Polícia Civil terá de investigar comandante-geral da PM por fala sobre “prevaricação”

MP enviou autos para instauração de inquérito à Polícia Civil, que já chegou a responder ao STF não ter notícia de ocorrências relacionadas aos bloqueios no Paraná

Caberá à Polícia Civil do Paraná (PCPR), por requisito do Ministério Público do Paraná (MPPR), investigar se o comandante-geral da Polícia Militar do estado (PMPR) cometeu crime ao afirmar estar “prevaricando” por deixar de cumprir ordens e desbloquear trecho de rodovia ocupado por manifestantes em meio a uma série de atos antidemocráticos organizados após a derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) nas urnas.

Em negociação com um grupo de bolsonaristas que fechava a PR-151, em Ponta Grossa, o coronel Hudson Leôncio Teixeira disse não ter intenção de multá-los e que, ao postergar a liberação dos pontos interditados pelo grupo, cometia crime de prevaricação. A conversa foi gravada. O caso ocorreu no dia 2 de novembro, um dia após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinar a ação das PMs para desobstruir as centenas de rodovias interditadas em diferentes estados.

A cena chegou como notícia de fato à 3ª Promotoria de Justiça de Ponta Grossa. Na quinta (17), o MPPR informou ter remetido os autos para instauração de inquérito policial por possível prática do crime de prevaricação, previsto no artigo 319 do Código Penal.

Sobre isso, a PM preferiu não se manifestar. À época, após repercussão negativa da conduta do coronel, a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) declarou, sem citar a fala, que todas as forças de segurança estaduais estavam cumprindo integralmente as ordens. Já a Polícia Civil disse, nesta quinta (17), ainda não ter sido notificada da remessa – o que significa ainda não haver qualquer investigação em andamento.

Polícias estaduais como reforço

A atuação das polícias militares para garantir o desbloqueio das vias estaduais e federais foi determinada por Moares ante uma demora da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em responder pelas contenções. Na última terça-feira (15), o Ministério Público Federal (MPF) pediu afastamento de 90 dias do diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques, por suposto uso do cargo para pedir votos irregularmente a Bolsonaro. Ele também foi colocado sob suspeita de ter, por motivos políticos, omitido a Polícia Rodoviária de cumprir a decisão para desinterditar as rodovias fechadas no país.

O retardo das ações da PRF justificou o STF a acionar reforço das PMs de todos os estados do país. As polícias civis também foram designadas a agir, sobretudo a usar seus serviços de inteligência para apontar os responsáveis pelos bloqueios considerados ilegais. Em ofícios expedidos a cada uma das polícias judiciárias, o ministro Alexandre de Moraes pediu a “identificação dos caminhões e veículos que participaram ativamente dos bloqueios e nas manifestações em frente aos quartéis das Forças Armadas, assim como os dados dos respectivos proprietários, pessoas físicas ou jurídicas, bem como identificação dos líderes, organizadores e/ou financiadores dos referidos atos antidemocráticos”.

Polícia Civil

A Polícia Civil do Paraná – que agora terá de investigar o comandante-geral da PMPR – está no grupo das instituições que não encaminhou ao Supremo o conjunto de dados solicitados, por, segundo a instituição, não ter recebido nenhum relato de fato a ver com a descrição do pedido.  

“Informamos que não nos chegou, até o presente momento, notícia de ocorrências relacionadas diretamente as situações descritas e das quais se pudessem obter as informações solicitadas”, respondeu formalmente ao ministro o delegado-geral da PCPR, Silvio Jacob Rockembach, que já comandou a Divisão de Operações de Inteligência do Departamento de Inteligência do Estado do Paraná (DIEP). “Registramos que para atender a demanda este Departamento pediu a todas as unidades policiais que enviem informações relevantes de possíveis atendimentos, dentro de nossas atribuições legais, relativas ao presente caso”.

O documento no qual consta a resposta foi assinado no dia 10 de novembro, quando todos os bloqueios no Paraná já estavam dissolvidos. Dois dias antes, no entanto, relatório elaborado pelo gabinete de gestão de crise da PMPR, enviado ao STF no âmbito da mesma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), a 519, contabilizou 233 trechos interditados entre 31 de outubro e 8 de novembro no estado.

A resposta da PCPR não foi um padrão adotado por todas as polícias, conforme verificado nas peças adicionadas aos autos do processo movido pelo STF, todas disponíveis para consulta pública.

Outros estados

Em estados como Rio De Janeiro, São Paulo, Goiás, Acre, Mato Grosso, Ceará, Espírito Santo e Pernambuco, por exemplo, setores de inteligência de suas respectivas Polícias Civis encaminharam à Corte Federal densas exposições contendo informações sobre identificação de atos, manifestantes, lideranças, financiadores dos movimentos e também cópias de Boletins de Ocorrência e de sites e canais de comunicação usados pelos grupos e rastreados pelas equipes em algum momento.

No Rio Grande do Sul, a Divisão de Inteligência Policial e Análise Criminal chegou a monitorar publicações nas redes sociais dos envolvidos. E no Tocantins foram elaborados relatórios técnicos para remontar o dia a dia das manifestações e dos bloqueios. No Paraná, apesar da ausência dos relatos da Polícia Civil, a PM foi quem teceu um conjunto de dados de mesma natureza submetido ao processo.

A Polícia Civil do Paraná não se manifestou sobre a questão até a publicação da reportagem. O conteúdo será atualizado se houver retorno da corporação.

Ao todo, segundo a PRF, 1.158 manifestações foram desfeitas desde o início da operação em todo o país. Decisão do último sábado (12) do ministro Alexandre de Moraes de mandar bloquear contas bancárias ligadas a 43 pessoas e empresas suspeitas de ligação com os atos antidemocráticos provocou novos atos em estradas, todos de menor intensidade e nenhum deles no Paraná.

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