Coisas muito mais do que previsíveis

Quando a prática do jornalismo não é plural, azar de quem ainda acredita no que vem do famigerado PIG, ele mesmo, o Partido da Imprensa Golpista

Por conta do retorno de Lula ao noticiário, em face da anulação de suas condenações no âmbito da tal Lava Jato, e de sua afirmação de que foi vítima da “maior mentira jurídica contada em 500 anos de história” do Brasil, mas que não está magoado, apesar de, na sua visão, ter razão para mágoa, há quem tenha voltado no tempo.  

Sobre mentira(s) jurídica(s), o que dizer, então, das mentiras jornalísticas? Há que se lamentar a prática do jornalismo que não é plural e os disparates de muitas pessoas, inclusive quando festejaram a fantasiosa e gaiata proclamação da República de Curitiba.  

E, ainda voltando no tempo: tivemos muitos episódios envolvendo gente que faz questão de se passar por pessoa que está por dentro de tudo, incluindo o que ainda vai acontecer – e, isso, em qualquer área de atividade ou momento. Ou seja, é o pior dos indivíduos – aquele que não sabe que não sabe.  

Mulher presidente? Não pode…  

Um breve episódio: a eleição da economista Dilma Vana Rousseff, a primeira mulher eleita presidente do Brasil, em 2010, e reeleita em 2014, para o mandato de 2015/2018. Na primeira vez, em um bar do Juvevê, um machista, de olho na TV, acompanhava a apuração, torcendo, é claro, pela derrota da candidata. Quase concluída a contagem dos votos, não resistiu, falando bem alto para que todos ouvissem. E, mais do que uma premonição, anunciou como algo decidido e já a caminho:  

– Ganhou, mas não vai assumir! Tem 1.200 soldados prontos para impedir a posse!  

Isso mesmo, não um batalhão, mas um número impressionante: 1.200 soldados. Ninguém quis comentar o disparate do machista.  

A presidenta Dilma Rousseff chega ao Congresso Nacional para tomar posse para o segundo mandato. Crédito da foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.

Nem o Papa escapou  

Durante os tenebrosos 580 dias em que permaneceu preso em Curitiba, Lula recebeu inúmeras visitas de solidariedade. Do ator americano Danny Glover, do embaixador da ONU para os Direitos Humanos e Assuntos Raciais e de Dilma Rousseff, entre outras personalidades. E até o Papa Francisco, grande figura, respeitada até por quem não é católico, foi solidário, dando seu apoio ao filho de lavradores que passaram fome e miséria na região mais pobre de Pernambuco. E aí, absurdo dos absurdos, chegou a ser tachado de herege e comunista…  

A coisa não é de agora  

Um jornalista de Curitiba participou três vezes da comissão julgadora do Prêmio Esso de Jornalismo. A premiação era uma espécie de Oscar do cinema norte-americano transferido para o jornalismo brasileiro. Isso mesmo: era – pretérito imperfeito do indicativo.  

No caso de reportagens, cada membro da comissão recebia (com a devida antecedência) 25 trabalhos, dos quais deveria selecionar três e defendê-los para a premiação. E ele, o tal jornalista, seguia para o Rio de Janeiro para cumprir o restante de sua pauta extra. E eis que, entre os trabalhos inscritos para concorrer ao Esso de Jornalismo de 2005, lá estava “O mensalão do PT”, matéria publicada pela Folha de S. Paulo. Quem assinava o texto era uma então jovem repórter, que recém ingressara no jornal. E que, ato seguinte, após a premiação, foi para a TV Globo.  

Acontece que o Observatório da Imprensa, então comandado pelo inesquecível Paulo Henrique Amorim, havia denunciado a fraude: quem assinava o texto não era autor(a) da matéria, apenas emprestara o nome. E isso foi completamente ignorado pela chefia do Prêmio Esso. Assim sendo, o tal jornalista, um mero profissional da capital da terra dos pinheirais, não indicou o trabalho. Afinal, poderia torpedear e afundar a seriedade da premiação e desmerecer o trabalho (honesto) de todos os demais participantes, premiados ou não. E qual não foi a sua surpresa: a tal matéria, não indicada por quem deveria fazê-lo, conquistou o (até então) prêmio máximo do jornalismo brasileiro. Mais do que surpreso, estarrecido, ele tentou fazer a denúncia do trambique, sem sucesso, porém.

Lula. Crédito da foto: Ricardo Stuckert.

A vingança: tapa de luva  

O jeito foi aceitar o convite para participar (mais uma vez) do Prêmio Esso, no ano seguinte. E, no Rio de Janeiro, face a face com os responsáveis pela premiação de uma fraude, poderia tirar as coisas a limpo, dar o troco, um tapa de luva, já que uma bofetada não seria recomendável.  

Pior a emenda do que o soneto: o chefão do Prêmio Esso, ao ouvir a queixa/denúncia, não deixou por menos:  

– Ora, Camargo, não leve as coisas a sério…  

– A questão é que eu levo a sério a minha profissão. E respeito os profissionais que, realmente, participaram e poderiam fazer jus ao Prêmio. Tchau, passar bem.  

E tirou o time, retornando a Curitiba. Já ganhava corpo o que se revelaria um amplo complô contra o PT e seus líderes, até desembarcar na Terra plana com a gripezinha do bolsonarismo. Se fosse outro partido, o crime continuaria o mesmo. E teria a mesma reação do tal jornalista, um profissional que exercia sua profissão fora do eixo Rio/São Paulo e que nunca foi, paralelamente, funcionário (fantasma) em emprego público e jamais aceitaria a tal República de Curitiba.  

Restou recorrer ao escritor Gabriel José García Márques, aliás, também jornalista:  

– A ética deve acompanhar sempre o jornalismo, como o zumbido acompanha o besouro.  


Para ir além

E ele virou (de fato) nosso melhor amigo

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