Francês Yvan Attal tenta fazer filminho alto astral com “Meu cachorro e eu”

Mas falta aos franceses uma ingenuidade fundamental para contar esse tipo de história em que o bicho é uma das alegrias da vida

É uma coisa engraçada ver um francês tentando fazer um filminho despreocupado de cachorro. Sabe aqueles em que o protagonista adota um cachorro – ou melhor, o cachorro adota o protagonista –, sofre um horror porque o animal destrói móveis e baba e cheira mal, mas no fim descobre que conviver com um bichinho é uma das alegrias da vida? Pois é isso que Yvan Attal tenta fazer com “Meu cachorro e eu”, um filme de 2019 que acaba de estrear discretamente no streaming (você precisar comprar ou alugar na Apple TV ou no Google Play).

A graça de ver um francês se aventurando no terreno das sessões da tarde está no fato de que falta a eles uma ingenuidade necessária para esse tipo de filme. Tenha em mente, por exemplo, que “Marley e eu” (2008) tinha Owen Wilson no papel principal, um ator que fez carreira com tipos ingênuos e gente boa.

“Meu cachorro e eu”

Em “Meu cachorro e eu”, o “eu” é o escritor Henri Mohen, interpretado Yvan Attal, um ator francês do time B (ele não é muito conhecido), mas que criou algumas coisas legais como diretor e roteirista. É dele o filme “O orgulho” (2017), em que uma estudante de origem árabe e pobre (Camélia Jordana) aprende a vencer debates universitários com um professor branco e afetado (Daniel Auteuil). Com esse enredo, Yvan Attal já dava sinais de ter um pé mais no cinema pop.

Aqui, em “Meu cachorro e eu”, ele se inspira num romance de John Fante, famoso pelo livro “Pergunte ao pó”. A história fala então de um escritor que não vive uma fase boa: ele não consegue escrever, está absolutamente cansado da família e não tem perspectiva de mudança.

Sua mulher no filme, Cécile, vivida pela atriz Charlotte Gainsbourg, é esposa de Yvan Attal na vida de fato. Um dos três filhos dele na ficção é também seu filho de verdade, o ator Ben Attal. Essas informações são significativas porque você poderia pensar que um filme feito em família teria um clima descontraído. Afinal, uma forma eficaz de fazer uma comédia divertida é quando o elenco também se diverte. Mas não é isso que acontece com “Meu cachorro e eu”.

“Meu cachorro Estúpido”

Henri é chato, a esposa dele é chata, os filhos são chatos. O cachorro é a única criatura que não é chata na história, mas ele não aparece muito (o que é outro erro num filme que tem “cachorro” no título). O bicho é um mastim napolitano de nome Rocco, mas que a família chama de Stupide – o nome original do filme e do livro em que ele se inspira é “Meu cachorro Estúpido”.

O filme acaba sendo insatisfatório porque a relação com o cachorro é mal elaborada. O bicho deveria significar alguma coisa – talvez a crise de meia-idade experimentada pelo escritor? Mas, se esse for o caso, é como se essa crise não fosse reconhecida pelas pessoas ao redor dele. Assim como mal reconhecem a existência do cachorro. Todos querem se livrar do animal o mais rápido possível.

Resta ao pai se agarrar à metáfora – se agarrar ao cachorro – enquanto pode. E aceitar que sua importância naquela família diminuiu. Como diminui para todo mundo que desempenha bem o seu papel de pai ou mãe – e no fim se torna desnecessário.

Onde assistir

“Meu cachorro e eu” está em cartaz no streaming para alugar ou comprar na Apple TV (R$ 14,90 e R$ 29,90) e no Google Play (R$ 7,90 e R$ 29,90).

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima