A Associação Comercial deveria estar do lado do comércio, não só dos grandes

Faz parte da rotina do empreendedor brasileiro uma pequena disputa sobre serviços prestados por concessionárias de serviços públicos. Tive uma recente que, como a maioria delas, resulta de uma cobrança indevida. Lá no começo do imbróglio, no entanto, após me recusar a efetuar o pagamento abusivo, recebi um envelope que viria a conter a intimação. Não consegui identificar de pronto a origem e razão da comunicação, era um envelope timbrado da ACP – Associação Comercial do Paraná.

Não sabia que eles possuíam produtos de cobrança para empresas de Lucro Real se protegerem da ameaça que empresas que estão no Simples Nacional, como a minha, podem representar. Pois, essa demonstração é das mais simbólicas quando tratamos da Associação Comercial do Paraná. Acabei ganhando a ação, com direito a proibição liminar de ser contatado pela empresa, que me assediava diariamente ligando para o meu celular. Mas ganhei às custas de contratar um advogado e me virar, porque é isso que cabe aos pequenos empresários, iguais a tantos outros populares: nos virar. Já os grandes, podem contar largamente com os produtos, sorrisos, apertos de mão ou o silêncio ensurdecedor da associação paranaense para fazer valer suas vontades e suas cobranças.

Desde a semana passada, com direito a passeatas, abaixo-assinados, manifestos, audiências públicas e toda forma de indignação canalizada que o valha, um contingente muito grande de empresários da capital se demonstra absurdamente insatisfeito com os mandos da prefeitura no que diz respeito ao aumento da passagem de ônibus. Além de ter sido executado de forma autocrática por Rafael Greca (PSD), ele não leva em consideração a atual situação dos empreendimentos que não conseguem absorver mais custos advindos de qualquer direção, isso sem contar com o óbvio impacto sobre a população.

O novo aumento retira do comércio uma quantia aproximada de vinte milhões de reais por mês e a manda direto para os bolsos do concessionário público. Que fácil empreender dessa forma, não? Não se precisa preocupar em ser eficiente nunca: é só pedir mais um aumento, que o prefeito prontamente o obedece. Dinheiro extra também nunca foi problema: em três anos já foram mais ou menos oitocentos milhões de reais doados para salvar o sistema dito em risco de colapso, desde a pandemia.

Pobres dos pequenos empresários que colapsaram de fato, na taxa de quatro a cada dez, durante o mesmo período, que não têm ou nunca tiveram essa predileção do prefeito. Mas para a ACP, a associação que deveria representar a todos, está tudo bem. O problema para a ACP era a ascensão do PT, como bem disse seu ex-presidente, Camilo Turmina, em entrevista no ano passado.

O novo presidente parece seguir à risca a mesma cartilha. Um comércio agonizante que emprega 70% da mão de obra brasileira, que não teve nenhuma ajuda na pandemia, que opera muitas vezes abaixo da inflação, que é responsável pelo vale-transporte de grande parte da população usuária do transporte, não o parece causa sensível o suficiente para que a sua associação tome partido. Já no caso as vindas do dono do Havan pedindo o escancaro de tudo e todos durante a pandemia, pareceu bem mais apropriado apoiar. Sem contar os comícios do nefasto ex-presidente e suas brincadeirinhas de moto com dinheiro público. Essas também pareceram justas e necessárias.

Coitado do Barão do Serro Azul, fundador da associação, que deve se revirar no túmulo quando olha pra atual diretoria e conselho e sabe que aqueles senhores representam tudo pelo qual, ele, progressista egresso da escola de humanidades do Rio de Janeiro e abolicionista convicto, lutou contra. Este repositório de atraso real, travestido de conservadorismo, não consegue entender que um transporte de qualidade e com preço justo pode ser a força motriz de uma retomada do comércio. Preferem deixá-lo como o freio de mão que ele hoje em dia representa.

Nem a força de uma associação nacional e mais abrangente, a ABRASEL – Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, que de pronto se manifestou favorável às reclamações, fez o conselho da ACP levantar da cadeira. Ainda que a própria ABRASEL não seja afeita a partidarismos, ela viu o óbvio: há algo de errado no transporte de Curitiba que não favorece a ninguém. A entidade não só comprou a briga como também mandou seu Presidente, junto com outros empresários, a reuniões no Ministério Público e deixou-se representar em outras tantas ocasiões por esses empresários que buscam esclarecimentos junto ao poder público.

Escrevo este texto sabendo que não serão minhas críticas que farão uma adesão mágica da associação. Não tenho a envergadura respeitada por eles. Escrevo por respeito à figura do Barão do Serro Azul, um progressista, que não deve ser vinculado às recentes atitudes da ACP. Escrevo também por nós pequenos, que devemos enxergar claramente quem de fato nos representa e a quem devemos nos associar. No mais, no auge dos meus aproximados quarenta anos, tenho plena certeza de alguns clichês, um deles é que de onde não se espera nada, nada vem mesmo.

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