Violinista curitibana mistura funk com música clássica e quer “tomar conta de tudo isso”

Maria Luiza Kaluzni, a Violinista Chavosa, mostra que dois gêneros distantes um do outro podem, sim, funcionar juntos

Maria Luiza Kaluzni tem o cabelo colorido, usa óculos rosa da Oakley e tênis Adidas no pé. Na mão, carrega uma caixa pink toda arredondada, de onde tira um violino. Ela posiciona o instrumento entre o queixo e o ombro, e começa a tocar de uma maneira que é ao mesmo tempo suave e enérgica. E o que ela toca é “Baile de favela”, de MC João.

Da sala de casa, em uma rua pouco movimentada da Cidade Industrial de Curitiba (CIC), a violinista de 23 anos sintetiza seu propósito profissional: unir música clássica e funk. “A gente é um movimento e vai tomar conta de tudo isso”, diz ela.

Na verdade, o funk já usa trechos de composições clássicas. Um exemplo é a “Bumbum Tantan”, de MC Fioti. Ela virou hino da campanha de vacinação contra a covid-19 em 2021, com o remix “Vacinabutatan”. A música começa com um trecho de “Partita em Lá menor”, de Bach, composta em 1723. Mas a proposta de Kaluzni, mais conhecida como Violinista Chavosa, vai além disso. Ela quer que instrumentos associados à música clássica sejam usados no funk de maneira orgânica, com os instrumentistas compondo com os MCs, no estúdio.

“Comecei a reparar como tinha muito violino em muitas produções de funk, mas sempre o violino sampleado [trechos de sons recortados de outras músicas]. Aí pensei: e se a gente trabalhasse com instrumentistas da periferia, que vêm da quebrada, que gostam de funk e são músicos profissionais?”, diz Kaluzni.

No estilo

E foi com a Violinista Chavosa que ela encontrou a sintonia perfeita entre dois mundos que sempre quis unir. (A gíria “chavoso”, no funk, significa “estiloso”.) A violonista estuda música desde pequena, foi bolsista no curso de violino pela Fundação Cultural de Curitiba e chegou a se apresentar com orquestras. No bairro onde nasceu e cresceu, curtia a cultura do funk com os amigos. “Eram dois mundos muito diferentes, tipo a vivência que eu tinha no bairro e a vivência que eu tinha [na vida] profissional ou acadêmica. E aí eu meio que me sentia deslocada na orquestra”, diz.

De acordo com a descrição do projeto em sua página no Instagram, a Violinista Chavosa quer melhorar a qualidade da produção no funk com a presença de instrumentistas na composição e na gravação das músicas. Ela quer também apresentar o violino para comunidades da periferia. “Não basta colocar o ingresso da Orquestra Sinfônica a R$ 10, é preciso introduzir a arte na vida das pessoas com aquilo que elas vivem e se identificam”, escreveu Kaluzni, em um post.

No morro

A violinista conta que um dos momentos mais gratificantes de sua carreira ocorreu durante a gravação de um clipe no Morro do Serrão, em Belo Horizonte (MG). Na ocasião, crianças moradoras da comunidade se aproximaram curiosas para saber o que tinha na caixa pink que guarda o violino. Uma das crianças perguntou se ela sabia mesmo tocar e aí a violinista pegou o instrumento e tocou uma música do MC Daleste. “As crianças acharam legal. Isso é muito importante: ver o violino nas mãos de alguém com quem você se identifica. Acho que o que falta não é o incentivo, é essa identificação mesmo”, diz Kaluzni.

Nas redes

Em novembro de 2020, Kaluzni postou o primeiro vídeo como Violinista Chavosa, uma versão da música “Problemático”, de MC Neguinho do Caxeta, e teve mais de 66 mil visualizações. “Foi a primeira vez que alucinei com o meu celular. Porque postei e ele começou a vibrar muito. Eu abri e estava escrito ‘Seu vídeo foi visualizado 20 mil vezes’ e eu eu não tinha nem mil seguidores”, diz a violinista que, menos de dois anos depois, soma mais de cinco mil seguidores no Instagram.

Depois de um ano de projeto, a Violinista Chavosa conquistou mais espaço com a gravação de músicas e clipes. Foi aí que Kaluzni decidiu dar um salto na carreira. “Quando comecei a trabalhar com o funk, sempre vi São Paulo como uma meta. Porque São Paulo é um nicho cultural da América Latina, tudo passa por lá”, diz.

Ela organizou uma rifa pelas redes sociais, juntou R$ 1 mil, e passou uma semana em São Paulo. Lá, conheceu outro violinista funkeiro, o DJ Totu, que levou Kaluzni em estúdios de funk e apresentou a cidade para ela. “Tive certeza de que tinha que morar lá, assim que pisei na cidade. Vi que aquilo era pra mim”, diz a artista.

Em dezembro de 2021, ela se mudou para São Paulo, contratada por um empresário que prometeu dar moradia até que ela se estabelecesse como violinista. Segundo ela, por volta de duas semanas depois de deixar a vida e o trabalho como professora de violino em Curitiba, foi expulsa da casa onde ficava. “Eu tinha deixado tudo para trás. Tinha um único amigo que morava em São Paulo, liguei pra ele e pedi pra ficar na casa dele até me estabilizar. Assim comecei do zero”, diz.

Hoje, a Violinista Chavosa toca no metrô de São Paulo: “Acho que artista de metrô é algo necessário”. (Foto: Rafaela Rasera/Plural)

No metrô

Depois de se reerguer, a Violinista Chavosa começou a tocar no metrô de São Paulo, de onde tira sua fonte de renda atual. “É legal, acho que artista de metrô é algo necessário. Hoje, saio de casa não tanto pensando na minha meta do dia. Penso mais no que posso melhorar no dia das pessoas”, diz Kaluzni.

Mesmo com as dificuldades, ela não deixou o projeto da Violinista Chavosa de lado. Para 2022, ela tem dois objetivos principais. Um deles é lançar um EP com outros musicistas de quebrada. “Esse EP vai ter quatro faixas e todas elas têm outros instrumentos além do violino, todos orgânicos. Então o que eu me dediquei a fazer e ainda estou fazendo é encontrar outros instrumentistas de periferia. Acho que vai ser muito importante o resultado desse trabalho.”

O outro projeto envolve fazer o primeiro show de lançamento da Violinista Chavosa, em Curitiba, para o qual ela está se preparando com aulas de dança, canto e musculação. Ela tem certeza de que vai impactar a maneira como as pessoas fazem e consomem funk.

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