Nova obra de José Aguiar é uma viagem no tempo pela memória de Curitiba

Narrativas Gráficas Curitibanas remonta 210 anos da história da Capital por meio de quadrinhos, charges e cartuns

O ano é 1807. Em Curitiba, “João Pedro, o Mulato”, possivelmente o primeiro chargista brasileiro, produz sátiras dos adereços e costumes típicos da região Sul do país. Anos depois, no final do século XIX, aparecem os primeiros quadrinhos, como a Gaveta do Diabo, de Narciso Figueras, e outros feitos em colônias alemãs da Capital. Essas são só algumas das centenas de narrativas que formam o imaginário e a história de Curitiba contadas na obra Narrativas Gráficas Curitibanas, lançada em junho deste ano e assinada pelo quadrinista curitibano e colaborador do Plural, José Aguiar.

A ideia do livro surgiu a partir de um convite da Biblioteca Pública do Paraná (BPP) para que Aguiar escrevesse sobre o humor gráfico na Capital. O projeto cresceu e se transformou em um trabalho que resgata 210 anos de história da cena local de charges, cartuns e quadrinhos, três linguagens que, como afirma Aguiar, “se abraçam o tempo todo”. 

“Eu pensei que era a oportunidade perfeita para pesquisar e dar uma organizada nessa história local. É uma coisa que eu como artista tenho curiosidade, sempre tive, mas nunca encontrei muitas referências a respeito”, relata o quadrinista.

O projeto gráfico e a diagramação do livro foram desenvolvidos pela empresa Thapcom. Foto: Divulgação/Thapcom.

Acompanhando o caminhar da cena artística curitibana há 30 anos, Aguiar queria organizar e tornar acessível a memória da cidade. “Eu brinco, metaforicamente, que eu sou quem faz a faxina. Eu entrei no quarto e estava tudo desorganizado. Tirei tudo que estava espalhado no chão, coloquei as coisas nas prateleiras e organizei da melhor forma possível. Mas não é aquela faxina que mexe os móveis. Eu não sei o que tem atrás deles, se tem alguma coisa escondida embaixo, ou se tem alguma coisa caída e esquecida lá atrás. Peguei e arrumei tudo o que estava aparente que eu encontrei.”

São 360 páginas de documentos, biografias, depoimentos e obras produzidas entre 1807 e 2018. Através das centenas de ilustrações presentes no livro, é possível não só conhecer, mas compreender o contexto do local e época de cada artista. “É importante para o público poder ler e entender essas linguagens. Quando você fala de quadrinhos, charges e cartuns você está falando de artistas que estão se expressando dentro do seu espaço no tempo, estão falando das questões que os afligiam e conflitos da sociedade naquele momento”, comenta Aguiar.

Foto: Divulgação/Thapcom.

O processo de desenvolvimento do livro durou dois anos. Com a ajuda da assistente Lise Santos Camargo, Aguiar foi atrás do material de artistas que passaram por Curitiba em acervos tanto particulares quanto públicos, como os da BPP e da Casa da Memória: “Que fossem catálogos, recortes, fotografias, matérias antigas, folders de exposição, qualquer coisa que pudesse dar uma pista de que eles existiram e fizeram algo”.

Por mais densa que seja a pesquisa, alguns nomes acabam escapando, seja pelo tempo para realizar o projeto, pela dificuldade de encontrar determinados materiais ou pelo próprio processo de curadoria, que envolve escolhas e renúncias. “Eu tenho plena consciência de que, por maior que tenha sido o volume do trabalho que eu consegui reunir, ele é um arranhão na superfície. Como eu disse, eu só organizei a bagunça. O que eu me propus a fazer foi colocar todo mundo que fez parte dessa história que tivesse ao meu alcance.”

Por isso, Aguiar vê o livro como um convite para que outros pesquisadores se aprofundem nesses personagens e artistas que foram resgatados pelo quadrinista. “Muitos deles foram esquecidos pelo tempo, pelo descaso da memória ou até porque alguns artistas não compreendem a importância do que fizeram, principalmente os mais antigos.”

Foto: Divulgação/Thapcom.

Na busca pela preservação da memória e pela organização da história das narrativas gráficas de Curitiba que a obra de Aguiar mostra sua força. “Se eu sou quadrinista hoje, se hoje eu sou um autor, é porque teve muita gente que acertou, errou, venceu e perdeu nessa função antes de mim. Há muito tempo tem gente lutando para se expressar, para discutir a sociedade e quadrinhos são uma ferramenta magnífica para isso, por isso que eles sempre se reinventam. A gente vai continuar produzindo porque eles são necessários.”

Narrativas Gráficas Curitibanas é a comprovação da existência de uma cena artística curitibana multifacetada que, há pelo menos dois séculos, irradia artistas que resistiram, lutaram, viveram e se expressaram por meio dos quadrinhos, das charges e dos cartuns. E o mais extraordinário: com a obra, Aguiar não apenas chama a sociedade para conhecer a trajetória da linguagem gráfica local, como reafirma que ainda há muito para ser descoberto.

Obra

A edição impressa, com tiragem de mil exemplares, está sendo distribuída para bibliotecas públicas, universidades e gibitecas de todo o Brasil. 

Aguiar explica que a ideia é que, por ser um patrimônio de todos, o livro seja disponibilizado para o maior número de pessoas, principalmente pesquisadores e acadêmicos. 

A obra, que não será vendida, possui uma versão digitalizada disponível para download por meio do site da BPP.

Sobre o autor

Além de autor premiado de quadrinhos e curador de eventos e exposições, Aguiar é dono da Editora Quadrinhofilia. Entre seus livros mais conhecidos estão CWB, Folheteen – direto ao ponto, Reisetagebuch – Uma viagem ilustrada pela Alemanha, A Infância do Brasil e Coisas de Adornar Paredes.

Como colaborador do Plural, Aguiar publica charges da personagem Malu semanalmente, nas segundas-feiras.

Para conhecer mais sobre o trabalho do autor, acesse as redes sociais: 

Instagram: @quadrinhofilia

Facebook: Quadrinhofilia Produções Artísticas

Youtube: Quadrinhofilia

Reportagem sob orientação de João Frey

Sobre o/a autor/a

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