Ciclo de debates discute Orwell e os desafios de se traduzir um clássico

“Uma nova língua para Orwell” será no sábado (6) e encerra o ciclo de debates sobre o autor de 1984 e Revolução dos Bichos

Colaborou Rafaela Moura

A entrada da obra de George Orwell em domínio público em 2021 está gerando uma enxurrada de novas edições dos principais livros dele, especialmente “A Revolução dos Bichos” (que agora também vem sendo lançado como “A Fazenda dos Animais”) e “1984”, o clássico da distopia totalitária que Orwell publicou seis meses antes de morrer. As novas edições dão não só novas versões à obra como trazem alguns dos principais temas de Orwell para discussão novamente.

Pensando nisso, a Editora Tordesilhas promove, no próximo sábado (6) um debate online sobre o livro 1984. Em “Uma nova língua para Orwell”, os tradutores Ronaldo Bressane (Tordesilhas), Bruno Mattos (Buzz), Antonio Xerxenesky (Antofágica), Aline Storto (Aleph) e Luisa Geisler (Novo Século) discutem as novas traduções do livro e falam das dores e delícias de se traduzir um clássico. Nesta quarta-feira (3), Rita Von Hunty falou de autoritarismo e vigilância em Orwell.

De acordo com Luiza Lewkowicz, editora da Tordesilhas e organizadora do ciclo “Orwell em debate”, o evento foi pensado como uma forma de dar aos leitores maior autonomia na hora de escolher quais edições comprar, deixando um pouco mais evidente as diferenças entre as traduções, e não apontando uma tradução como definitiva. “Pode parecer óbvio para quem está inserido no mercado editorial, mas para o público geral talvez não fique claro que, por mais que as livrarias estejam abarrotadas de edições do Orwell, a dinâmica do mercado não está indo em um caminho de competitividade, muito pelo contrário. As editoras entenderam que existe demanda para todo tipo de edição: capa dura ou brochura, ilustrada por desenhistas premiados ou sem ilustrações, com tradutores estrelados ou iniciantes, etc.” 

 O livro 1984 é particularmente interessante em termos de tradução, já que Orwell criou uma língua própria para a sociedade de Winston Smith, o Newspeak (no original). Há tradutores que optam por uma linguagem mais alinhada ao original, com traduções literais dos termos, outros que tentam trazer novidades. O apêndice que explica a origem da língua e a lógica por trás dela, presente na edição original, permite que cada tradutor tome suas decisões com embasamento, concordando ou discordando de traduções anteriores.

Para o tradutor Bruno Mattos, o prazer de traduzir 1984 está justamente as possibilidades geradas por essa língua inventada. “Não é uma língua inventada como a que a gente tem no Senhor dos Anéis, por exemplo, mas uma língua que deriva do inglês e que permeia todo o livro. É um modo de governo e de uma vida em sociedade pensada em correlação com esse idioma que não existe”, diz Bruno.

Ele optou por um novo termo em português para o nome da língua, divergindo da tradução mais antiga. “Eu uso Falanova e não Novilíngua para traduzir, porque Novilíngua é muito mais bonito, mas no apêndice fala que essa língua foi pensada pra ser utilitarista. Ela é feia, ríspida, áspera. Ela não soa bonito, soa artificial. Eu acho que Falanova soa mais tosco, mais seco.”

A liberdade e as possibilidades de novas versões são atrativas, mas também desafiadoras, em clássicos como o 1984. “As dificuldades são, principalmente, a de já existirem termos considerados cânones, que já têm uma tradução consagrada. Como conseguir criar, mas ainda ressoar com o original?”, diz a tradutora Luisa Geisler.

Nessa perspectiva, é fácil entender a importância do trabalho de um tradutor humano. Para Luisa, a diferença entre  traduções humanas e automáticas é a sutileza. “O tradutor literário, como pessoa, age como um filtro de referências, como alguém que busca equivalências num contexto cultural. Um tradutor automático pode servir para muitos tipos de informação, mas não para algo que existe muito mais nas entrelinhas do que nas linhas, que é o caso da literatura”, afirma a Luisa. 

Além dos tradutores, pesquisadores especializados em ficção científica, como Cláudia Fusco, André Araujo e Ana Rüsche, participam de eventos do ciclo. Nesta quarta-feira (3), a conversa foi com a drag queen e youtuber Rita von Hunty, do canal Tempero Drag, sobre autoritarismo e vigilância a partir de George Orwell. 

Não é por acaso que a entrada de Orwell em domínio público tem sido um fenômeno. A ascensão de governos totalitários ao redor do mundo e a perda de direitos básicos – agora ainda mais perceptíveis com a pandemia – são temas que permeavam a obra do autor inglês. Seria ele um profeta?

Luiza Lewkowicz acha interessante a ideia de Orwell como um “pressagiador”, mas discorda: “É uma abordagem divertida pensar que um autor em 1949 teria sido capaz de identificar fenômenos como as fake news, o nacionalismo do século XXI, o Brexit. Porém, sendo racional, o fato é que a História é cíclica e Orwell nunca foi um profeta, mas um escritor com um olhar muito atento aos conflitos sociais, econômicos e políticos dos anos em que viveu.”

Serviço

O OLHO QUE TUDO VÊ: AUTORITARISMO E VIGILÂNCIA A PARTIR DE GEORGE ORWELL

Rita von Hunty conversa com Ana Rüsche sobre sistemas de opressão, controle e sátira nos romances de Orwell. Com Ana Rüsche e Rita Von Hunty

Data: 03/03/2021 às 19h

Transmissão: youtube.com/SeloTordesilhas

UMA NOVA LÍNGUA PARA ORWELL: AS NOVAS TRADUÇÕES DE 1984 E OS DESAFIOS DE SE TRADUZIR UM CLÁSSICO

Cinco novos tradutores de 1984 conversam com o tradutor Rogerio Galindo sobre os desafios de se traduzir um clássico. Com Ronaldo Bressane (Tordesilhas), Bruno Mattos (Buzz), Antonio Xerxenesky (Antofágica), Aline Storto (Aleph) e Luisa Geisler (Novo Século) e mediação de Rogerio Galindo. 

Data: 06/03/2021 às 15h

Transmissão: youtube.com/SeloTordesilhas

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima