As várias vidas de Bolívar Teston de Escobar, o vencedor do Festival Jacaré

Gaúcho radicado em Curitiba, ele gosta de ler clássicos e de se divertir no mundo digital, tem vocação para as letras e uma trajetória bem curiosa

Entre todos que se arriscaram na lagoa, quem ganhou foi Bolívar Teston de Escobar. Ele conquistou o primeiro lugar no concurso “Festival Jacaré”, promovido pelo Plural em parceria com a Redhook, para discutir as fake news. O desafio lançado aos participantes era devolver as notícias falsas para o lugar de onde elas nunca deveriam ter saído – a ficção –, uma tarefa que foi cumprida por vários com louvor. Contudo, quem venceu a parada foi “Pormenores do 1º Concurso de Bravatas e Velhacarias de Pamonha Verde”.

Escobar é uma daquelas pessoas boas de se conversar sem pressa. Um gaúcho de 31 anos, nascido em Erechim, que veio aos 17 anos para Curitiba após ter sido aprovado na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Despretensioso, é dono de uma eloquência e um vocabulário invejáveis, acompanhados de muito bom humor. Isso dá algumas pistas de onde saiu um texto capaz de desbancar os outros 285 inscritos no festival, mas só algumas.

Nome incomum

Foi batizado com um nome que chama atenção, sobrenomes também. Teston, indica o lado da família vindo da Itália no passado. Escobar, apesar da coincidência, não se deve a qualquer parentesco com o contraventor colombiano. Sobre o primeiro nome, brinca ao explicar, “esta é a história que me contaram, a história oficial eu nunca vou saber”. Quando sua mãe estava grávida, ganhou o livro “O General em seu Labirinto”, de Gabriel García Márquez, um romance inspirado na vida de Simón Bolívar. Dali nasceu a escolha.

É designer?

O nome incomum não deixou marcas ruins. Sente-se confortável com o diferente, apesar de omitir um dos sobrenomes às vezes, porque não quer “ser visto como uma pessoa perigosa”. Contudo, ele pode quebrar as pernas de quem guarda uma ideia convencional sobre o que é o perfil de um escritor. Por exemplo, embora flertasse com a literatura e com a história, cursou design gráfico. O motivo é simples e continua vivo, gosta de desenhar e sonha em fazer quadrinhos – uma vontade que empurrou para o futuro.

Se engana quem pensa que ele levou o curso adiante apenas para tirar um diploma, não mesmo. Escobar trabalhou como diagramador, inclusive em uma publicação dedicada à literatura, o jornal “RelevO”. Gostou tanto da infografia que a vontade de estudar mais bateu forte e veio o mestrado. Hoje está no doutorado, mas os frilas em design continuam. Sobre conciliar diagramação com escrita em um só profissional, confessa que é quase viver um desastre, sempre acaba faltando algo. Porém, ele reconhece o encanto da união entre os dois mundos. “Há uma compensação ali, uma beleza que surge dessa tragédia; eu acho isso muito legal”, diz.

Comediante de stand-up

O surpreendente poderia ser apenas isso. Poderia, porque Escobar também teve uma rápida passagem pela carreira de stand-up comedy. Ele não se considera um comediante do gênero porque nunca fez um show profissional, que costuma durar uns 40 minutos. Mas, com frequência, ultrapassou a marca dos cinco minutos em eventos de microfone aberto para quem quiser subir ao palco e fazer uso do espaço – o que chamam de open mic, uma espécie de primeiro passo para iniciantes no stand-up.

Professor

O teatro também o levou ao palco uma vez. Gostou muito e até repetiria a experiência. Porém, deixa um alerta seguido de uma risada: “É muito difícil fazer teatro, muito difícil. Não recomendo”. O rapaz afirma que é com outra plateia que busca firmar compromisso. Ele deu aula para o curso de design da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e ali se encontrou, é onde se vê no futuro, à frente de uma sala de aula. “O meu objetivo já há bastante tempo é ser professor, a ideia é seguir nessa carreira”, diz.

O que leu

No pouco tempo livre, competem o dote culinário de fazer pães, que cresceu como uma massa de fermentação natural durante a pandemia; o interesse por videogames; e o gosto pela leitura. Foi ainda no tempo do colégio que o encanto pelas letras surgiu. Foi quando leu Luis Fernando Verissimo e Stanislaw Ponte Preta (ele ainda se lembra de “A Velhinha Contrabandista”), “Harry Potter” e também livros de Bernard Cornwell “que a gurizada adorava”. Depois teve Kurt Vonnegut, com a sátira na ficção científica, e Jorge Luis Borges, com o realismo fantástico. Gosta bastante do sino-americano Ted Chiang e anda lendo a carioca Elvira Vigna. Muitos outros livros e autores aparecem durante o papo e até se ofereceu para fazer uma lista de indicações, sem notar que já havia feito.

Dois títulos ganham destaque. O primeiro foi uma experiência literária de dar calafrios. Contudo, em vez de um trauma, o que apareceu foi a vontade de escrever enquanto os olhos andavam pelas páginas de “O Exorcista”, de William Peter Blatty. O segundo, ele leu e releu. O motivo? “Porque tem um efeito hipnótico na minha cabeça”, explica. É o livro eleito como resposta para a pergunta “Que livro levaria para uma ilha deserta?” e tem um certo ar de predestinação, afinal seu primeiro nome… Se bem que ao ler o texto vencedor do “Festival Jacaré”, dá para suspeitar desse fascínio. Sim, é “Cem anos de solidão”, de Gabriel García Márquez, o “Gabo”.

Vocação e sonho

Outra influência é o mundo digital. Se diverte muito com o caos do Twitter, “todo mundo se xinga, todos os dias tem algum barraco; acho muito divertido”. Já teve blogues de contos, página no Facebook que virou o livro “Vossa Excelência, a Jojoca” (em parceria com o amigo Gabriel Jacobi), uns oito contos publicados no “RelevO”, e um conto que ganhou edital da Biblioteca Pública do Paraná e foi publicado numa coletânea. Com um currículo desses, Escobar surpreendentemente não aspira ser escritor profissional. Questionado sobre em qual atividade gostaria de ser muito bem-sucedido, a resposta é pesquisador, mas também diz: “Acho que vou mudar a resposta cada vez que me perguntarem isso”.

O conto vencedor do “Festival Jacaré”

Leia “Pormenores do 1º Concurso de Bravatas e Velhacarias de Pamonha Verde”, conto de Bolívar Teston de Escobar que venceu o “Festival Jacaré”, aqui.


Sobre o/a autor/a

3 comentários em “As várias vidas de Bolívar Teston de Escobar, o vencedor do Festival Jacaré”

  1. Renato Escobar de Escobar

    Aê Bô. Parabéns. Filho de tigre sai… tigrado…hehe. O Conto foi um tapa de luvas na na hipocrisia da sociedade conservadora “do bem”…O júri também tá de parabéns.

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