Quando um avião cai

Os acidentes aéreos são, infelizmente, o caminho para uma aviação mais segura

Parte da minha modesta biblioteca particular é dedicada a livros de aviação. Ali tem um pouco de história das companhias aéreas do Brasil e do mundo, coletâneas de fotografias, biografias de figuras importantes desse mundo e obras um pouco mais técnicas. Mas há uma porção que, diga-se, é a maior e a que particularmente mais me atrai: a de acidentes aéreos.

São livros que, a grosso modo, contam sobre alguns desastres aéreos, por que ocorreram e o que mudaram na aviação dali em diante. Há os livros do Ivan Sant’Anna, já clássicos aqui no Brasil, os relatos minuciosos sobre tragédias icônicas na história da aviação, como a explosão do Boeing 747 da Pan Am sobre Lockerbie e a queda do voo 111 da Swissair no Oceano Atlântico, e os episódios sobrenaturais do voo 401 da Eastern Air Lines, com seu sugestivo nome “Ghost of Flight 401”.

O fato é que há uma boa miscelânea de temas dentro desse mundo dos acidentes aéreos. Isso porque eles ocorrem há muito tempo, desde as primeiras tentativas de se conquistar os ares. Sempre ocorreram, continuam ocorrendo e continuarão ocorrendo enquanto houver avião voando.

Apesar do meu fascínio por esse tema, entendo que cada vez teremos menos livros sobre acidentes aéreos. E isso, apesar de reduzir minhas opções de leitura, é fruto de uma aviação cada vez mais segura. Menos acidentes ocorrendo, menos história para contar. É fato, é estatística.

E se hoje é mais seguro voar, é porque os acidentes aconteceram. E com eles muitas lições foram aprendidas. Qualquer desastre aéreo deixa algo para ser evitado no futuro. A evolução na aviação, infelizmente, ocorreu muito em função disso. Foi preciso que as pessoas morressem para que a aviação se tornasse mais segura.

E quando um avião cai eu fico sempre tocado. É triste. Simplesmente triste. São vidas que se foram. Histórias que se foram. Isso porque entraram em um avião que, por algum motivo — na verdade, vários —, não chegou ao destino programado.

E nessas ocasiões, antes de qualquer conjectura, eu realmente prefiro acreditar que aquele acidente ocorreu devido a algo que nunca havia ocorrido antes ou a uma conjunção de fatores que nunca havia se conectado antes. Porque ver pessoas morrendo por algo que poderia ser evitado é simplesmente horrível.

Eu não sou nenhum grande especialista em acidentes aéreos. O meu conhecimento se baseia nessa minha biblioteca e em tantos outros documentos que já li ao longo da minha vida — notadamente os relatórios oficiais de acidentes, que são registros poderosos. E em pesquisas que já realizei e continuo realizando sobre alguns acidentes que ainda não tiveram suas histórias devidamente contadas.

Por isso, quando um avião cai, alguém vem me perguntar o que acho que pode ter acontecido. E quem pergunta, inevitavelmente, se decepciona com a minha resposta padrão: “não sei”.

Ora. A investigação de um acidente aéreo é algo tão, mas tão complexo, que não é um vídeo de um avião despencando que vai dizer o que aconteceu. São tantas variáveis que é impossível chutar. Claro que dá para contextualizar e tentar mirar em algum lugar, mas é tão grande a possibilidade de errar ou de deixar a explicação incompleta que não vale a pena arriscar.

Infelizmente muita gente se arrisca. E nesses casos não esclarecem, apenas confundem. Mesmo aqueles que detêm autoridade no tema acabam deslizando. Mesmo aqueles que falam que é preciso esperar a investigação, mas não perdem a oportunidade de dar a opinião, “baseada em fatos”.

Então, quando um avião cai, prefiro sentir pelos que foram e esperar o tempo necessário para entender o que aconteceu. E torcer para que as conclusões evitem que outras vidas sejam levadas em um acidente aéreo.

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