“Cenário de guerra” em UPAS de Curitiba

Pacientes recebem oxigênio no chão; faltam leitos, insumos e profissionais estão exautos

As Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Curitiba, que fecharam as portas para urgência e emergência na última semana, e atendem agora, exclusivamente pacientes da Covid19, já vivem um “cenário de guerra”, segundo relato de profissionais da Saúde. Sem EPIs, acomodações e profissionais suficientes para atender, as UPAs estão lotadas e já há relatos de pessoas falecendo à espera de leito de UTI.

“Um cenário desolador, de guerra. Não tem onde por paciente, não tem respirador, não tem monitor, não tem os aparelhos básicos para trabalhar”. É assim que começa o relato de uma funcionária da UPA Sítio Cercado, contando sobre seu final de semana de trabalho.

A funcionária, que prefere não se identificar, diz ainda que faltam profissionais e que os contratados pelo Processo Seletivo Simplificado (PSS) não recebem treinamento. “Há poucos funcionários e o pessoal que entra ali, PSS, não tem treinamento. Eu não tive”, afirma.


Ainda, pelas imagens que foram encaminhadas para o Plural, é possível ver pacientes acomodados em poltronas, todos na mesma sala para receberem oxigênio. Além de pacientes em macas nos corredores, e até no chão.

“Alguns estão tendo que levar os cobertores das suas casas e também há relatos de que faltam pijamas pois, segundo nos informou a Secretaria de Saúde, também estão sem lavanderias”, revela Patrícia da Rosa Mendonça, diretora do Sindicato dos Servidores Municipais de Enfermagem de Curitiba (Simec). Ela lembra que as UPAs não têm estrutura para atendimento em massa. “Elas não foram projetadas para serem hospitais, elas foram feitas para serem transitórias.”

Pacientes com e sem Covid ficam juntos recebendo oxigênio. Foto: Sismec

De acordo com o Sismec, a procura por atendimento nas UPAs, tanto de pessoas com Covid quanto sem, aumentou mais de 300% nas últimas semanas. “Não é um problema pontual, uma situação que aconteceu em uma UPA, são em todas.”

Os trabalhadores contam que os pacientes não têm macas e cilindros de oxigênio individuais na internação da UPA. “Onde ficava uma maca, agora ficam cinco ou seis poltronas. Pacientes empilhados, um do lado do outro, dividindo o torpedo de oxigênio.”

É preciso ir de setor em setor buscar aparelhos necessários para o atendimento dos pacientes com Covid. “A gente está correndo os outros setores para buscar aparelhos que precisamos. Já teve um ano pra se prepararem e deixaram virar este caos”.

No chão

O Plural recebeu, ainda, imagens em vídeo da UPA Pinheirinho. Por lá, é possível ver que além dos pacientes estarem em poltronas, todos na mesma sala, havia também uma senhora que está deitada no chão, na sala onde se recebe oxigênio.

Uma das funcionárias nos disse que se sente impotente diante da situação. “É desumano tudo isso. Não tem onde acomodar um paciente decentemente”, afirmou. “São seres humanos que estão doentes e sem condições de cuidado. A sensação é de impotência”, completa.

Outro servidor relata que a falta de EPIs para todos tem preocupado os profissionais. “A gente tem o setor da Covid, que fica próximo ao corredor de emergência e só estão fornecendo todos os EPIs para quem está dentro daquele setor da Covid. Os funcionários que estão na emergência, se precisarem entrar no setor de Covid grave pra ajudar, até se paramentarem, já era”, avalia. “Não estão fornecendo nem pijamas, nem máscara de ‘bico de pato’, só a cirúrgica”, que segundo consta, não é apropriada para quem tem que ter contato direto com contaminados.”

Além da falta de EPIs, os profissionais da UPA Pinheirinho alertam que já faltam também respiradores. “Nesta noite, não tinha respiradores para intubar os pacientes, não tinha bomba infusora, que é essencial para fazer o controle da sedação”, conta.

UPAs de Curitiba sem vagas

Ainda segundo os profissionais ouvidos pela reportagem – que terão suas identidades preservadas por medo de represálias -, o alto volume de pacientes é agravado por problemas estruturais que colocam toda a equipe de Saúde em perigo. “O volume de pacientes é superior ao espaço físico que a gente tem. Isto é um risco tanto para os pacientes, quanto para a gente, porque o espaço físico é estreito demais, as pessoas ficam muito próximas e a transmissão do vírus acontece e isto está contaminando os profissionais.”

Manter o distanciamento social é impossível. Foto: Sismec

Ao serem questionado sobre fila de ambulâncias em frente à UPA, os funcionários afirmam que ela só não acontece “porque as ambulâncias deixam os pacientes e nós temos que nos virar para atender”. “Todo mundo que chega, entra e a gente vê onde que coloca. Às vezes, a gente tem que por dois ou três pacientes dividindo o mesmo cilindro de oxigênio, porque as saídas já estão todas ocupadas”, diz. “Esta situação toda nos deixa sobrecarregados e estressados. Está tudo muito desorganizado por causa dessa correria”, completa o servidor.

Exaustão 

“Vocês não sabem o que a gente está passando. Vocês não sabem o que é estar vendo um paciente morrendo e você não poder fazer nada”. É neste tom que a auxiliar de enfermagem, Edna Moura, trabalhadora da UPA Campo Comprido, inicia um vídeo que postou nas suas redes sociais na última semana. 

No vídeo, que até o momento desta publicação tinha quase 400 compartilhamentos, Edna está no seu momento de descanso e chora no estacionamento, dentro do carro. Ela conta que tinha acabado de atender um paciente que estava com 15 litros de oxigênio, que “é o máximo que um paciente pode receber, e que não estava reagindo”. O paciente foi a óbito pouco tempo depois. 

Hoje, em entrevista ao Plural, Edna contou que fez o vídeo, pois estava cansada e indignada com a situação pela qual passa a saúde em Curitiba. “Faltam respiradores, no meu último plantão não tinha mais cilindro, poucos funcionários. Era tanta gente chegando que eu não estava dando conta de atendê-los.”

Ela pede compreensão dos familiares de pacientes. “Não ganhamos nenhum extra para fazer isto. Pelo contrário, nossos descontos e impostos são cada vez mais altos. Nossa equipe está se desdobrando para conseguir dar um atendimento com dignidade para os enfermos.” 

Sobre a lotação, a auxiliar de enfermagem também conta que, quando não existem mais macas para atendimento, a solução é improvisar. “Se chega um paciente mais grave, tiramos da maca e colocamos na cadeira e invertemos”, explica.

Recursos esgotáveis

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde diz que “tem feito todos os esforços possíveis na ativação de estruturas com capacidade hospitalar”. Mas, no entanto, é preciso que a população colabore para reduzir a transmissão do vírus. A pasta destaca que “os recursos são esgotáveis”, e que a “mudança do perfil da Covid-19 está gerando esgotamento das estruturas físicas e de pessoal disponível na cidade, em todos os níveis, público e privado”.

A Prefeitura de Curitiba alerta que a doença tem apresentado um perfil de maior transmissibilidade e agravamento em menor espaço tempo, “além do agravamento em pessoas mais jovens, cenário raro ao longo de 2020″.

Quanto à falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), a Secretaria diz que não procede a afirmação. “A SMS tem fornecido todos os EPIs preconizados para as equipes.”

Colaborou: Maria Cecília Zarpelon

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27 comentários em ““Cenário de guerra” em UPAS de Curitiba”

  1. Não criaram nenhum hospital de campanha, que onde as pessoas com Covid deveriam estar, separadas de outras doenças, Curitiba está cheio de lugares e governo estadual e prefeitura receberam milhões do governo federal, para quem dúvida, e só entrar no portal da transparência no site do governo e ver e aberto para todos os cidadãos poderem cobrar todos os direitos que temos, Não tem espaço, não tem materiais, não querem fazer o tratamento precoce, só podia dar nisso

  2. NILZA CARDOSO GRANADO

    KD o dinheiro enviado? O caos sempre houve, mas nesse tempo é pra desviar os olhos dos rombos que os governantes deram e continuam dando. Se os recursos recebidos do Governo Federal, tivesse sido investido de forma correta, com certeza esse caos seria evitado e muitas vidas teriam sido poupadas.

  3. rUdolfo Strassmann

    Vejo pouca referência aos maus exemplos dados pelo PR Jair.
    É bem lógico que seus seguidores não se comportem de acordo com as orientações da OMS.
    Sem dúvida, há responsabilidades a serem ajuizadas!

    1. Lenir Terezinha Riva

      Onde eu moro a maioria do povo anda nas ruas sem máscaras, daí da nisso. Vivem como se não houvesse vírus.
      Temos um governo genocida, mas o povo não precisa seguir as orientações dele. Cada um tem que se cuidar, ter conciencia

  4. Isso tudo acontece porque a população não tem consciência do que é esse vírus. Não se cuidam, acham que a saúde pública é obrigada a “fabricar” locais para atendimento. A culpa desses fatos é da população…..

  5. A Secretaria *desmentiu* os funcionários a respeito dos EPis..ácham que a Profissional que gravou o vídeo iria se expor Mentindo sobre o CAOS? Não ofendam a *inteligencia do POVO*!!!. ou tudo exposto é.*falso, criaram um cenário para Comover o povo E ISSO ?

  6. Corroboro com toda opiniao salutar. Agora acusar o governo de estar tudo cheio, e ser o unico culpado isso chama-se politica. O sistema de saude e ridiculo, desculpe os bons funcionarios, mas a maioria nao tem condicao psicologica de atender a populacao. esse prefeito de Curitiba e ultrapassado bem como secretario de saude e secretaria. Solucao pra eles e fechar, sem orientacao.O povo e culpado em sua maior parte, nao se cuidam, nao tem o distanciamento, fumam o mesmo baseado e a porcaria do narguile, lotam onibus, nao tomam uma vitamina sequer, e lotam as UPAS. As vezes vao 3 4 pessoas pra levar um familiar. Educacao cultura seria necessario. Fui….

  7. ELIZABETH MARA DUARTE FERNANDES

    Ué???? E o dinheiro que o atestado recebeu do Governo Federal. Onde estão os hospitais de Campanha??? Aliás!;Onde está o Ministério Público que não investiga o descaso. Público. Fica fácil receber recursos, não administrar e fechar a cidade. ?

    1. Vergonha para o prefeito que sempre diz que Curitiba é exemplo, é cidade de primeiro mundo. Só se for lá na casa dele. Cadê os respiradores que foram comprados ano passado. Vergonha de. Prefeito. Inadmissível está situação.

  8. Peraí, o Prefeito não disse que tem milhões em caixa para comprar vacina, o governo federal não mandou um monte de dinheiro, o que fizeram nestes últimos 365 dias? Não criaram novas forças tarefas, não angariaram mais profissionais de saúde, não pagaram + bonificações a esses profissionais, não aumentaram ou criaram mais vagas de UTI, não compraram mais respiradores? Fizeram exatamente o quê? Até o mais imbecil dos imbecis que lê google sabia dos repiques da doença? Vão botar a culpe em quem? A culpa é de quem não se preparou!

  9. A secretária da Saúde declara, com razão, que os recursos são esgotáveis. Mas não tem o direito de jogar a toalha e passar a solução do problema Covid à Providência Divina. Se a enfermidade não tem limites, tampouco a ação do Executivo deve tê-los. Com todo o cansaço e a exaustão, é hora de a Prefeitura reforçar a Coordenação Geral, ajustar dramaticamente o Setor de Materiais (que deve trabalhar com previsão de no mínimo dois meses), criar uma nova Política de Pessoal que 1. incentive os profissionais já em ação com toda forma de compensação salarial possível 2. estimule o voluntariado em todos os setores 3. estabeleça um regime de treinamento intensivo para os não-especializados. Talvez seja a hora de providenciar uma Secretária da Saúde sobressalente e de quebra um Prefeito sobressalente. Parabéns pela reportagem, jornal Plural. É assim que se faz Jornalismo. Já estava com saudades.

    1. José Norberto Paino

      Concordo em parabenizar PLURAL, não concordo com o Voluntário, cadê os políticos, os altos funcionários públicos, os comissionados, estes não abriram mão de seus salários e mordomias, falta ainda a prestação de contas dos recursos enviados pelo governo federal

  10. Quando minha mãe morreu, em outubro, eu questionava por que ela? Por que tantos se recuperaram após a intubação e foram pra casa e ela não resistiu? O nosso governo é tão cruel que com sua política de morte, me fazem agora ser grata porque minha mãe pegou o vírus quando ainda tinha leito, me fazem ser grata por ela ter morrido sem perceber, sedada e com oxigênio à disposição. Eu não acredito em vida após a morte, mas torço para estar errada, pra que todos eles, sem exceção, recebam o que merecem por tamanha atrocidade.

    1. Prefeitura de Cttba e governo estadual demoraram para fazer restrições severas de circulação de pessoas, e tambem usaram mal doses preciosas de vacina, ainda escassas, para vacinar profissionais administrativos que nao atendem pacientes. Tambem falharam em nao fazer estoque de medicamentos, equipamentos e cadastro de reserva para orofissionais de saude. Pior ainda o mal ecemplo do gov. Federal em debochar de uso de mascara e distancianento social

      1. KELLI CRISTINA ALVES Cordeiro

        Como aconteceu em Manaus tbm esta acontecendo aqui, infelizmente muito triste que Deus tenha piedade misericórdia. Mas o mais triste é ver que as pessoas sabiam do vírus,do poder dele e que sofreria mutação,e agora triste ver culpar os governantes. Não são perfeitos, são homens falhos e esse mal ninguém esperava. Natal,Ano Novo, Carnaval vi muita gente em aglomeração nas ruas e em suas casas será que não sabiam do vírus? A tv não divulga? Que triste. Que possamos orar pelos que estão trabalhando agora na linha de frente,pedir perdão a Deus todos nós, é tempo de nós arrependermos. Vejo as vezes as redes sociais nestes dias nem parece que o mundo está sofrendo estão vivendo e gozando a vida enquanto muitos estão chorando ?. Vamos parar de criticar e tentar fazer nossa parte orar e cuidar uns dos outros. Deus abençoe e cure nossa Terra não é só o Brasil que está sofrendo pensem,o mundo todo!

  11. Entendo muito bem essa Enfermeira, dói nosso coração por vc, sei pelo que passa só que as pessoas que falam de vcs são as culpadas pelo acontecido com os parentes, se ficassem em cas, tomassem as medidas cabíveis com certeza não estariam assim. Força aí colega, dê o seu melhor e não se importa com os que falam . Não desista dessa batalha.

  12. VERA LUCIA DARCANCHY ESPINOLA TISSOT

    Tive covid fiquei 24 há na UPA Campo Comprido fui muito bem atendida com carinho e consideração, isso foi em dezembro e a espera por leito foi 24 horas. Mas é feito o possível por nós. Sou muito grata a todos que me atenderam . Os EPIS são precários basta olhar. Devemos orar diariamente por essas pessoas que se expõe a transmissão do vírus para cuidar do próximo. Sejam mais humanos e solidários antes de criticar. Gratidão a todos os profissionais.

  13. Primeiramente ninguém tem culpa dessa situação mundial mais os verdadeiros responsáveis segundo alguns meios de comunicação os mesmos estão superfaturando com vendas de vacina e se achando os intocáveis, Mas e complicado infelizmente não da para especificar as pessoas que estão contaminada em tratamento obedeceram protocolos ou não, mas os órgãos de saúde ficam sem escolha cuja a profissão e salvar vidas mas a falta de paciência e compreensão se une com o egoísmo e a situação se agrava e ter fé em Deus e acreditar que Deus possa guarda todo s profissionais da saúde e os demais trabalhadores que não tem como ficar sem trabalhar e que os impacientes e egoístas se comovam com as dificuldade de cada um que está em momentos difíceis.

  14. Primeiramente ninguém tem culpa dessa situação mundial mais os verdadeiros responsáveis segundo alguns meios de comunicação os mesmos estão superfaturando com vendas de vascaínas e se achando os intocáveis, Mas e complicado infelizmente não da para especificar as pessoas que estão contaminada em tratamento obedeceram protocolos ou não, mas os órgãos de saúde ficam sem escolha cuja a profissão e salvar vidas mas a falta de paciência e compreensão se une com o egoísmo e a situação se agrava e ter fé em Deus e acreditar que Deus possa guarda todo s profissionais da saúde e os demais trabalhadores que não tem como ficar sem trabalhar e que os impacientes e egoístas se comovam com as dificuldade de cada um que está em momentos difíceis.

    1. Marta Aparecida de Oliveira Schmitt

      Minha filha testou positivo…ligou no posto de saúde pra ver se podia pegar os medicamentos. Falaram que só fornecem o tratamento depois que a pessoa estiver com sintomas. Que procedimento é esse de deixar o paciente piorar pra dar uma solução? Pq não oferecer o tratamento de imediato,? A pessoa tem que piorar pra poder se tratar… é isso.kedmo? Não tô entendendo. Muito bem isso. Não será por esse motivo que as upas e hospitais estão lotadas? Por favor me expliquem.

      1. E exatamente isso mesmo, a maioria dos médicos são contra o tratamento precoce, é a mesma coisa se a pessoa tem qualquer doença, se não se tratar o problema só tende a piorar, e por isso também o motivo da superlotação dos hospitais!

  15. Uma excelente reportagem, pena que é desse cenário horroroso onde pessoas estão morrendo pelo descaso do nosso governo. Muito triste ter que viver tudo isso.

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