UFPR tem ato contra novo corte que pode inviabilizar pesquisa e bolsas em 2022

Associação de Pós-Graduandos aderiu à pauta nacional de protestos contra esvaziamento de verba

A nova manobra do governo federal para desviar dinheiro da produção científica brasileira desencadeou manifestações em diferentes cidades do país nesta terça-feira (26). Em Curitiba, dezenas de pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) se juntaram à agenda nacional contra novos cortes anunciados no início do mês e que podem inviabilizar as atividades de pesquisa em curso e barrar a entrada de novos estudantes na pós-graduação a partir do próximo ano letivo.

Os atos foram desencadeados pela decisão do governo Jair Bolsonaro (sem partido) de mexer abruptamente no caixa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), redirecionando a outras áreas cerca de 90% dos recursos previamente destinados a bolsas e apoio à pesquisa. A pedido do Ministério da Economia, o Congresso alterou de última hora, no dia 7 de outubro, projeto de lei que liberava R$ 690 milhões em créditos suplementares para o MCTI. A maior parte do dinheiro, vinda quase que exclusivamente do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), seria para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), mas as alterações deixaram apenas R$ 89,8 milhões com o MCTI – e apenas R$ 7,2 milhões para investimento livre.

Com isso, instituições e universidades ficaram no escuro, sem saber como organizar a produção científica a partir de 2022. A UFPR disse que é necessário aguardar o desenho final do impacto dos cortes no CNPq e na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) – fundação que também vem sofrendo contingenciamento – para entender o real impacto dos desfalques específicos na universidade.

Mas a Associação de Pós-Graduandos da UFPR (APG-UFPR) já espera um 2022 com ainda mais dificuldades. “A gente já enxerga uma consequência disso no ingresso de novos mestrandos na Federal no ano que vem. Muitos programas vão ter dificuldades em ofertar novas bolsas”, salienta a secretária da entidade, Amanda Mendes.

A UFPR faz parte do seleto grupo de universidades do país que trabalham no desenvolvimento de uma vacina 100% nacional contra a Covid-10. A Vacina UFPR ainda está em fase pré-clínica de testes, com expectativa de chegar aos ensaios clínicos – em pessoas – já no ano que vem. Os resultados já obtidos são promissores, mas a falta de recursos segura o ritmo da pesquisa: dos R$ 76 milhões necessários, apenas 1,4 milhão havia sido levantado até final de julho, a maior parte a título de doação. O corte recente no MCTI não afeta o repasse de verbas para o projeto, mas pode respingar indiretamente na velocidade das atividades.

“Para além do corte das bolsas, a gente tem que pensar também no dinheiro da manutenção dos laboratórios. Como você mantém, por exemplo, os camundongos se não tem condição para manter toda essa estrutura? Além de sermos reconhecidos pelo que a gente produz, a gente também tem que ter o mínimo de uma estrutura para trabalhar, e tudo isso também corre risco”, questiona a representante da APG-UFPR.

Segundo a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que nesta terça também encabeçou uma série de atos de mobilização contra a retirada do dinheiro do caixa do MCTI, o FNDCT é hoje a principal fonte de financiamento da pesquisa científica no país, portanto, o corte de verbas do fundo prejudica com força o CNPq e o trabalho dos cientistas do país – viabilizado majoritariamente pelo poder público.

Levantamento do Senado Federal feito no ano passado mostrou que, nos últimos cinco, FNDCT, CNPq e Capes perderam, juntos, 65% dos recursos orçamentários, passando de R$ 13,97 bilhões em 2015 para R$ 5 bilhões em 2020. As universidades federais também vêm enfrentando contingenciamentos seguidos.

De acordo com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), as verbas das universidades federais encolheram em proporção ainda mais avassaladora. De 2014 para 2021, os repasses para as despesas discricionárias – as empregadas na manutenção das instituições – despencaram de R$ 7,4 bilhões para R$ 4,3 bilhões.

Vice-presidente da Andifes, o reitor da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca, tratou o desvio recente das verbas do MCTI como um “duro golpe para as universidades e cientistas”. Em vídeo, ele lembrou que a medida em atinge, sobretudo, o Edital Universal do CNPq, seleção geral de projetos sem lançamento desde 2018 e que pode ter a versão 2021 duramente impactada, já que o remanejamento do governo federal tira R$ 200 milhões dos R$ 250 milhões previstos para o edital.

“Eu imaginava, e tenho certeza que a maior parte da comunidade científica brasileira também imaginava, que depois de tudo o que vivemos nessa pandemia as prioridades deveriam ser invertidas, apesar dos problemas econômicas que passamos”.

Nem o MCIT nem o CNPq se pronunciaram a respeito das manifestações do dia.

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