Ônibus são os que mais transmitem Covid, depois dos hospitais, diz TCE

Conclusão vem após auditorias, que apontam riscos acima do recomendável para 11% dos usuários

Após cinco meses de auditorias presenciais nos ônibus de Curitiba, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) concluiu que os coletivos apresentam o segundo espaço de maior transmissibilidade da Covid-19 em Curitiba, perdendo apenas para os hospitais. O levantamento mostra ainda que há riscos acima do recomendável para 11% dos usuários do transporte coletivo da Capital.

Os dados servirão de base para que o TCE recorra da decisão do Tribunal de Justiça (TJ-PR), que mandou os ônibus da Capital circularem normalmente, após a emissão de uma medida cautelar do TCE – determinando que os coletivos fossem utilizados apenas pelos trabalhadores da Saúde.

A Prefeitura recorreu e, segundo a decisão do TJ, o TCE “não tem autoridade impetrada para estabelecer ou determinar o cumprimento de medidas sanitárias contra a pandemia do coronavírus”.

Ainda assim, o presidente do TCE-PR, Fábio Camargo, afirma que sua decisão cautelar não foi repentina, mas “faz parte de um processo fiscalizatório desta Corte de Contas em curso há mais de um ano, com o conhecimento da Prefeitura de Curitiba”. Segundo ele, “desde outubro do ano passado, técnicos do TCE-PR atuam fiscalizando aglomerações no transporte coletivo. Já foram encontradas irregularidades e expedidas orientações para diminuir o risco de contágio”.

Estações-tubo lotadas em horário de pico. Foto: TCE-PR

Porém, diz ele, a Prefeitura “omitiu a informação que o sistema de transporte da Capital está sendo fiscalizado desde que as empresas do transporte coletivo passaram a receber subsídio de verbas municipais para operar durante a pandemia. A contrapartida seria aumentar a frota circulante para oferecer ônibus com lotação adequada aos decretos municipais em vigor”. 

De acordo com o TCE, a medida que determinou a paralisação nos coletivos foi motivada por um pedido do Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana (Sindimoc), já que “cerca de 100 trabalhadores do transporte coletivo de Curitiba perderam a vida para a Covid-19 desde o início da pandemia”. 

“Após nosso corpo técnico demonstrar cientificamente que os ônibus constituem o segundo espaço de maior transmissibilidade da Covid-19 em Curitiba, perdendo apenas para os hospitais, resolvemos tomar uma atitude neste momento em que 100% de nossas UTIs encontram-se ocupadas. Recebemos com serenidade a decisão do TJ, porém estamos pedindo sua reconsideração administrativa e judicial”, afirma Fábio Camargo.

Segundo ele, o último relatório da coordenadoria de auditorias concluiu que “em 11,04% dos casos observados os usuários foram expostos a riscos acima do recomendável para a atual situação”.

Aglomeração também em terminais. Foto: Giorgia Prates/Plural

Protocolos de segurança

A Prefeitura de Curitiba diz que “o transporte coletivo vem seguindo todos os protocolos de segurança sanitária estabelecidos pelo município, com marcação de distanciamento nas plataformas dos terminais, sanitização de equipamentos e ônibus no transporte coletivo, obrigatoriedade do uso de máscaras nos espaços públicos e disponibilidade álcool gel em terminais e estações-tubo aos usuários”.

Em Bandeira Vermelha, a Capital reduziu a lotação máxima dos passageiros para 50%, que era de 70%. “Mesmo com a queda do movimento nos últimos dias, a Prefeitura de Curitiba mantém a frota, de cerca de mil veículos (80% do total) inalterada. As linhas operam com 100% nos horários de pico”, diz a administração municipal.

Porém, a frota só atua com este número de veículos durante os horários de pico, os de maior movimento. Nos outros horários, o número de ônibus é reduzido em 50%, tanto em Curitiba quanto na Região Metropolitana.

Coletivos da RMC seguem igualmente cheios na pandemia. Foto: Giorgia Prates/Plural

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3 comentários em “Ônibus são os que mais transmitem Covid, depois dos hospitais, diz TCE”

  1. É preciso cuidar com os números. É possível que muito mais do que 11% dos usuários corram riscos acima do recomendável.

    Dada a quantidade de pessoas que utiliza o transporte público nesses tempos de pandemia, trata-se de conhecimento estratégico saber os reais riscos aí implicados.

    A justificativa do TCE é compreensível: o transporte coletivo passou a receber subsídio de verbas municipais para operar durante a pandemia, portanto, caberia ao TCE fiscalizar. Na falta de ação da prefeitura, é curioso que seja o TCE a produzir e divulgar esses dados. São tempos esquisitos mesmo.

    O Plural tem cobrado informações da prefeitura. A prefeitura desconversa. Minha opinião é: eles não têm esses dados. Porque, para isso, seria necessário realizar uma pesquisa embasada, com planejamento, método e atualização frequente; sendo o resultado de interesse público, haveria o imperativo ético da transparência. Para realizar tal pesquisa, a necessidade de mobilizar pesquisadores e institutos de pesquisa ou universidades. Curitiba teria, sim, condições de produzir este conhecimento. Não o faz porque, provavelmente, o resultado seria uma prova de culpa: é evidente que os ônibus constituem ambiente de altíssimo risco. Reflitamos: quando se trata de risco de morte, qualquer risco deveria estar “acima do recomendável” (na minha opinião, deveríamos continuar ensinando isso para as nossas crianças); o recomendável é zero, sempre (sim, tive esta conversa com um vizinho muito religioso que não concorda com meu radicalismo). Vejamos: se o vírus se propaga pelo ar – e permanece no ar – basta a presença de poucas pessoas infectadas e o contato próximo, ainda mais quando as máscaras são de baixa qualidade e a ventilação insuficiente, para ocorrer transmissão e haver risco de contaminação. A única maneira de diminuir os riscos é reduzir a ocupação nos ônibus a um número mínimo. Se há pessoas sentadas e TAMBÉM pessoas em pé, não importa se são poucos trechos assim viajados, o risco de propagação é maior porque as pessoas são obrigadas a manter contato físico mais próximo. É assim a dinâmica: mais gente em contato próximo, mais chance de contaminação, mais gente doente, mais gente morta. Em resumo: “quanto mais, mais” (matematicamente, isto é representado pelas funções exponenciais que vemos serem plotadas nas telas de todo o Brasil).

    Importa observar que sejam os mais pobres a necessitar do transporte público, por falta de opção.

    Cuidemos. O TCE realizou uma inspeção, não uma pesquisa (esta distinção é importante). Ainda que haja boa intenção, os dados não permitem concluir que haveria “riscos acima do recomendável para 11% dos usuários”. De fato, os riscos são muito maiores. Muito mais gente está em risco.

    Segundo informações no site do TCE, os fiscais observaram 697 trechos (em estações tubo e terminais selecionados) durante o horário de pico da última sexta-feira. Apontaram que em 77 daqueles trechos, portanto, em 11,04% DOS TRECHOS, houve ocupação de ônibus no nível 3 da escala que haviam estabelecido. Nesta escala, os números 4 e 5 corresponderiam a lotação alta e superlotação, respectivamente. O nível 3 indica 100% de passageiros sentados e MAIS 50% de passageiros em pé. Portanto, o nível 3 caracteriza uma ocupação muito alta naqueles 77 trechos fiscalizados, tendo em vista a situação atual (bandeira vermelha). Conclusão: certamente que a prefeitura deveria atuar para reduzir muito mais a ocupação dos ônibus.

    Tendo em vista o processo de transmissão pelo ar – e o fato objetivo de que o vírus permanece no ar – aqueles 77 trechos indicam que pode ter havido, além de preocupante maior proximidade entre pessoas, uma maior chance de que pessoas infectadas tenham exalado aerosóis contendo cargas virais com o potencial de contaminar outras pessoas (mesmo aquelas que entraram nos ônibus em outros pontos). Inclusive, quanto mais gente portadora do vírus estiver presente, mais risco de propagação. Portanto, a inspeção realizada pelo TCU não permite calcular um número associado ao risco. Seria necessário saber quantos passageiros circularam naquelas 77 estações, em relação ao total de passageiros; também seria necessário saber quanto tempo aqueles passageiros ficaram nos ônibus etc. E seria o caso de fiscalizar mais estações, para constituir uma amostragem estatisticamente significativa. Ou seja, estimar o risco exigiria um trabalho de pesquisa que, a bem da verdade, não foi feito. Aliás, com tanta tecnologia, tanta ciência e tanto recurso técnico à nossa disposição, Curitiba entrará para a história como uma cidade que navegou a pandemia às escuras – impossível não fazer alusão à nau capitânia.

    A fiscalização do TCE, portanto, serve de alerta. Há muita gente transitando nos ônibus. Se fosse para embasar políticas públicas em alguma pesquisa, então, a prefeitura deveria decretar um lockdown rigoroso – e reservar o transporte público tão somente aos trabalhadores de serviços essenciais e ao transporte de emergência. Neste caso, as empresas de ônibus seriam chamadas a fazer o papel que lhes caberia nesses tempos de pandemia: sacrificar seus lucros, para não sacrificar vidas humanas. Aqui talvez tenhamos chegado no xis da questão.

  2. “Após nosso corpo técnico demonstrar cientificamente” soa como um exagero e banaliza o trabalho sério que científicas vem realizando. Demonstração científica requer uma metodologia bem estabelecida e, preferencialmente, um corpo de pesquisadores bem treinados que posso revisar a metodologia e resultados em um processo denominado de “peer-review” antes de ser publicado. Com certeza, este não foi o caso do estudo realizando pelos técnicos do TCE. Deste modo, eu me pergunto se o TCE realmente tem a competência de para tomar a decisão de interromper o transporte público!

  3. “Após nosso corpo técnico demonstrar cientificamente” soa como um exagero e banaliza o trabalho sério que científicas vem realizando. Demonstração científica requer uma metodologia bem estabelecida e, preferencialmente, um corpo de pesquisadores bem treinados que posso revisar a metodologia e resultados em um processo denominado de “peer-review”. Com certeza, este não foi o caso do estudo realizando pelo técnicos do TCE. Deste modo, eu me pergunto se o TCE realmente tem a competência de para tomar a decisão de interromper o transporte público!?

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