Comunidades indígenas do oeste do Paraná correm risco de despejo a partir de julho

Duas comunidades indígenas do oeste do Paraná correm o risco de serem despejadas a partir do próximo mês. No dia 30 de junho termina a suspensão das operações de reintegração de posse, determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em função […]

Duas comunidades indígenas do oeste do Paraná correm o risco de serem despejadas a partir do próximo mês. No dia 30 de junho termina a suspensão das operações de reintegração de posse, determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em função da pandemia do coronavírus. Reivindicadas pela Itaipu Binacional e pelas prefeituras de Guaíra e Terra Roxa, as áreas abrigam mais de 3 mil pessoas.

Na região dos municípios de Guaíra e Terra Roxa, cerca de 3 mil Avá-Guarani e Guarani Mbya vivem em áreas ocupadas anteriormente pelos indígenas, de acordo com o Centro Missionário Indigenista (Cimi). Em fevereiro de 2020, a Justiça Federal em Guaíra atendeu a um pedido da prefeitura e determinou a suspensão de qualquer ato de demarcação de terras indígenas nos dois municípios e a anulação do relatório de identificação e delimitação da Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, com 14 aldeias.

A prefeitura alegou que não participou dos estudos e levantamentos realizados para a demarcação da área. Como a Terra Indígena também está em áreas de Terra Roxa, a suspensão dos processos também valeu para o município vizinho.

“Com base nessa decisão de primeira instância, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, simplesmente anulou todo o processo de demarcação. O advogado da Funai informou à Comissão de Minoria da Câmara”, afirmou Osmarina de Oliveira, missionária do Cimi no oeste do Paraná. “Nunca aconteceu de todos os estudos serem anulados com base em uma decisão de primeira instância. Não existe mais terra indígena. Se tiver alguma decisão diferente, vai ter que anular a portaria que anulou todos os estudos”.

Enquanto isso, segundo Osmarina, as terras vão sendo ocupadas. “Tem obras sendo construídas, recentemente fizeram uma cadeia. A terra indígena não precisa estar demarcada, delimitada. Ela é terra indígena, já é reconhecido o direito. É só uma questão de organização”, afirma a missionária.

Indígenas fazem protesto por demarcação em Guaíra. Foto: Diego Pellizari/Cimi.

Já a área ocupada no município de Santa Helena pertence à Itaipu e foi retomada por indígenas Avá-Guarani e Guarani Mbya em fevereiro de 2018. De acordo com o Cimi, o local é uma das nove áreas originais dos Guarani que não foram inundadas pela barragem de Itaipu em 1982. Atualmente, 17 famílias vivem no local.

Em março de 2019, a 1ª Vara Federal de Foz do Iguaçu determinou a retirada imediata dos indígenas da aldeia Pyahu Guarani, autorizando o uso de forças policiais. A Procuradoria-Geral da República (PGR) recorreu ao STF, mas o ministro Dias Toffoli, a quem o recurso foi destinado, não se posicionou em função da decisão do Supremo de suspender as operações de reintegrações de posse. 

“O processo foi suspenso durante o período da pandemia, mas no fim do mês eles voltam a tramitar. Não sabemos o que vai acontecer, porque já tem decisão tomada pela reintegração de posse”, disse Osmarina de Oliveira. “Ninguém como vai ficar, se vai haver reintegração de posse imediata. Estamos nessa expectativa”. O Cimi é um órgão vinculado à CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil) e atua há 49 anos na defesa dos direitos dos povos indígenas.

Em nota enviada ao Plural, a Itaipu afirmou que se trata de uma área de preservação permanente, o que obriga a binacional a recorrer à Justiça. Além disso, não haveria condições de acomodação no local.

“Trata-se de uma área de preservação permanente, que integra a faixa de proteção do reservatório da usina de Itaipu, reconhecida recentemente pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como como zona-núcleo da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA). Portanto, a Itaipu tem a obrigação legal de contestar qualquer tipo de violação de sua faixa de proteção. Ademais, a área invadida é inadequada para acomodação humana, sem quaisquer condições de saúde, higiene e saneamento”, diz a nota da Itaipu.

Indígenas da comunidade de Santa Helena. Foto: Cimi Regional Sul/divulgação.

Funai anti-indígena

Em relatório divulgado na segunda-feira (14), a organização não governamental Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e o INA (Indigenistas Associados – Associação de Servidores da Funai) acusaram o governo de Jair Bolsonaro de usar a Funai para implementar uma política anti-indigenista, marcada pela não demarcação de territórios, perseguição a funcionários concursados e lideranças indígenas, além da militarização sem precedentes do órgão.

De acordo com o levantamento, apenas duas das 39 Coordenações Regionais do órgão são chefiadas por servidores públicos. Nas demais chefias, 19 são coordenadas por oficiais das Forças Armadas, três por policiais militares e duas por policiais federais. As outras são chefiadas por servidores substitutos ou pessoas sem vínculo com a administração pública. O presidente, Marcelo Xavier, é policial.

O relatório cita ainda uma ampliação no número de processos administrativos disciplinares (PAD) como forma de pressão, o que acaba reduzindo o número de horas de trabalho dos indigenistas, que são convocados a dedicar-se a duas ou mesmo três comissões simultâneas de PAD.

O esvaziamento de pessoal também foi constado. No relatório de 2020 da Funai, o último públicado, havia mais cargos vagos na autarquia (2,3 mil) do que profissionais em atuação (2.071 profissionais, sendo 1.717 efetivos). Nenhum programa orçamentário específico direcionado aos povos indígenas apareceu no Plano Plurianual (2020-2023) ou na Lei Orçamentária (2020) redigida pelo governo federal.

O documento lista o que classifica como “Desmonte da Funai em 10 atos”: agenda ruralista no comando; militares e policiais no lugar de indigenistas; perseguição aos servidores concursados; burocracia para visitas a territórios indígenas; “nenhum centímetro a mais de terra indígena”, como disse Bolsonaro antes da eleição; uso de antropólogos “de confiança”, selecionados, segundo Marcelo Xavier, “observando critérios de oportunidade e conveniência”; terras tiradas do mapa (que reconhece o direito apenas a terras homologadas); critérios para classificar o “indígena de verdade” (portaria limita o acesso a direitos); omissão em relação a garimpeiros; e omissões na esfera judicial (como no caso de Guaíra e Terra Roxa).

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3 comentários em “Comunidades indígenas do oeste do Paraná correm risco de despejo a partir de julho”

  1. concordo com amigo Alejandro é tão chocante quanto a morte de Bruno e Dom na Amazonia aqui estão dando guarida a posseiros bandidos é desumano tudo isso será que existirá um JUIZ que dará o direito a BANDIDOS. O INDO É O VERDADEIRO BRASILEIRO DONO DE SUAS TERRAS…………Prefeituras querem, terras se não cuidam nem do que tem só matos criando bichos MEU DEUS QUE TRAGÉDIA

  2. Claudete Kreibich

    Meu Deus, mas o quê é isto???? Simplesmente ilegal, injusto e imoral!!! Até aonde vai a ganância deste governo e oportunistas de plantão? Isto não pode acontecer, é necessário atos públicos para envolveram mais gente nesta barbaridade!!

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