fugindo de mim pra me encontrar

deu três da manhã chegou um piazão pediu três litrão e dois marlboro vermelho. marquei na ficha. ele não me olhava no olho. quando saí pra frente no deck vi ele colocando as saidera na mesa e a galera pagando pau. na época três litrão dava trinta pila. com trinta pila tu botava dez litro de gasolina. agora não bota cinco. agora pergunte se o salário aumenta junto. foda. sei que a galera esqueceu do piazão depois que as bera acabaram e bar é tipo qualquer pico nesse sentido. tem sempre alguém que não se encaixa. que vai ficando em silêncio. lá pelas tantas ele botou a mochila nas costas e vazou subindo a rua. aí eu gritei Ô MEU PARCEIRO. e ele começou a correr. se alguém tivesse me apontado ele na rua e dissesse ô, esse tiozin aí quando acende um marlborão corre pique usain bolt eu não botava uma fé. três quadra atrás do piazão. ele parou na fron duma pizzaria e colocou as mão pra cima. me disse que não queria apanhar. eu mandei ele baixar os braço. os motoboy tavam olhando. quanto mais gente se envolve pior. aí dei o papo. nem lembro o que falei na real. no fim das conta ele voltou comigo pro bar. voltei na fron frente dele. pela calçada. lembro de ter pensado uma parada que era tipo, meio que me ligar que eu tava vacilando pra caralho de deixar o maluco vir andando atrás de mim. que quem tinha que ir atrás dele era eu. mas eu não fui. sei lá. mais sorte que juízo. chegamo no bar o piazão levou umas encarada mas ninguém relou a mão nele. nunca foi buscar a identidade. ela ficava no suporte onde a gente encaixava as carteira de cigarro. ficava atrás. quando o marlboro vermelho acabava a cara do piazão aparecia. quando a cara aparecia eu sentia um bagulho estranho. ainda sinto na real. nada a ver ter corrido atrás dele. foi como se na minha cabeça ele tivesse me passado pra trás e a real é que quem quase me passou pra trás foi o dono. três ano trampando quarenta cinquenta sessenta hora por semana. sem carteira assinada. sem décimo terceiro nem férias. quando o bar fechou pra reforma pedi pra receber a conta. ele apertou minha mão e me disse boa sorte. corri atrás de advogado. o advogado por cima calculou em trinta a rescisão e o dono me ofereceu doze. aceitei. cada coisa a gente aceita. cada coisa a gente faz. ia muito policial civil lá no bar mas quase nunca de galera. quando iam de galera era osso. chegava pra servir as dose e enfiavam o celular na minha cara. isso que acontece com quem troca tiro com civil ó. não vá fazer merda 02. ficavam rindo vendo foto de gente sangrando no chão. os cara me chamava de 02. eu ficava pistola. baixava a cabeça e saía me cobrando. porque baixou a cabeça? porque eu tava escrevendo. e escrever pedido em comanda é o corre que tu quer fazer? é o corre que me sustenta. aí trocava uma ideia com a galera que trampava comigo. galera da cozinha. galera do salão. adiantava o que dava pra adiantar porque todo dia era a mesma coisa. eu sabia o que eu tinha que fazer. eu sabia que eu queria ir embora. entrar no fusca. parar no posto. botar no tanque o suficiente pra sumir e conseguir voltar no outro dia porque com um dia de trampo só tu não compra quase nada. quase nada também não né? sessenta pila muda o dia de uma família. por algumas horas. minutos. mas muda. tem um tiozinho que vai lá no museu que só vejo quando tá saindo. a segurança tá na bota dele. ele mangueia um troco com a galera. da última vez levou uma chave de dedo que o indicador dobrou de tamanho. foda. dizem que ele gritou com uma criança. eu não vi. não sou são tomé. uma vez vi uma senhora na porta de casa tretando com o carrinheiro porque o carrinheiro tava pegando o papelão no lixo. ele perguntava mas a senhora não tá jogando fora o papelão meu deus do céu? e a senhora assustada. uma situação de merda. a gente é pior que bicho. bicho não inventa historinha. bicho não é cagueta. bicho come bebe caga dorme alguns se afastam quando sentem que vão morrer. acho isso loco. às vezes a dora sai do nada entra no buraco do sofá eu já ihhhhhh, fodeu. que ninguém pegue o tiozinho de jeito. que ele não grite com nenhuma criança amém.

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