Editoras independentes prestam atenção na literatura em francês

Obra do senegalês Mohamed Mbougar Sarr, vencedor do prêmio Goncourt, e da francesa Annie Ernaux ganham traduções bem-vindas no Brasil

É um mistério. Por algum motivo, nomes importantes da literatura francesa contemporânea demoram para ser traduzidos no Brasil – e isso, quando são traduzidos. Um exemplo fácil: Hervé Le Tellier, autor de “A anomalia”, que venceu o prêmio Goncourt na França em 2020 e, desde então, vendeu mais de um milhão de exemplares só em território francês. Esse livro foi traduzido em Portugal e até nos Estados Unidos, um país conhecido pela falta de interesse que tem por qualquer coisa que não seja o próprio umbigo. Mas no Brasil, por enquanto, nada.

Nesse contexto, coube a editoras independentes prestar atenção no que se passa na literatura francesa e fazer justiça a autoras e autores que há muito mereciam traduções em português. Além de investir também em nomes que estão ganhando atenção agora, cada vez mais.

Mohamed Mbougar Sarr

O senegalês Mohamed Mbougar Sarr, de 31 anos, venceu o Goncourt no ano passado e se tornou o mais jovem escritor a receber o prêmio em quatro décadas. Embora tenha nascido em uma ex-colônia francesa, Sarr vive na França há bastante tempo e, claro, escreve em francês.

Ele levou o prêmio mais importante das letras francesas com o romance “La plus secrète mémoire des hommes” (A memória mais secreta dos homens), que deve ser publicado no Brasil pela editora Fósforo. Porém, ainda não há data prevista de lançamento.

“Homens de verdade”

Até lá, é possível conhecer a literatura de Sarr por meio de “Homens de verdade”, que a editora Malê publica ainda neste mês. A história fala de um professor de Letras desiludido com o sistema de ensino que se torna obcecado por um vídeo que “viraliza” na internet. O tal vídeo mostra o cadáver de um homem que é desenterrado e arrastado para fora do cemitério.

Mais tarde o professor, chamado Ndéné Gueye, descobre que o homem em questão era gay. A partir dessa trama, Sarr analisa a realidade terrível vivida pelos homossexuais no Senegal.

Louis-Philllipe Dalembert

Além de “Homens de verdade”, a Malê – editora com uma proposta muito legal – publica “Terre ceinte” (Terra sitiada), de Sarr, até setembro. E publica também um dos finalistas do Goncourt 2021: “Milwaukee Blues”, do haitiano Louis-Philllipe Dalembert.

Annie Ernaux

Uma das escritoras vivas mais importantes da França, Annie Ernaux é hoje uma senhora octogenária que publica há quase 50 anos. Pois a Fósforo está traduzindo e publicando as obras de Ernaux no Brasil pela primeira vez. Em ordem de lançamento no Brasil, já saíram três títulos: “Os anos”, “O lugar” e “O acontecimento”. Outros estão previstos para 2022.

Ernaux parte de experiências pessoais para escrever livros breves e cortantes. A memória que ela tem do pai, por exemplo, é destrinchada em “O lugar”. Vinda de uma família simples de comerciantes do interior, a escritora estudou para se tornar professora e morar na cidade. Assim, ela procura entender o peso do lugar de onde veio sobre a vida que escolheu ter.

“O acontecimento”

“O acontecimento” também gira em torno de uma escolha que autora fez nos anos 1960: a de realizar um aborto quando o procedimento ainda era proibido na França. Com descrições frias e perturbadoras, Ernaux constrói um texto quase impossível de largar. Com apenas 80 páginas, é talvez o livro sobre aborto mais importante que há – ao menos na literatura francesa.

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