“O traidor”: Cine Passeio exibe filme de Marco Bellocchio sobre a máfia

Cineasta italiano conta a história de Tommaso Buscetta, o mafioso que virou informante e escapou para o Brasil, no filme “O traidor”

Hoje, ao fazer um filme sobre a máfia, é inevitável sofrer comparações com Francis Ford Coppola em “O poderoso chefão” (1972) ou com Martin Scorsese em “Os bons companheiros” (1990).

Que o diga o italiano Marco Bellocchio, um dos maiores cineastas em atividade, que acaba de lança “O traidor”, em cartaz no Cine Passeio, em Curitiba. Nesta quinta-feira (14), o filme estreia quase três anos depois de competir pela Palma de Ouro no Festival de Cannes 2019 (e perder para “Parasita”).

No filme, Bellocchio conta a história de um mafioso de verdade, Tommaso Buscetta (1928–2000), membro da Cosa Nostra que delatou antigos companheiros para o famoso magistrado Giovanni Falcone (1939–1992).

“As situações eram reais”, disse Bellocchio, em entrevista à época do Festival de Cannes, ao ser indagado sobre as diferenças entre “O traidor” e os filmes de Coppola. “O Poderoso Chefão era inventado. Claro que algumas produções de Hollywood lidaram com personagens reais, como em “Donnie Brasco” [de 1997, com Al Pacino]. Em ‘O traidor’, todo mundo é real.”

Buscetta

A história de Buscetta, que fez cirurgia plástica e das cordas vocais para ficar menos reconhecível, parece ser cinematográfica o suficiente.

Obviamente que adaptações tiveram de ser feitas para caber em um filme de duas horas e meia, especialmente o pedaço em que Buscetta, interpretado por Pierfrancesco Favino, viveu em território brasileiro. “Ele ficou duas vezes no Brasil. Em 1972, ele foi preso, torturado e deportado para a Itália”, disse Bellocchio, que rodou várias das cenas no Rio de Janeiro.

O filme mostra como a mulher do criminoso, a brasileira Maria Cristina de Almeida Guimarães, vivida pela atriz Maria Fernanda Cândido, foi pendurada de um helicóptero militar para convencê-lo a colaborar.

Mas Buscetta retornou no início dos anos 1980, em meio a uma guerra da máfia siciliana em que dois de seus filhos desapareceram para sempre e vários de seus parentes foram mortos. Ao ser preso novamente, Buscetta decidiu colaborar com uma grande investigação antimáfia liderada pelo magistrado Falcone.

Protagonista

Mesmo sendo um personagem tão rico, nunca houve um filme ou série à sua altura, segundo o diretor. “Ele é um protagonista. Sua história merece ser contada”, disse Bellocchio, citando breves aparições do personagem em longas como “Il Divo”, de Paolo Sorrentino.

“Ele nunca teve a importância e o espaço que merecia. Sempre lidaram com Buscetta de maneira superficial”, diz o diretor.

Música

Marco Bellocchio ouviu dizer que, em Corleone, a cidade onde de fato nasceram vários membros da máfia siciliana, mas que ficou famosa mesmo graças à família fictícia criada pelo escritor Mario Puzo e imortalizada por Coppola, bares e restaurantes de fato tocam o tema composto por Nino Rota para “O poderoso chefão”.

Em seu filme, o diretor preferiu utilizar uma antologia de árias, trechos de música clássica e canções populares. “Sem dúvida, há uma relação ambígua com a máfia na Itália”, diz o cineasta, acrescentando que também há turistas visitando o lugar onde Benito Mussolini nasceu, muitas vezes cantando hinos fascistas.

“Acho que, em respeito aos milhares de vítimas da máfia, não dá para brincar com isso. Não podemos subestimar esse fenômeno”, diz. “Mas a verdade é que, na Itália, a ideia do Estado, de respeito às leis, é muito fraca. Imagine que nosso ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi costumava dizer que aqueles que pagam impostos são bobos.”

Brasil e corrupção

Ao ser indagado se, tendo filmado no Brasil, ele achava que o nível de corrupção era comparável, o cineasta foi diplomático. “A Itália foi considerada um dos lugares mais corruptos do mundo. Talvez o Brasil seja mais corrupto, mas a verdade é que todos precisamos de mais sensibilidade”, diz.

E continua: “Precisamos lutar pelo bem comum e para isso precisamos de um Estado forte, que seja capaz de implementar as leis e seja guiado por uma boa dose de idealismo”.

Cosa Nostra

O diretor Marco Bellocchio acredita que, por isso, são importantes pessoas como o promotor Giovanni Falcone – que foi assassinado em um atentado à bomba pela máfia Corleonesi (um grupo dentro da Cosa Nostra) em 1992.

A Cosa Nostra ainda existe Mas não atua de forma tão chamativa. Prefere as sombras. Bellocchio cita uma frase do próprio Falcone para demonstrar seu otimismo: “A Cosa Nostra é um fenômeno humano. Então ela nasceu e vai morrer, não é invencível, por ser um fenômeno humano”.

Onde assistir

“O traidor”, de Marco Bellocchio, está em cartaz no Cine Passeio, com uma sessão diária às 19h30.

Com informações do Estadão Conteúdo.

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