E se o ano letivo for suspenso em 2020?

Alunos da Rede Estadual não devem ser avaliados neste semestre e precisarão repor conteúdo. Indicação é do Conselho de Direito Humanos, que vê problemas no ensino a distância, visão compartilhada por professores

“Este formato de aulas não presenciais não é Educação a Distância (EAD), é teleaula, e não garante que todos tenham o direito de conseguir estudar os conteúdos nas plataformas”, assegura Clau Lopes, vice-presidente do Conselho Permanente de Direitos Humanos do Paraná (COPED. O órgão decidiu pedir a suspensão do ano letivo nas escolas estaduais. A medida inclui a reposição de aulas durante e após a pandemia. Professores têm visão semelhante.

A medida foi tomada depois de denúncias de violações de direito da garantia da qualidade de ensino para os estudantes. “Muitos não têm condições de acompanhar as aulas, só têm um computador pra toda família; outros nem têm computador, celular ou TV. E a questão das atividades impressas também precisa avaliar. Como os estudantes vão ter acesso a elas sem correr risco, já que estamos numa pandemia?”, questiona  Lopes.

De acordo com ele, não houve formação ou treinamento aos professores, que acabam tendo que usar seus recursos próprios para conseguir atuar. “A Seed (Secretaria Estadual da Educação) exige avaliação, que o primeiro semestre se feche com notas, faltas e provas, mas a falha na Educação remota é grave. Não são todos os alunos que têm acesso. E entrar na aula não quer dizer que aprendeu.”

A saída seria usar as ferramentas e plataformas da EAD para revisar os conteúdos do ano passado, e também os apresentados nos dois primeiros meses letivos deste ano. “Precisa organizar os conteúdos para, apenas, uma revisão. E quando voltar, retomar os planejamentos com a questão curricular nova e modificada, para os estudantes não serem prejudicados”, sugere Lopes.

A ideia é revisar agora e organizar um novo currículo para o retorno, mesmo que seja necessário estender o ano letivo para 2021. “Isso já aconteceu em outras situações, o ano letivo iniciar antecipadamente – janeiro, fevereiro e março – e depois retoma o calendário escolar. Não precisa ter pressa, pois Educação não é mercadoria, tem que seguir com orientação. E a Seed precisa escutar a comunidade escolar, os professores e diretores, e não simplesmente colocar um aplicativo e dizer que tá tudo bom.”

Segundo o Coped, a revisão daria ao aluno a chance de não ser prejudicado, evitando o déficit de aprendizagem. Mas seria assim tão ruim perder um pouco do conteúdo em 2020?

“Não é o fim do mundo”

Para a doutora em Educação Giselle Corrêa a perda de um ano escolar na infância ou adolescência “não é o fim do mundo”.

Alunos não devem ser testados neste período. Foto: Geraldo Bubniak/ANPr

“Estamos em uma situação de total exceção com a pandemia. Voltar em setembro ou outubro não recuperará o ano, sobretudo para as crianças da Rede Estadual que estão com dificuldade de acesso e de acompanhamento das aulas EAD”, avalia Giselle. “Estas aulas foram criadas a toque de caixa, sem a organização necessária para que os estudantes acompanhassem. Antes de implantar, primeiramente teriam que ter garantido o acesso à internet gratuita e aos dispositivos tecnológicos.”

A professora não vê grandes malefícios com a perda do ano letivo nas escolas públicas estaduais. “Estas aulas que os alunos não acompanham não serão recuperadas. E aí? Como seguirão o ano seguinte? Será, mais uma vez, o Estado mais excluindo do que dando oportunidades de Educação de qualidade aos estudantes? Se continuar assim, a resposta é afirmativa.”

Já para a Rede Particular de Ensino, a situação é diferente. “As escolas privadas têm pouquíssima chance que isto (suspensão do ano letivo) aconteça. Há uma pressão muito grande das mães e pais que pagam mensalidade. As escolas não vão conseguir o pagamento sem aula alguma”, avalia a doutora em Educação.

Professores pedem amplo debate e planejamento

A App-Sindicato, que representa os professores da Educação Pública no Paraná, defende um amplo debate e planejamento do processo pedagógico entre o Estado e a comunidade escolar, para que não haja risco do aumento das desigualdades sociais.

“É importante a criação de uma ampla comissão para este debate, que deve incluir ainda, como já estamos fazendo, Ministério Público, Ministério Público do Trabalho, Tribunal de Justiça e Conselho Estadual de Educação”, pondera o presidente do sindicato, Hermes Leão.

“Mas temos esbarrado na teimosia da Seed e do Executivo a continuar numa gestão autoritária, que provoca grande desgaste para os profissionais da Educação diante da aplicação de uma proposta de trabalho virtual para a qual os professores não foram preparados. Sem falar na quantidade de alunos que não têm acesso aos conteúdos on-line e precisam ir até as escolas para buscar atividades impressas”, avalia o professor. “Nossa visão é semelhante à deliberação apresentada pelo Coped.”

Acesso quase 100%

A Seed não atendeu ao pedido do Plural para uma entrevista com o diretor da pasta, apenas informou que está dando todo o apoio necessário para os cerca de 1 milhão de estudantes no Paraná e também aos 42 mil professores da Rede Estadual.

As aulas da Seed são disponibilizadas por três canais abertos de televisão, pelo aplicativo Aula Paraná e também no Youtube. Há um programa de chat on-line, no qual os alunos podem esclarecer dúvidas com os professores, que ficam conectados durante o período das aulas, de quatro horas.

O conteúdo é impresso apenas para estudantes de regiões onde não se tem acesso à internet, como quilombos, aldeias indígenas e áreas rurais. Alguns colégios disponibilizam as atividades impressas, mas não os conteúdos. De acordo com a Seed, 99% dos estudantes têm acesso às aulas por um dos canais ofertados pelo Estado.  

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