gostou que eu entrei ali”. A mulher saiu e logo em seguida uma funcionária da limpeza do supermercado entrou chorando no banheiro. “Ela me disse: ‘Moça, tem uma mulher lá fora fazendo o maior barulho porque você está aqui dentro do banheiro e eu não sei nem o que dizer para você porque ela falou palavras horríveis'”, conta.

Goudiny então telefonou no Disque 100 – serviço que atende denúncias sobre violações de direitos que acabaram de ocorrer ou que ainda estão em curso – para denunciar o caso de transfobia e solicitar uma viatura no local. Durante a ligação, ela foi abordada por um funcionário do Condor pedindo que ela se retirasse pois estava incomodando a outra mulher. “Foi quando peguei o celular e comecei a filmar.”

Supermercado Condor da Rua Francisco Derosso, no bairro do Xaxim, em Curitiba. (Imagem: Reprodução/Google Maps)

“Não é seu direito entrar. Eu tenho direito, meu direito não é maior que o seu e nem o seu é maior que o meu. Você nasceu homem, eu nasci mulher. Então se está discriminado aqui, cada um usa o seu. Tenho certeza disso. Minha filha tem o direito de usar banheiro junto com um homem?”, disse a agressora. “Você não é feminina, você quer ser feminina, mas você não nasceu feminina.”

“O rapaz do Condor falou que eu estava constrangendo ela e pediu que eu me retirasse do supermercado. Sempre se referindo a mim no masculino, ele pediu um papel onde comprovasse que eu tinha direito de entrar no banheiro feminino. Não quis ver meu documento, nem nada”, relata Goudiny.

“Mostra para mim, você tem uma lei específica que você pode usar o banheiro?”, questiona o funcionário do Condor.

“Ninguém do supermercado me deu acolhimento em momento nenhum, ficaram sempre com ela. Eu fiquei abandonada sozinha na porta do mercado. Alguns clientes foram lá me abraçar perguntar se estava tudo bem, e me defender.”

Quando a viatura chegou ao local, Goudiny foi atendida do lado de fora por dois policiais, que pegaram seu nome completo e número de telefone. Enquanto isso, o terceiro oficial conversava com a agressora. “Eles [os policiais] disseram que iriam abrir uma ocorrência. Perguntei se poderiam me deixar na delegacia, mas disseram que não precisava comparecer à delegacia, que só com o telefone ele faria a ocorrência e entraria em contato comigo. Me liberou e falou para eu ir para casa.” 

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“Eu quero que esse caso seja resolvido e que o supermercado seja processado. Eu não tirei o direito de ninguém ao tentar usar o banheiro. Eu deveria ser tratada da forma correta tal como qualquer outro cliente consumidor. Sou mulher e quero ser tratada como mulher. Eu quero ter meus direitos respeitados”, afirma Goudiny.

Procurado, o supermercado Condor afirmou que “lamenta profundamente o embate entre clientes em função do uso do banheiro e destaca que possui profundo respeito por todos, independente de gênero”. Em nota, disse que “a questão da utilização de banheiros é um tema extremamente complexo” e que “espera que o STF [Supremo Tribunal Federal] possa desempenhar seu papel primordial e solucionar o conflito social existente”. 

Denúncia

Na última quinta-feira (29), o mandato da deputada federal Erika Hilton (PSOL/SP) protocolou uma denúncia no Ministério Público do Paraná (MPPR) visando a investigação e responsabilização da Rede de Supermercados Condor e da consumidora que atacou Sheylla. 

Ao Plural, o MPPR informou que a Promotoria de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos de Curitiba instaurou um procedimento para apuração dos fatos (Notícia de Fato 0046.23.107031-2).

A Polícia Civil do Paraná foi procurada, mas não encontrou a ocorrência no sistema. Em caso de atualização, o texto será alterado.

Transfobia

Os crimes de homofobia e transfobia passaram a ser enquadrados na Lei de Racismo em 2019, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). No entendimento da Corte, condutas que “envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém”, são consideradas crime.

A pena varia de um a três anos de prisão, além de multa, podendo chegar a cinco anos de reclusão em caso de ampla divulgação do ato.

Nota do Supermercado Condor

Sobre o ocorrido, a rede lamenta profundamente o embate entre clientes em função do uso do banheiro e destaca que possui profundo respeito por todos, independente de gênero. Contudo, a questão da utilização de banheiros é um tema extremamente complexo, vivenciado pelos mais diversos setores da economia (órgãos públicos, shoppings, restaurantes, cinemas, entre outros), no Brasil e no mundo. Tanto, que o STF está analisando o tema em sede de repercussão geral desde 2015 e ainda não conseguiram definir a questão. A rede reafirma seu compromisso e respeito a todos e espera que o STF possa desempenhar seu papel primordial e solucionar o conflito social existente.

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