Curitiba assume “lanterna” na cobertura de agentes comunitários na pandemia

Profissionais atendem diretamente a população, auxiliando na conscientização sobre cuidados e vacinas

A Atenção Primária de Curitiba merece um olhar especial e minucioso. Ele vem dos agentes comunitários de saúde (ACS), que na Capital paranaense são suficientes para atender apenas 15,44% da população, o menor índice entre todas as Capitais. No topo do ranking, Campo Grande (MS), João Pessoa (PB) e Teresina (PI) destoam com, respectivamente, 98,89%, 95,74% e 88,56% de atendidos proporcionalmente.

Os dados são do Ministério da Saúde (MS) e apontam que, mais do que assistência, estes profissionais exercem papel estratégico no enfrentamento à Covid-19 e na campanha de vacinação contra a pandemia – recém-iniciada em todo o país com sinais de fragilidade.

Num cenário de encolhimento das equipes de Saúde da Família , e de fôlego à terceirização de atividades da área, o município aparece como lanterna, entre as Capitais, na inclusão de agentes comunitários de saúde aos serviços de atendimento à população.

De acordo com dados do e-Gestor, sistema do Governo Federal que congrega dados sobre a Atenção Básica no Sistema Único de Saúde (SUS), Curitiba tinha elencado, em novembro de 2020, 519 agentes comunitários – 27 a menos do que os 546 relacionados no Relatório de Gestão do mesmo ano, organizado pela Secretaria Municipal da Saúde (SMS), mas com informações de maio a agosto.

A compilação mostra ainda que, entre 2007 e 2020, Curitiba perdeu 45% de seu quadro de agentes comunitários de saúde. O melhor desempenho da Capital foi em maio de 2008, quando 1.142 trabalhadores estavam vinculados à Prefeitura. Por outro lado, o menor número foi atingido em janeiro de 2020, com apenas 380 em atividade – quantidade que só foi incrementada com a contratação de 244 novos profissionais após o início da pandemia.

Parte do enfraquecimento da categoria se explica pelo cumprimento, entre 2014 e 2016, da emenda constitucional 51, que submeteu o cargo de agentes de saúde à realização de processos seletivos. Por um bom tempo, Curitiba trabalhou com profissionais incorporados ao Instituto Pró-Cidadania de Curitiba (IPCC), associação sem fins lucrativos prestadora de serviços. Dos cerca dos mil ACSs atuantes via IPCC na época, apenas 300 puderam migrar para o quadro próprio da Prefeitura conforme previa a lei, e o restante, por não cumprir requisitos, foi desligado.

Desde então, não houve equiparação mas alguns foram convocados diante dos cenários críticos que se desenrolaram com o avançar da crise do coronavírus na Cidade. “A Secretaria de Administração e de Gestão de Pessoal informa que em 2020 foram contratados 143 agentes comunitários de saúde, que participaram do processo seletivo público realizado em 2015. Foram convocados 300 candidatos aprovados, mas nem todos compareceram.”

Acompanhamento minucioso

Peças-chave no combate a doenças endêmicas, os agentes passaram a atender demandas específicas em todo o país, com foco em uma vigilância ativa e no auxílio a ações para frear a disseminação do vírus. Além disso, voltaram-se ao acompanhamento minucioso de pacientes com doenças crônicas, cujos tratamentos ficaram ameaçados diante do isolamento social e do temor de contaminação.

Agora, com a chegada das vacinas – ainda em estoque bastante restrito e com planos que abrem brecha para descontroles – , a falta de um quadro completo deve pesar mais.

No Paraná, a implantação do Monitoramento Rápido de Cobertura Vacinal (MRCV), complementar à lei que determinou a obrigatoriedade da apresentação da carteira vacinal para a matrícula escolar, deu destaque à função dos agentes comunitários nas campanhas de imunização.

E em um contexto de “infodemia” – termo utilizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a disseminação de teorias da conspiração, fake news e outros conteúdos mentirosos a respeito da vacina contra o vírus Sars-CoV-2 -, os agentes comunitários da saúde nunca foram tão necessários, afirma a presidenta do Sindicato dos Agentes Comunitários de Saúde do Paraná (Sindacs/PR), Ondna Rodrigues Macedo.

Segundo ela, por meio do contato direto com a comunidade, os agentes conseguem acompanhar mais de perto e continuamente a população, o que aumenta a eficácia das políticas públicas e das ações da área.

“Essa onda de fake news deixa as pessoas assustadas, principalmente as mais vulneráveis, que têm menos acesso à informação”, ressalta Ondna. “Por terem acesso às casas e compartilharem vínculos com a população, os agentes têm mais credibilidade e conseguem conduzir mais facilmente os protocolos, dizendo o que realmente é e como funciona a vacina.”

Trabalho árduo

O “Guia Orientador para o enfrentamento da pandemia Covid-19 na Rede de Atenção à Saúde“, elaborado pelo Conselho Nacinal de Secretarias Municipais (Conasems) em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), reforça que a atuação dos agentes comunitários de saúde nesse momento de pandemia é “fundamental para auxiliar na contenção da transmissão do vírus, difundindo informações adequadas e apoiando a identificação e a vigilância ativa, para o cuidado das pessoas e grupos de risco no seu território […]”. 

No entanto, transmitir informações adequadas e verídicas sobre a vacina contra o coronavírus em um cenário no qual 17% dos brasileiros dizem não ter intenção de se vacinar é um trabalho árduo. Os dados são do último levantamento realizado pelo Datafolha entre os dias 20 e 21 de janeiro com 2.030 pessoas.

“A nossa profissão é prevenção. Procuramos mostrar o benefício que a vacina vai ter, mas não é tão simples”, explica Rosângela Erzirio, que atua há 18 anos como agente comunitária na Unidade de Saúde Santa Cândida, em Curitiba

A profissional acredita que a disseminação de notícias falsas pode prejudicar a campanha. Ela relata que muitas pessoas que tinham vontade de se imunizar, hoje não querem por conta do medo gerado por publicações na internet – principalmente os mais jovens.

“Tem muitos que estão achando que vão virar jacaré. Outros acham que vão tomar a vacina de manhã e de tarde já não vão precisar usar máscaras. É bem complicado”.

Rosângela e a equipe na recepção da Unidade de Saúde Santa Cândida, em 2021. Foto: Arquivo Pessoal

Milena Silva, de 67 anos, é uma das idosas que espera empolgada o dia que poderá sair de casa segura novamente. A costureira aposentada conta que é atendida pela equipe de Rosângela há vários anos. “Para mim ela é como uma mãe.” 

A sexagenária diz que foi alertada por Rosângela sobre as possíveis fake news acerca da vacina contra a Covid-19, mas ficou tranquila sabendo que a agente estaria disponível sempre que ela precisasse de alguma informação. “Ela disse: ‘Qualquer dúvida você me liga que eu te explico, não importa a hora'”, conta.

Ao contrário da mãe de 97 anos, que mora em Campinas, São Paulo, Milena não vê a hora de se imunizar. “O dia que der para eu tomar a vacina, eu quero ir bem cedo, para ser a primeira da fila”, brinca a aposentada. 

Assim como Rosângela, Florinda Mastrocola, que tem 21 anos de atuação como agente comunitária na Unidade de Saúde Santa Efigênia, no Boa Vista, em Curitiba, acredita que uma forma de combater as fake news a respeito da vacinação é justamente a orientação feita “olho no olho”. “É o nosso contato frequente com as comunidades que gera confiança nas informações que repassamos”, afirma.

Colaborou: Maria Cecília Zarpelon


Sobre o/a autor/a

1 comentário em “Curitiba assume “lanterna” na cobertura de agentes comunitários na pandemia”

  1. Parabéns a essas, esses profissionais, que estão levando informação às populações mais expostas ao descalabro de fake news!
    Pena que nossos representantes sejam tão pró neoliberalismo.

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