Mano Cappu lança “G.R.I.T.O.” contra o racismo

Em parceria com a cantora Lua D’Avila, artista curitibano canta sobre questões do passado e do presente: “não trago uma superação, trago uma denúncia”

Rodrigo Pinheiro, mais conhecido como Mano Cappu, é um curitibano de 32 anos. Nascido e criado na Cidade Industrial de Curitiba (CIC), o artista transita entre música e cinema: tem single, EP, já escreveu roteiro, atuou em série para streaming. Com o lançamento do single “G.R.I.T.O”, composto em parceria com a cantora Lua D’Avila, Cappu começa a mostrar um pouco do trabalho que desenvolveu para seu primeiro álbum “UFA”, que deve sair em 2021. 

Cantando sobre o racismo, Cappu e Lua mesclam questões históricas como a escravização de africanos, e a retomada de figuras apagadas pela narrativa branca do passado, como o jangadeiro Francisco José do Nascimento, mais conhecido como “Dragão do Mar”. Eles abordam também o racismo mais atual, velado, que se diz não racista por viver com negros, ou por não ter escravizado ninguém. “Se a pessoa não comete atos racistas, isso não significa que ela acabou com o racismo. A subjetividade dessa pessoa não resolve o problema do racismo”, diz Cappu ao falar das provocações de sua música. 

Cantada e escrita a partir do ponto de vista de um homem e de uma mulher negros em uma sociedade racista, “G.R.I.T.O.” é uma denúncia em forma de arte, uma maneira de tentar alcançar as pessoas. O problema, para o artista, está na forma como estamos estruturados enquanto sociedade, não nas atitudes individuais de cada um. “Acorrentaram minhas mãos, mas o meu grito vão ouvir”, canta Lua. 

Apesar do tema específico do single, o álbum falará também de amor, dependência química e sobre o tempo que Cappu passou preso injustamente. Serão onze faixas. “Ele vai ser feito de uma forma diferente, quero que a pessoa compre porque vai comprar uma obra de arte”, diz o artista sem revelar mais detalhes sobre o projeto. A princípio, o lançamento seria em 2020, mas acabou adiado por causa da pandemia. “Tivemos que adiar, mas fiz isso com serenidade, entendendo que esse não é o momento de lançar, mas de produzir”, diz Cappu.

“Não me desvisto do negro”

Cappu foi atraído pelo rap em 1998, quando ainda era menino e viu pela primeira vez o clipe “Diário de um detento”, dos Racionais. Mas sua atuação dentro do hip hop só começaria mais tarde, aos 15 anos, convidado a cantar as composições de um amigo. Um ano depois, aos 16, compôs suas primeiras músicas. 

Single carrega na letra vivência negra em Curitiba. Foto: Isabella Lanave

O refrão de uma das canções do seu primeiro EP, lançado em 2014, foi criado na adolescência e já falava sobre as violências do racismo. “Maloqueiro perseguido em Curitiba o meu escudo é a rima”, diz um dos versos. 

O artista lembra que chegava a ser barrado nos shoppings de Curitiba. “Por trajar calça larga, boné, camiseta grande, as pessoas acham que conhecem ‘o nosso tipo’. Vivem nesse achismo”, afirma. Hoje, ele se sente mais livre para explorar estéticas diferentes, mas entende que não importam as roupas que usa, o racismo segue existindo. “Por mais que eu vá me vestir de outras formas, eu não me desvisto do negro”, afirma. 

Foi por meio do rap que Cappu passou a se entender melhor enquanto negro, se empoderou e chegou a outras referências negras. “Se a gente não olhar para isso, não nos entendemos como ser humanos dentro da sociedade. Quando eu tinha 15 anos achava que era minha roupa, mas era racismo”, diz. 

A busca por conhecimento também veio em meio à sua passagem pelo sistema prisional. Acusado injustamente, Cappu passou 18 meses preso por um crime que não cometeu. Foi inocentado seis anos após sua prisão. Durante o encarceramento, foram mais de 40 livros lidos em uma tentativa de não ceder às pressões do ambiente. “As pessoas gostam de falar que isso é uma superação, mas eu não sou coach. É uma denúncia: o sistema fez de tudo para transformar o Rodrigo, o Mano Cappu, em um criminoso”, diz o artista. 

O episódio, no entanto, se tornou um motor para sua atuação no mundo: passou a dar palestras, pesquisar o tema e está escrevendo um livro sobre a experiência dentro do sistema carcerário paranaense. “Não quero só contar a minha história, por mais que ela seja forte, quero trazer dados”, afirma Mano Cappu, que hoje entende que no estudo existe uma questão de sobrevivência e a única possibilidade de melhora. “Não trago romantismo, não trago uma superação, trago uma denúncia”, diz o artista sobre a sua vivência – uma afirmação que abarca tudo o que faz.

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