“Vamos matar você, jogar gasolina e tacar fogo”, disseram sequestradores de Guarani

Sequestro e tortura de Guarani ocorreu em região marcada por confrontos entre indígenas e proprietários de terras

O rezador da aldeia Y’Hovy, localizada na Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, no Oeste do Paraná, chegou perto das 20h do dia 14 de janeiro para realizar o ritual da reza, que normalmente ocorre no final da tarde. A comunidade só soube que ele havia sido sequestrado e torturado horas antes quando sua filha denunciou o ocorrido ao cacique da aldeia.

“Ele disse que tinha saído da aldeia com o filho perto do meio dia para procurar bico e quando chegou na frente de um ferro-velho foi surpreendido por dois homens armados”, contou o cacique Ilson Soares ao Plural.

Os dois homens, um mais velho (grisalho e de barba) e outro mais jovem, mandaram os indígenas pararem. Assustado, o filho do rezador correu para se esconder no ferro-velho e ouviu disparos em sua direção. Ele não foi atingido. Enquanto isso, os homens amarraram as mãos e os pés do rezador.

“Depois de dar coronhada de pistola, levaram o rezador para uma casa e bateram nele. Enchiam os ouvidos e a boca dele de água, e ficavam fazendo ameaças o tempo todo: ‘a gente vai matar você, jogar gasolina e tacar fogo’, ‘vocês [indígenas] são um bando de vagabundo, ladrões'”.

Após algumas horas, o rezador foi colocado no porta-malas de um carro e levado até um centro urbano na região de Guaíra. Perto da beira de uma estrada, os homens retiraram o indígena do veículo e, como ele estava coberto de sangue e barro, o lavaram com água de uma mangueira. O rezador foi abandonado logo depois. 

De acordo com o cacique, o rezador registrou um Boletim de Ocorrência cerca de cinco dias após o ocorrido. “A gente não iria fazer nenhuma denúncia a princípio, mas como ele estava muito machucado – não conseguia comer devido aos ferimentos da boca – resolvemos levá-lo para o Pronto Atendimento e depois registramos um B.O.”

Ao Plural, a Polícia Civil do Paraná informou que a vítima registrou um boletim de ocorrência por lesão corporal, após uma briga, e que está apurando o caso.

Conflitos na Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá

A Y’Hovy é uma das 14 aldeias localizadas na Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavirá. Com uma área de aproximadamente 24 mil hectares, a TI abriga 1.360 indígenas das etnias Guarani e Guarani Ñandeva, e se estende entre os municípios de Guaíra, Terra Roxa e Altônia, no oeste do Paraná.

Apesar de ser reconhecida pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como uma TI desde 2018, a região teve a demarcação de terra suspensa por decisão da Justiça Federal de Guaíra em 2020.

Na época, o juiz da 1ª Vara Federal de Guaíra atendeu à solicitação do município, que argumentava que a demarcação deveria ser anulada porque a Funai não permitiu à prefeitura participar dos estudos e levantamentos realizados para a demarcação da TI. O juiz ainda determinou multa diária de 75 mil reais à Funai em caso de descumprimento da decisão. 

Por este motivo, a Fundação estabeleceu, por meio de portaria, a anulação do processo de identificação e delimitação da Terra Indígena. Mas, em junho do ano passado, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a Funai anule a portaria e restabeleça a integralidade da delimitação da TI por entender que a sentença da Justiça Federal de Guaíra não determinou a imediata anulação de todo o procedimento de demarcação.

De acordo com o Instituto Socioambiental (ISA), o processo de delimitação da Tekoha Guasu Guavirá, que em 2023 entra em seu quinto ano de tramitação, é motivo de conflitos constantes entre indígenas e latifundiários da região. Ao menos desde 2018 lideranças de aldeias relatam diversos atentados com armas de fogo, sequestros-relâmpago, tentativas de atropelamento e agressões físicas sofridas pelos indígenas.

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1 comentário em ““Vamos matar você, jogar gasolina e tacar fogo”, disseram sequestradores de Guarani”

  1. Cirço Aparecido Nabor

    Este é um dos tantos fatos lamentável de violencia, abrupta contra os povos indígenas desta região, precisamos fazer com que estas denúncias chegue ao ministerio da justiça. Pois, agor sim nós temo governo no Brasil. E precisamos urgentemente fazer ecoar estes abusos e truculência contra os verdadeiros brasileros que estão nestas terras à mais de 10 mil anos. O Ministério indígena também precisa ser avisado. Chega destes bestiais desumanizados ficarem atormentando as aldeias é de colocar estes grileiros na cadeia.

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