Hora do voto com golpes de cidadania

O brasileiro que lutou (e levou borrachadas) quando das Diretas já! precisa continuar de olho nos picaretas; um livro mostra como abatê-los

Por conta da campanha eleitoral já em curso, há quem tenha recorrido a seus livros e arquivos. Afinal, quando do movimento Diretas Já (1983/1984), para exigir a volta do sagrado direito de decidir o futuro nas urnas (a última eleição direta tinha ocorrido em 1961, com vitória de Jânio Quadros) o nosso amigo teve de driblar a repressão policial.  

E, hoje, quando Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estuda um sistema de votação online, para o eleitor não ter de sair de casa, recorrendo ao computador, tablet ou smartphone, temos os novos tempos. Mas, infelizmente, com velhos pecados de muitos candidatos.  

Protestos “subversivos”  

A campanha batizada de Diretas Já levou muita gente às ruas para exigir eleições presidenciais na base do voto. Com inflação, taxa de desemprego e dívida externa nas alturas, o período era de enfraquecimento do regime militar. Na verdade civil-militar. O general João Baptista de Oliveira Figueiredo (1918/1999) seria, então, o último militar no poder. A reação do governo Figueiredo foi tachar os protestos de “subversivos”.  

No dia 31 de março de 1983, em Abreu Lima, Pernambuco, aconteceu a primeira manifestação pública, organizada pelo PMDB. No dia 15 de julho do mesmo ano foi a vez de Goiânia, seguida por Curitiba.  

Um velho hábito  

Há coisas altamente previsíveis. Uma delas: no dia das eleições, muitos candidatos vão pular da cama com o pé direito. É o tal pé que dá sorte. Vale consultar Superstição no Brasil, livro de Luis da Câmara Cascudo, advogado, jornalista, historiador e antropólogo.  

O voto é secreto e é preciso respeitá-lo. Mesmo assim, não custa nada voltar a 1994, ano do lançamento de outro livro: Ideias para Acabar com os Picaretas – Cidadania Ativa e Poder Legislativo, de Chico Whitaker, Editora Paz e Terra. Obra que, infelizmente, não perde a atualidade.  

Trata-se de um manual para tirar de cena os picaretas. Como ressalta o autor, “picaretas não faltam no Brasil – ninguém pode negar. Mas estão longe de ser a maioria do povo brasileiro. O mesmo não acontece no Congresso, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras de Vereadores”.  

A lista definitiva  

Como a democracia é um longo aprendizado, o livro traz uma contribuição singela, mas extremamente importante para isso:  

– Trata-se de um manual para ensinar o eleitor a identificar os políticos “picaretas”, para abatê-los, sem piedade, a “golpes de cidadania”.  

Ao sugerir trabalho por etapas, Chico recomenda que o cidadão “deve se limitar ao que se pode conhecer”, até chegar a uma lista final. E prescreve a receita:  

1) Proceder por eliminações progressivas.  

2) Excluir os candidatos “laranjas” (“candidatos que não perdem nada porque não pretendem gastar muito dinheiro em suas campanhas; muitas vezes até ganham alguma coisa, aliciados como cabos eleitorais pelo candidato ao Executivo”).  

3) Excluir os candidatos de partidos picaretas (“há pequenos partidos com propostas sérias e pequenos partidos sabidamente montados com objetivos de picaretagem”).  

4) Analisar os partidos (“Nesse ponto, a lista já deve ter começado a emagrecer”).  

5) Separar novos candidatos de candidatos à reeleição (“Será mais fácil – para separá-los – conhecer os candidatos à reeleição: sua atuação no mandato”).  

6) Analisar a atuação parlamentar dos candidatos à reeleição (“Para pontos negativos está a apresentação de projetos oportunistas, clientelistas, suspeitos… Mais o crescimento de seu patrimônio pessoal…”).  

7) Analisar as histórias de vida (no caso dos picaretas, “sua entrada na política não pretende senão uma promoção – a maior – na carreira da picaretagem”).  

8) Analisar os gastos de campanha (“Campanhas milionárias são facilmente detectáveis – out-doors são caros, um número muito elevado de muros pintados, às vezes exatamente com a mesma técnica, denota trabalho profissional bem pago e prováveis pagamentos também aos donos dos muros”… “o terreno da tia que foi vendido também não justificará muitos gastos”; “campanhas muito caras têm bastante probabilidade de serem financiadas com dinheiro obtido pelo candidato mediante manipulações indevidas de recursos públicos, pessoalmente ou por meio do partido que o financia – não é outra a tradição brasileira. Se isso não ocorreu, será preciso demonstrá-lo de maneira convincente”).  

9) Analisar o conteúdo da campanha (“As propostas, sua maneira de ver o trabalho parlamentar, a maneira como pretende se relacionar com seus eleitores no cumprimento do mandato”).  

10) Analisar o candidato como pessoa (“O que pode ser feito pela observação ou entrevista direta”).  

11) Elaborar e – se possível – divulgar uma lista final.  

12) Escolher o nosso candidato pessoal (“Cada um de nós terá sua preferência a partir dos próprios valores e opções políticas locais”).  

A pressão externa  

Recado do Chico Whitaker:  

– Os parlamentares não mudarão sem uma pressão que venha de fora, da própria sociedade que representam. O primeiro tipo de pressão possível é sobre a sua composição, que resulta do processo eleitoral. Continuemos afinando a pontaria. Os candidatos em geral e os picaretas em particular não estão acostumados com isso.  

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