Muriel Barbery escreve prosa florida no livro “Uma rosa só”

Faz sentido se você pensar que a protagonista da história é uma botânica chamada Rose, que viaja a Kyoto para ouvir o testamento do pai que pouco conhecia

“Uma rosa só”, de Muriel Barbery, é um livro com metáforas floridas. Faz sentido, se você pensar que a protagonista da história é uma botânica de nome Rose. Ela tem 40 anos, é solitária e parece irritada com frequência. Sabemos apenas que “um dia, como se perde um lenço, ela perdera sua disposição à felicidade”.

Na história, Rose viaja da França ao Japão, mais especificamente a Kyoto, para ouvir a leitura do testamento do pai, um rico negociante de arte que se manteve distante da filha a vida inteira. (Mais tarde fica claro que ele estava obedecendo as regras impostas pela mãe de Rose, mas, mesmo distante, procurou se manter atualizado sobre a vida da filha.)

A beleza dos jardins de Kyoto irrita Rose, um sinal de que as coisas não vão bem na sua vida. “As azaleias exibiam em fogos de artifício estrelados suas pétalas rosa e malva”, descreve a narradora da história, que acompanha o ponto de vista da personagem principal sem nunca se meter na vida dela. “Ao pé das lanternas de pedra, as hostas jorravam do mesmo musgo raso e aveludado que se via por todo lado.”

Uma leitora (ou leitor) mais intolerante pode observar que irritantes mesmo são as descrições rebuscadas do livro e algumas escolhas estilísticas que a autora faz. “Uma rosa só” é o tipo de romance em que as pessoas não olham para o rosto de alguém, elas “escrutam as feições” de alguém; em que a protagonista gostaria de “dissolver-se num abrasamento de madeira perfumada, num sonho de pétalas e nuvens”.

Muriel Barbery

Dizem que é fácil ridicularizar qualquer livro se você pinçar um trecho aleatório e apresentá-lo fora de contexto. Isso até pode ser verdade, mas não é o caso aqui. Porque são as descrições mais elementares (sem contexto necessário) que parecem pedantes e, às vezes, não significam coisa nenhuma. Como esta, que abre um capítulo no meio do livro: “De manhã, chovia. As montanhas do leste fumegavam brumas erguidas sobre um céu diáfano, o rio estava ensurdecido de aguaceiros. Na manhã pálida, no insondável quadro cinza atravessado de fantasmas, o céu e a água se fundiam e se consumiam num mesmo fim”.

Apesar disso, ou por causa disso, Muriel Barbery é uma autora best-seller na França. Seu livro “A elegância do ouriço” vendeu algo como 3 milhões de exemplares, uma proeza de respeito no mesmo país que levou tempo para dar o devido valor à Annie Ernaux.

Vida possível

Uma vez no Japão, Rose é ciceroneada por um homem chamado Paul, um belga fluente em japonês que atuava como braço direto de Haru, pai da personagem. Além de Paul, há também uma mulher que cuida da casa e um motorista que a leva para conhecer vários templos da região, com e sem a companhia de Paul. A certa altura da história, surgem alguns artistas que conheciam Haru, mas nenhum deles desempenha papel importante na história.

Entre uma visita e outra aos templos de Kyoto, Rose vai sabendo um pouco mais sobre o pai que mal conhecia e sobre Paul, que tem interesse em conhecer. A falta de rumo na vida da personagem vai, aos poucos, dando lugar a uma nova vida possível, embora não se saiba que vida seja essa até quase o fim do livro.

Livro

“Uma rosa só”, de Muriel Barbery. Tradução de Rosa Freire d’Aguiar. Companhia das Letras, 176 páginas, R$ 49,90. Romance.

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima