Um pasmo radiante

Se Menino Maluquinho é o best-seller de Ziraldo, Flicts é sua obra sublime

Há 50 anos, um mês depois de Neil Armstrong dar um salto gigantesco para a Humanidade, Ziraldo pôs em órbita Flicts, a obra que é considerada o salto gigantesco para a literatura infanto-juvenil brasileira. Uma obra-prima em forma de poesia, cores e design gráfico. A Lua, sua obsessão desde a infância, das leituras de Flash Gordon e Brick Bradford, devia sentir-se mais agradecida a Ziraldo do que a Armstrong.

Flicts é um livro que tem cores e tem também a Lua, mas não é um livro sobre cores e sobre a Lua. É um livro sobre a solidão e sentir-se deslocado no mundo.  Era uma vez uma cor muito rara e muito triste chamada Flicts. Essa é a primeira estrofe, para dar uma ideia da sensibilidade da obra. Um pasmo radiante.

Carlos Drummond de Andrade, em um artigo publicado no Jornal do Brasil em 1969, integrado posteriormente à obra, escreve para que “cada um que trave contato pessoal com Flicts, e sinta o que eu sinto ao conhecê-la: um deslumbramento, um pasmo radiante, a felicidade de renascer diante do espetáculo das coisas em estado puro”. A vida são cores. Ziraldo são cores. Drummond são cores.

Agora a editora Melhoramentos lança uma edição especial de comemoração dos 50 anos de Flicts, recuperando o número de páginas e a tipografia original da obra, e com comentários de Millôr Fernandes e Rachel de Queiroz, entre outros. Se Menino Maluquinho é seu best-seller, Flicts é sua obra sublime.

Ziraldo é Flicts

Ziraldo foi talvez o artista gráfico mais requisitado nos anos 70. São clássicos seus cartazes para o cinema nacional, para os shows do Jô Soares, as capas dos livros do Chico Anysio, os quadrinhos do Pererê, Supermãe, as charges do Pasquim e duas frases clássicas: “eu nunca brochei” e “esse foi o pior 69 da minha vida”, sobre o ano em que Armstrong pisou na Lua e Flicts foi publicado. Foi Ziraldo também quem traduziu o nome Peanuts para “Minduim” aqui no Brasil.

Dois anos antes de Flicts, Ziraldo publicou cartuns na revista Mad americana, precisamente a edição 110, de abril de 1967. Consegui encontrar as páginas e alguns esboços, incluindo o briefing de uma capa, desenhada por Norman Mingo.

A melhor notícia, no entanto, é que Ziraldo se recuperou do AVC que sofreu no final de 2018. Em um vídeo divulgado pela Melhoramentos, ele diz estar bem e feliz. Só parece meio triste, mas é porque descobriu que envelheceu. “Foi assim, eu acordei e estava velho”. A grande ironia de tudo é que Ziraldo nunca envelhece. Ziraldo é Flicts.

Abaixo alguns cartuns de Ziraldo publicados na Mad Magazine e no Almanaque do Ziraldo. A Lua, sempre uma referência na obra do cartunista.

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