Sucesso brasileiro nas Paralimpíadas não reflete condições de atletas com deficiência

Atletas veem limitações estruturais, financeiras e sociais mesmo em cidades com acessibilidade como Curitiba

As Paralimpíadas de Tóquio terminaram e o Brasil consolidou-se como potência mundial na competição com a sétima colocação no quadro de medalhas, conquistando 72 delas. O país também alcançou a centésima medalha de ouro de sua história na competição. Apesar do sucesso, o atleta brasileiro com deficiência que decide ingressar no esporte ainda enfrenta dificuldades como a falta de patrocínio, visibilidade e dificuldades básicas, como a acessibilidade aos espaços de treinamento.   

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 45 milhões de brasileiros têm algum tipo de deficiência e, mesmo diante deste dado, muitas cidades ainda não estão adaptadas. Ainda conforme o IBGE, somente 11,7% das cidades brasileiras possuem ônibus totalmente adaptados e isso reflete na ida aos treinos.

A chefe de Classificação Funcional da Federação Internacional de Canoagem, Maria de Fátima Fernandes, exemplifica os desafios: “Antes do esporte, existe a questão da acessibilidade, da pessoa conseguir chegar, porque nem todo mundo tem condições, não por falta de vontade, mas, por exemplo: se um usuário de cadeira de rodas tem, entre a casa dele e um ponto de ônibus, um trilho de trem, ele tem dificuldade para chegar no ponto de ônibus. Se ele não tem essa dificuldade para chegar no ponto de ônibus, ele ainda vai ter que esperar um ônibus que seja adaptado”.  

Darlan França Ciesielski Júnior, gerente de Esportes da Associação de Deficientes Físicos do Paraná (ADFP), também aponta a questão do transporte como grande limitador. “As empresas de ônibus só deixam entrar quantidade limitada de atletas e se você tem quatro atletas que vão para o mesmo local, tem que esperar o próximo ônibus adaptado para poder voltar para casa”, diz. 

As transmissões  

Diferentemente das Olimpíadas, as transmissões das Paralimpíadas ficaram concentradas na TV por assinatura e isso resulta também na menor visibilidade dos atletas. Fernandes vê na proporção da cobertura das olimpíadas o cenário ideal. “Não precisa ser idêntica, tem características diferentes. As proporções são distintas, o número de atletas é distinto, mas que fosse proporcional e que fosse natural essa proporcionalidade nas transmissões e coberturas’’.  

Carmem Oliveira, esgrimista curitibana que competiu nas Paralimpíadas de Tóquio, reclama do espaço midiático também. “Houve muito pouca divulgação. Teve um ou dois canais abertos, mas isso significa quase nada. Algumas modalidades, exemplo a minha, que é esgrima, foi uma que nem apareceu. Ainda tem muito a melhorar nesta questão”, diz.

O gerente da ADFP Ciesielski Júnior concorda com isso. ‘’A visibilidade que a imprensa dá para o paradesporto seria massiva se todos os esportes tivessem sinal aberto, para que a emissoras que detêm o direito de transmissão pudessem, nas suas grades, na sua programação, estar passando os esportes paralímpicos na mesma forma que foi o olímpico’’. 

Patrocínio  

Se a falta de patrocínio afeta o esporte olímpico brasileiro, imagine o paralímpico. Criada em 2006, a Lei de Incentivo ao Esporte foi pensada para aumentar a iniciativa da pessoa física e jurídica para investir no esporte por meio do imposto de renda. Ela permite que o contribuinte use parte do valor devido ao imposto para fins esportivos em instituições aprovadas pelo Governo. A mudança, no entanto, não resolveu os problemas com falta de investimentos em clubes e atletas.  

Segundo Fernandes, é preciso apostar em “melhor preparação dos gestores, para conseguir buscar (recursos), políticas públicas para manter e melhorar essas condições de encaminhamento de projeto e um trabalho da sociedade para também contribuir, porque isso tem a possibilidade do uso de um percentual do imposto de renda”. 

“Um atleta precisa é ter valor. E valor não é só questão do valor, é ter direitos. Falta muito ainda. Políticas públicas voltadas ao esporte e também incentivo, como patrocínio, pois ele é necessário para que o atleta possa ter desempenho, principalmente no alto rendimento“, diz a esgrimista Carmem Oliveira.

Realidade em Curitiba

Apesar dos centros de esportes adaptados, Curitiba ainda tem limitações para o acesso a pessoas com deficiência. Oliveira relata algumas dificuldades para chegar aos treinos: “Desde minha casa ao local de treino não tenho dificuldade, os ônibus, na maioria, ou quase todos, tem elevador. Lógico, encontramos algumas calçadas por aí ruins, Em questão de ônibus, sofro falta de respeito no assento preferencial. Às vezes vou até o local de treino em pé’’.

O coordenador do Paradesporto da Secretaria de Esporte e Turismo do Paraná, Mario Sérgio Fontes, também reconhece alguns diferenciais na capital paranaense, mas vê a necessidade de melhorias. “Na grande maioria dos locais de Curitiba – isso que Curitiba é, sim, uma das capitais que, possamos dizer, está num bom nível de acessibilidade –, mas dizer que está ideal jamais, próximo ao ideal, muito menos. Caminhando para o ideal, eu ainda não acredito”, diz.

A pessoa com deficiência que pretende praticar atividades físicas na capital paranaense tem algumas opções. Entre elas estão os Centros Esportivos da Prefeitura. Fechados em março de 2020, para evitar o contágio da Covid-19, os espaços foram reabertos para aulas presenciais em 15 de julho.

As aulas são auxiliadas por profissionais de Educação Física da Secretaria Municipal do Esporte, Lazer e Juventude (Smelj). Eles são preparados para adaptar as atividades físicas nas aulas para pessoas com deficiência, segundo a assessoria de imprensa da prefeitura de Curitiba.

Em nota, a assessoria também garante que “a maioria dos equipamentos esportivos da Prefeitura possui acessibilidade em condições que possam garantir o acesso e o uso nos ambientes das atividades físicas para cadeirantes, pessoas com deficiência física e com dificuldades de mobilidade física’’.

Locais para prática de esportes para pessoas com deficiência em Curitiba

  • Centros de Iniciação ao Esporte (CIE) da CIC e do Cajuru: possuem elevadores de acesso ao mezanino, banheiros e vestiários adaptados. A praça olímpica do Cajuru fica na Rua Antônio Moreira Lopes, 190, no Parque Olímpico do Cajuru. A praça olímpica da CIC fica na Rua Sebastião Ribeiro Batista, s/n, Praça da União.
  • Centro de Esporte e Lazer Dirceu Graeser (Praça Oswaldo Cruz): possui rampas de acesso e banheiros adaptados.
  • Clube da Gente Santa Felicidade e a Rua da Cidadania: conta também com banheiros exclusivos.
  • Centro de Esporte e Lazer Avelino Vieira: localizado no Bacacheri, tem acessibilidade e conta com banheiro adaptado.
  • Centro de Esporte e Lazer Rua da Cidadania Boa Vista: possui rampa de acesso.
  • Clube da Gente Boa Vista: tem acessibilidade e conta com banheiros adaptados.
  • Clube da Gente CIC: possui banheiros adaptados.
  • Clube da Gente Tatuquara: tem acessibilidade e conta com banheiros adaptados.
  • Clube da Gente Bairro Novo: tem rampas de acesso no nível da rua.
  • Centro de Esporte e Lazer Velódromo: localizado no Jardim Botânico, tem acessibilidade à pista didática e de competição.
  • Centro de Atividade Física Ouvidor Pardinho: localizado no Rebouças, tem banheiro adaptado e rampas de acesso para cadeirantes.
  • Centro de Esporte e Lazer Rua da Cidadania do Pinheirinho: possui acessibilidade a todos os espaços e rampas para as salas superiores e inferiores.
  • Centro de Esporte e Lazer Zumbi dos Palmares: localizado no Pinheirinho, possui alguns acessos acessíveis no local, como guias rebaixadas.
  • Centro da Juventude Eucaliptos: localizado no Alto Boqueirão, possui rampas para cadeirantes no acesso principal e no estacionamento, banheiros adaptados no prédio principal, na piscina e nos vestiários.
  • Centro de Esporte e Lazer Xaxim: tem rampas de acesso ao cadeirante e banheiros adaptados.    
  • Centro de Esporte e Lazer Menonitas: localizado no Hauer, possui banheiro acessível e guias rebaixadas de acesso à Praça Menonitas.
  • Clube da Gente Bairro Novo: possui acesso às portas, banheiros adaptados e vaga preferencial em frente ao equipamento público.
  • Centro de Esporte e Lazer Bairro Novo: possui rampa de acesso e banheiros adaptados.
  • Centro da Juventude Audi União (CEJUV): localizado no Uberaba, possui acessibilidade como rampas de acesso e sanitários.
  • Centro de Esporte e Lazer Rua da Cidadania do Boqueirão: possui acessibilidade: rampas, sanitários e elevadores.
  • Centro de Esporte e Lazer Caio Junior: localizado no Jardim das Américas, tem rampa de acesso na calçada dando acesso à entrada do centro esportivo.
  • Centro de Esporte e Lazer Afonso Botelho: localizado no Água Verde, possui elevador, e a Rua da Cidadania Portão tem rampa de acesso para as salas.

Orientação: Guilherme Carvalho (professor e jornalista).

Sobre o/a autor/a

Compartilhe:

Leia também

O (des)encontro com Têmis

Têmis gostaria de ir ao encontro de Maria, uma jovem vítima de violência doméstica, mas o Brasil foi o grande responsável pelo desencontro

Leia mais »

Melhor jornal de Curitiba

Assine e apoie

Assinantes recebem nossa newsletter exclusiva

Rolar para cima