Faltam equipes de saúde para assumir mais leitos

Com ocupação de 95%, Curitiba planeja expandir vagas, mas não tem profissionais suficientes

Horas e horas na espera de um leito, transferências entre UPAs e hospitais para achar um leito de UTI. E muitas vezes esse leito não é encontrado ou chega tarde demais. Essa foi a situação que uma família de São José dos Pinhais, Região Metropolitana de Curitiba (RMC), enfrentou na última semana. “Ele ficou seis horas na ambulância esperando um leito. Não conseguiram e precisaram intubar. Ficou dois dias na UPA Rui Barbosa e acabou não resistindo”, lamenta o empresário Vagner Gasola, que perdeu o tio.

O caso exemplifica o colapso já percebido pelo sistema de saúde de Curitiba, que planeja a transferência de doentes para cidades do interior paranaense. Nesta quinta-feira (3), eram apenas 27 leitos livres na RMC. A criação de mais vagas, segundo profissionais da área, não resolveria o problema, porque não há pessoal suficiente para assumir o cuidado de novos pacientes.

Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa), os leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) têm ocupação de 95% em Curitiba. São quatro hospitais sem vagas: Hospital Erasto, Hospital São Vicente, Hospital Evangélico e Hospital do Idoso.

A falta de infraestrutura e equipes foi assumida pelo secretário estadual de Saúde na última terça-feira (1) ao anunciar um toque de recolher em todo o Estado durante a madrugada (das 23h às 5h). “Não temos mais equipes”, disse em entrevista ao Bom Dia Paraná, na ocasião. Além disso, o decreto informava que não havia mais como expandir a Rede por “falta de recursos humanos, insumos e equipamentos”.

O colapso eminente

Outra questão admitida pelo próprio governo é que o colapso está próximo. E essa percepção é reforçada pelas condições de trabalho das equipes médicas e de enfermagem. Assim como em julho, o Paraná encontra dificuldades em manter os trabalhadores e substituir aqueles que foram infectados e precisam se afastar dos hospitais e unidades de saúde.

“Os profissionais de enfermagem estão exaustos, as condições de trabalho são ruins e o risco é enorme”, diz Simone Peruzzo, presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Paraná (Coren-PR) e enfermeira do Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR). “Além disso, muitos profissionais não querem trabalhar com Covid-19 e os motivos são válidos, é preciso admitir isso.”

Entre algumas das situações que afastam os profissionais de enfermagem do tratamento do coronavírus está o fato de que os enfermeiros e técnicos, muitas vezes, trabalham com contrato temporário, não recebem o máximo da insalubridade, ou seja 40% do salário mínimo, trabalham longas horas com o risco de se contaminar, morrer ou ficar com sérias sequelas, como é comum entre sobreviventes da Covid-19. Desde o início da pandemia, 39 enfermeiros e enfermeiras morreram por causa do coronavírus no Paraná, segundo o Coren. Infectados foram 17.850.

“Na UTI, não há mais enfermeiros para cuidar de apenas um paciente de Covid-19, que precisa de atenção 24 horas, como devia ser. Cada profissional cuida de três. E não há nenhum reconhecimento, financeiro ou de cuidado, por parte dos governantes para mudar essa situação”, relata a presidente.

Os médicos e médicas estão em situação de esgotamento similar. O longo período lidando com a pandemia, e o cuidado prolongado que os infectados com Covid-19 precisam enfrentar, dificulta muito o atendimento. Nesse momento, os profissionais temem que muitos não consigam atendimento e morram sem assistência. Por isso, fazem um apelo para que o distanciamento social seja fortalecido e o fluxo de pacientes possa diminuir.

“Aumentou muito a demanda de atendimento. Tem vaga para mais médicos mas não há profissional disponível, principalmente com a qualificação necessária. Além disso ainda há os colegas que se afastam porque ficam doentes e os pacientes cada vez mais graves, o que deixa os plantões e o clima de trabalho mais pesados”, relata um médico do Hospital Evangélico.

Sem profissionais, sem leitos

As condições de trabalho na área da saúde indicam que a criação de leitos extras, por mais que pareçam ser a solução imediata, não vão realmente resolver a crise de saúde pública no Estado. “É uma ilusão”, diz a enfermeira. “Leitos sozinhos não significam nada se não há profissionais para fazer o atendimento. Não temos essa capacidade no momento.”

Quem vivencia essa realidade sente a falta de profissionais e seus efeitos, como Gasola, que perdeu o tio. “A área de saúde não dá conta das demandas diárias; ao ter um evento deste tamanho, era óbvio o colapso.”

Uma situação que parece cada vez mais próxima. “O trabalhador de saúde está esgotado física e emocionalmente. Nós somos humanos também, e estamos nisso há meses. Por isso a conscientização e o distanciamento social são essenciais. É difícil dizer isso, não é simpático, mas todos somos responsáveis por essa situação. E aqueles que  saem sem máscara ou esquecem do distanciamento porque acham que a pandemia acabou são os culpados”, afirma Perudszzo.

Covid no Paraná

O número de novos casos nas últimas 24h no Paraná foi de 2,6 mil, somando um total de 291,2 mil. Também foram registradas 75 mortes, em um total de 2,6 mil desde o início da pandemia no Estado. Em Curitiba, foram 1.380 novos casos, com 86,6 mil no total, e mais 13 mortes, somando 1.788 óbitos.

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