Debate na UFPR destaca urgência na proteção dos territórios indígenas

Lideranças ressaltam a importância da demarcação para preservação cultural e ambiental, enquanto indígenas enfrentam desafios de invisibilidade e violência

A Universidade Federal do Paraná (UFPR) promoveu na manhã de segunda-feira (29/04) o debate “Pela Defesa dos Povos Indígenas”, contando com a participação de lideranças do Paraná e de outros estados. O evento, realizado na sede histórica da UFPR na Praça Santos Andrade, foi organizado pela Superintendência de Inclusão, Políticas Afirmativas e Diversidade (SIPAD) e pelo Núcleo Universitário de Educação Indígena (Nuei) da UFPR.

Uma das questões debatidas pelas lideranças foi a necessidade crescente de os indígenas ocuparem os espaços da sociedade, apesar das dificuldades que ainda enfrentam. A própria UFPR é um exemplo dessa necessidade. A instituição conta com 63 alunos indígenas em graduação e pós, um número pequeno em relação ao total de acadêmicos. Apesar disso, a universidade tem desenvolvido projetos de ampliação de ações afirmativas para indígenas e outros grupos minorizados.

“Estes espaços precisam ser ocupados, ser ‘enraizados’ cada vez mais. Temos a sabedoria de ‘reenraizar’ o povo brasileiro, que esquece onde estão as suas origens”, afirmou Juliana Kerexu, cacica da aldeia Tekoa Takuaty, localizada na Ilha da Cotinga, em Paranaguá. Segundo ela, a ocupação dos espaços está relacionada a  um objetivo maior do movimento indígena: a demarcação imediata de seus territórios.

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“Sem isso, a gente não consegue pensar em outros direitos. Em pleno século XXI, ainda é preciso falar que temos direito a nossa terra, a nossa nossa vida, a uma existência que está ligada ao respeito à natureza”, disse. Para ela, a demarcação vai garantir o modo de vida tradicional dos indígenas e, com isso, a proteção à natureza do avanço da exploração intensa do agronegócio e da mineração.

Juliana defende que a falta de demarcação dos territórios reflete o descaso da sociedade em relação aos indígenas, e isso afeta principalmente as mulheres, que acabam sofrendo todos os tipos de violência. “Hoje as nossas jovens indígenas estão tirando suas próprias vidas por não terem perspectivas de futuro, por não verem futuro numa constituição brasileira que foi fruto de sangue indígena e que só existe no papel”, diz ela.

A cacica no entanto afirma que existe esperança de melhorias. Para isso, é preciso que haja reconhecimento da sociedade em relação à própria existência dos indígenas e de seu papel como agentes. “Aqui no Sul é muito forte o apagamento da cultura. Geralmente, as pessoas afirmam que não existem mais indígenas na nossa região”. Segundo ela, essa invisibilização esconde as condições de pobreza e exploração em que vivem os indígenas que moram em muitas regiões do Estado.

A importância da preservação do território e das demarcações foi também destacada pelo assessor do Instituto Raoni, Takakpe Metuktire, jovem liderança da etnia caiapó, da região do território do Xingu. Neto do líder Raoni, ele afirma que no país nenhum direito é dado aos povos indígenas, mas é conquistado com luta. “Estamos aqui para lutar pelo nosso direito de continuar com as nossas tradições, com a nossa língua, com a nossa própria forma de nos sustentar dentro do nosso território. Temos ainda uma conexão muito forte com a natureza. O território é muito sagrado para nós”, disse.

Takakpe ressalta que embora a Constituição estabeleça o direito dos indígenas ao território e à cultura, essa garantia é ameaçada constantemente. Ele conta que no Xingu existe uma forte pressão do agronegócio e de lideranças ruralistas. “As lideranças políticas não consultam nossa comunidade quando vão fazer algum projeto que nos afeta diretamente. Hoje no Mato Grosso há um projeto que pode afetar o nosso território, que é a ferrovia. Essa construção ameaça o nosso direito. Se houver a construção, vai haver pressão para desmatamento”, explicou.

O cacique Puiu Txukahamae, também da etnia caiapó, afirmou que os povos indígenas de todo o Brasil precisam se unir para resistir às invasões de terra e ao avanço da influência cultural dos não-indígenas nas aldeias. “No nosso território, a gente está seguindo a luta do cacique Raoni. Eu aprendi tudo com a luta dele. O primeiro habitante do Brasil somos nós. É por isso que precisamos ser respeitados nos costumes e tradições. Não podemos deixar os brancos invadir a nossa área. Muito indígena já foi massacrado. Precisamos defender o povo tradicional do Brasil”, destacou.

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O cacique disse ainda que boa parte dos agentes políticos acabam prometendo defender a causa indígena mas agem em defesa dos próprios interesses. “Eles sempre falam que estão do nosso lado, mas por trás estão dando golpe.  É preciso que as pessoas respeitem a Constituição e reconheçam os nossos direitos”, afirmou ele, que destacou que “nenhum direito é negociável” e que os indígenas não devem ceder o que conquistaram com tanta luta.

Já o líder indígena caiapó Karanhin Metuktire destacou a importância de os indígenas ocuparem espaços e se prepararem com formação universitária a fim de enfrentar os desafios de defender os povos tradicionais das ameaças que são impostas pelo grande capital e pela sociedade. Ele reconhece, no entanto, que essa trajetória não é fácil, o que é confirmado pela estudante indígena Ayla Fernandes, do curso de psicologia da UFPR. Ela, que provém do território indígena do Rio das Cobras, localizado no oeste do Paraná, destaca que existem vários desafios para os estudantes indígenas, tais como o fato de terem que se distanciar de casa, enfrentarem dificuldades financeiras e o próprio preconceito dos colegas. “Ainda somos invisibilizados”, relata ela.

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