Cristina Bresser de Campos se alterna entre o cômico e o comovente

Com "Tempo de jabuticaba", escritora consegue criar cenas impactantes ou vidas inteiras no espaço breve do conto

Os contos do livro “Tempo de jabuticaba”, de Cristina Bresser de Campos, podem ser muito breves como “Vestir-se”: um parágrafo de sete linhas que descreve uma cena e termina rápido e forte como uma pancada. Ou podem conter a vida inteira de uma mulher em pouco mais de uma dúzia de páginas, como no conto que dá nome ao livro.

“As histórias de Cristina Bresser por vezes dão essa sensação de um clássico ‘cenas da vida privada’: quase se leem como crônicas de uma visita guiada a certa intimidade”, escreve o jornalista Christian Schwartz, na orelha do livro.

Cristina Bresser de Campos

“Tempo de jabuticaba” é a primeira antologia de narrativas curtas de Cristina, que já escreveu dois romances e conquistou prêmios literários nos gêneros de contos e crônicas. Na entrevista a seguir, ela fala sobre seu livro novo e suas influências, e sobre como lida com a ansiedade ao escrever. 

Sem se preocupar em dar uma sinopse, você diria que o seu livro fala sobre o quê?
“Tempo de jabuticaba” é meu primeiro livro de contos (tenho dois romances e um livro de crônicas, publicados anteriormente). As histórias, normalmente contadas pelos próprios personagens, abarcam um painel familiar diverso que, através de uma linha do tempo não explícita, transmite a noção de conjunto.

Os personagens (apesar de funcionarem bem de forma autônoma) são apresentados em sequência,  o que enriquece a composição narrativa. São relatos peculiares, que se alternam entre cenas cômicas e cenas comoventes.

Na literatura, quais são suas maiores influências? E como essas obras e autores influenciaram você?
Comecei a ler aos cinco anos, com a coleção do Monteiro Lobato, e não parei mais. Ao contrário de alguns colegas da escola, eu adorava as leituras que os professores nos encarregavam durante as férias, que incluíam José de Alencar, Machado de Assis (meu favorito sempre foi “Dom Casmurro”), José Mauro de Vasconcelos, e outros. Adolescente, li todos os livros da Agatha Christie.

Na juventude, me emocionei com Hemingway e com a Jane Austen, me surpreendi com Orwell e me obriguei a terminar a leitura dos Irmãos Karamazov (e aí, passei a admirar Dostoiévski). Já adulta, me apaixonei pelos romances do Milan Kundera, do Haruki Murakami e do Milton Hatoum.

Há anos sou fã da literatura brasileira contemporânea: Carola Saavedra, Michel Laub, Rodrigo Lacerda, Carol Bensimon, Maria Valéria Rezende, Ivana Arruda Leite, Carla Madeira, Luci Collin, Cézar Tridapalli. Um livro que me impactou muito e que me influenciou a escrever o conto “O colecionador de moedas e de passarinhos” foi o “Quase memória”, do Carlos Heitor Cony. Para mim, foi um divisor de águas. A partir da leitura desse e de outros romances do Cony, decidi que queria escrever profissionalmente.

Todos os autores que citei, me influenciaram a escrever (e principalmente, a reescrever) de forma realista, criando vínculos entre meus personagens e meus leitores, sem abandonar a ironia, o lado leve e engraçado da vida (meu primeiro romance, não à toa, se chama “Quase tudo é risível”).

Você poderia falar um pouco sobre as circunstâncias em que escreveu os contos de “Tempo de jabuticaba”?
Os 23 contos desse livro foram escritos em épocas diferentes, muitos deles durante a pandemia. No princípio, sou “perseguida” por uma ideia de história por dias ou até meses – caso do “Carcinoma de chuva”. Quanto maior o tempo de maturação da narrativa na minha cabeça, menor o período que emprego na “carpintaria do texto” depois que transcrevo para o papel (adoro escrever à mão) ou para o Word.

Contos como: “Sombrio”, “Tia Mariinha”, “Kuroi saru” e “A mãe do Kuroi saru” foram escritos em circunstâncias de dor, de angústia ou de revolta com uma cena observada na rua, uma notícia lida no jornal. São histórias que impactam o leitor com a forte bagagem emocional que carregam. A maior parte das narrativas do livro partiram da minha observação de pessoas desconhecidas e da fabulação das histórias a partir de seus comportamentos.

Na sua opinião, ao escrever, qual é sua principal habilidade? E qual é sua maior dificuldade?
Aprendi a gostar muito de revisar, reescrever, buscar a palavra exata para expressar a ideia, o sentimento. Algumas narrativas curtas, como o “Vestir-se”, “Terno” e “Lista de compras” são totalmente enxutas, não possuem uma palavra sobrando, sequer. Além de me considerar hábil na edição, acredito que o meu humor e a minha irreverência transpareçam naturalmente nos meus textos.

Gosto também de ser “parceira” do meu leitor, no sentido de dar espaço para ele imaginar e desvendar algumas situações, usar a sua imaginação, a sua inteligência e o seu repertório para “adivinhar” o que não foi dito explicitamente.

Minha maior dificuldade é lidar com a ansiedade de ver o trabalho pronto, principalmente em projetos longos, como os dois romances que já tenho publicados e a novela, ainda inédita. Mesmo tendo o roteiro já definido, os personagens criados, as pesquisas realizadas, me frustro com a velocidade que transcrevo minhas ideias para o papel. Para amenizar a ansiedade, faço aulas de Muay Thai e de meditação. Funciona bem nos períodos de maior desgaste.

Que argumento você usaria para convencer alguém a ler o seu livro?
Hahaha. Essa pergunta me deixou quase sem resposta. Não me sinto bem em tentar convencer alguém a ler meu livro, prefiro que se baseiem em resenhas e artigos isentos, ou mesmo na opinião de amigos que já leram meus escritos.

Normalmente, meus leitores dizem que é uma leitura prazerosa, que lhes causa muita reflexão, que não conseguem largar o volume antes de chegar à última página e que, depois de concluírem a leitura, ficam por muito tempo com as histórias na memória. Esses, para mim, seriam bons argumentos!

Livro

“Tempo de jabuticaba”, de Cristina Bresser de Campos. Urutau, 112 páginas, R$ 52. Contos.

Sobre o/a autor/a

1 comentário em “Cristina Bresser de Campos se alterna entre o cômico e o comovente”

  1. Excelente entrevista, onde se nota a vocação da Cristina Bresser para a literatura. Parabéns pra ela e vamos à leitura de seu livro.

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