Vou começar com um exemplo simples.
A mãe diz pro filho que não sai do chuveiro: “Sai daí, desliga isso! Você não tem consciência? Não pensa no dinheiro do seu pai? Você acha que dinheiro dá em árvore?”
Entendeu?
Não?
Compreendo. Foi muito básico. Então vamos a este: a mesma mãe, o mesmo menino no banho: “Desliga logo, você não sabe que tá desperdiçando água? Você acha que tem água assim, pra jogar fora? Você não tem consciência disso?”
Hummm. Não? Não vê a relação?
Bom, vamos ver assim. A criança pergunta pra professora: “Por que existe esse negócio de dia da Pátria?”
E ela responde: “Para lembrar que somos todos brasileiros e que temos um passado, uma história, uma herança comum. Nosso lugar no mundo é aqui e a consciência disso ajuda a respeitar nossa terra e também a terra dos outros que, no fundo, é uma terra só.”
Agora sim! Viu como é fácil?
Não?
Vou tentar mais uma vez.
Aniversário da bisavó, a família toda se reúne: primos nunca vistos, parentes por afinidades, tias com maridos novos, um zum zum zum de conversas disparatadas , os olhares voltando-se o tempo todo para o estacionamento. Mas aí vem a bisa, 99 anos, o olhar firme, o andar claudicante. Ela se posta em frente ao bolo, mira os convidados, aquele olhar longo que vai se marejando, vertendo lágrimas que escorrem pelos caminhos da face. E ela diz: “vocês são as minhas melhores lembranças”. E a consciência dessa verdade profunda provoca um calor que se espalha, denso, terno, cálido, pela longa e divertida noite.
Acho que deu, não?
Veja o que diz o dicionário:
Consciência: “Sentimento ou conhecimento que permite ao ser humano vivenciar, experimentar ou compreender aspectos ou a totalidade de seu mundo interior.” Ou ainda: “sentido ou percepção que o ser humano possui do que é moralmente certo ou errado em atos e motivos individuais.”
Muito bem. Se você concorda que se pode usar a palavra consciência quando a mãe apela ao filho para que ele cuide dos gastos da casa porque interessa a toda família; se você concorda que se pode usar a palavra consciência quando essa mesma mãe lembra ao filho que os recursos do mundo não são infinitos e que todos precisamos fazer a nossa parte; se você concorda que se pode usar a palavra consciência quando falamos das datas cívicas, como marcos de referencia de nosso país, nação, pátria, lugar real e simbólico de vivencia e memória, patrimônio coletivo que precisa ser preservado e perpetuado; se você concorda que podemos usar a palavra consciência quando se fala em família, filiação, recordações de amor e amizade, histórias comuns e alegrias compartilhadas.
Então. Os negros lembram, no dia 20 de novembro, que são tudo isso e parte disso tudo: filhos, mães, professores, profissionais, políticos, artistas, cidadãos. São tudo isso e parte disso há séculos, com sangue, suor e lágrimas, com arte e determinação, com talento e profissionalismo, com paciência e destemor.
Eu tenho consciência disso. Ajudaram-me a ter consciência disso. Levou tempo para eu ter consciência disso. Hoje tenho plena consciência disso e acho óbvio, como deveria ser.
O dia da consciência negra é para quem pergunta: “Para que serve o dia da consciência negra?”.
É para você?