A delícia de ler Marcos Pamplona

Livro reúne crônicas sobre vida em Portugal publicadas originalmente no Plural

Ainda me lembro quando o Maurício Ramos, publicitário, me indicou o Marcos Pamplona para escrever no Plural. Disse que o sujeito tinha um texto maravilhoso, fiquei até um pouco com medo. Mas como sou cara de pau, fiz contato e me apresentei. O Marcos já tinha feito coisas bem impressionantes, e o Plural era um embrião, mas ele foi de cara super receptivo. Pensei que ele ia querer escrever sobre publicidade, sei lá. Mas não: falou que queria escrever crônicas. Achei bacana.

Quando chegou a primeira fiquei de queixo caído. Como podia aquele homem não estar sendo lido e comentado em todo lugar. Mas, vá lá, podia ser sorte. Não: os textos se seguiam e vinham cada vez melhores, mais interessantes, mais bonitos. Um dia ele me escreveu e falou que estava indo pra Portugal, mas que continuaria a escrever de lá. E aí começou a série mais sensacional de textos.

Hoje, mais de dois anos depois, as crônicas do Marcos viraram um livro pela Kotter, editora curitibana em que ele trabalha. O volume se chama “Ninguém nos salvará de nós” e conta com os textos que ele foi produzindo ao longo dessa vida portuguesa. Eu continuo me chocando com a qualidade das crônicas e de tudo que ele escreve. E dessa vez entrei em contato pedindo por favor pra ele falar um pouco sobre o livro.

Você teve uma carreira como publicitário, hoje está no mundo editorial, e agora também é cronista. O que parece unir tudo isso é o amor pela palavra. É esse mesmo o teu prazer?

Já fui professor, revisor, publicitário, roteirista e hoje sou editor. São trabalhos que exerci e exerço em troca de salário, com a incômoda noção do tempo despendido e algum senso de ultraje. Não colocaria, portanto, o fato de ser cronista como parte da minha “carreira”. Aos treze anos descobri que podia transformar umas canções que inventava em poemas. Desde então, quando escrevo estou em outro tempo. Este é, sem dúvida, o tempo sem ponteiros da não obrigação, do amor pelo que faço, por mais que algumas angústias estejam aí envolvidas.

Você escreve hoje crônicas sobre tua vida (recente) em Portugal. Conta como você foi parar aí.

Vim para Portugal para me afastar, até onde era possível, de meu país e de mim mesmo. Os dois, naquele momento, estavam submersos em relações tóxicas, autodestrutivas. Escolhi Portugal por causa da língua e das afinidades culturais, tais como um certo desdém pela ordem e pelo progresso que me interessa muito, para desenvolver outras coisas menos opressivas.

Teus textos antes de tudo são um prazer pela linguagem. Mas sempre tem também a descoberta: do país, da cultura, das pessoas… O que você descobriu em Portugal que te motivou a escrever?

Como disse, escrevo desde os treze anos. Um elemento de espanto, ligado talvez à nossa finitude e à assombrosa casualidade da vida, esteve presente em tudo que rabisquei desde a adolescência. Portugal não me ofereceu maiores descobertas do que, por exemplo, Timbó, outro lugar onde vivi. Tenho, sempre tive a sensação subliminar de que o mundo todo é um lugar estrangeiro. Passo por ele e, ao mesmo tempo em que se renova a curiosidade, cresce o desconforto de estar sempre de passagem.

Às vezes seus textos são bem confidenciais. Mas sem nunca esbarrar num “Diário”. Como você lida com esses temas tão pessoais?

Os fatos que vivemos, aqueles que poderiam ser registrados num “Diário”, me interessam apenas como trampolim para mergulhar em algo interno a eles, em sua face menos visível. Busco aqueles momentos em que as palavras parecem entrar em osmose com o silêncio. Nessa busca (em que encontrar seria o mesmo que morrer), a melhor fonte de pesquisa que tenho sou eu mesmo. E não me vejo melhor nem pior do que os outros a ponto de me sentir constrangido por servir de exemplo de nossas enormes limitações e eventuais grandezas. 

O que você pretende fazer em seguida como escritor, agora que esse caminho parece cada vez mais claro? 

Fora das atribulações cotidianas, na vivência da escrita, nunca sei exatamente o que vou fazer em seguida. Nem, ao fazê-lo, meu caminho me parece mais claro. Poderia silenciar amanhã ou iniciar uma obra caudalosa. Não sei, prefiro não sabê-lo. Gosto de me postar diante do futuro como me sento diante de uma página em branco. 

Ninguém nos Salvará de Nós, de Marcos Pamplona. Editora Kotter, 120 páginas, R$ 31,70.

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima