Golpistas de ontem, hoje e sempre?

Em 1964 tivemos uma ditadura civil/militar

Na mensagem que o ministro Fernando Azevedo e Silva, da Defesa, enviou aos comandos militares, para ser lida nos quartéis na terça-feira, 31 de março, temos que “o Movimento de 1964 é um marco para a democracia brasileira”. Nada surpreende vindo da turma que apoiou, lucrou e continua lucrando com o(s) golpe(s). E, no caso de 64, custou para muita gente aceitar que, na verdade, tivemos uma ditadura civil/militar, como bem comprovou a historiadora Beatriz Kushnir em seu livro Cães de Guarda — Jornalistas e Censores, do AI-5 à Constituição de 1988 (Boitempo Editorial, 2004).

Ainda sobre a tal ordem do dia alusiva ao 31 de março, que de golpe de Estado travestiu-se de revolução redentora, isso mesmo, a redentora quando se tratava de pilhéria do saudoso Stanislaw Ponte Preta no Febeabá – Festival de Besteiras que Assola o País, há quem sacado de seus arquivos um exemplar da revista OAB-Paraná, com a retrospectiva de 2014. A publicação registra o ato público que lembrou os 50 anos do golpe civil/militar de 64 e presta homenagem a advogados que atuaram na defesa de presos políticos, na Auditoria da 5.ª Região Militar, em Curitiba, então instalada na Praça Rui Barbosa.

Heróis da resistência

Sobre o golpe civil/militar de 64, temos ainda o depoimento do jornalista Milton Ivan Heller, em artigo para o jornal do Sindijor – Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná – fevereiro de 2014. Título: Esquecer jamais.

– Sem essa de vestir a roupa de super-herói ou apresentar-se como vítima de um regime maligno imposto ao país em 1964, sob o alto patrocínio da CIA e do Departamento de Estado, no embalo da guerra fria. Nós, jornalistas do Paraná, entre mortos e feridos sobrevivemos todos. Mas muitos dos nossos colegas foram banidos da profissão, porque a pecha de subversivo, uma vez dedurada por alguém ou farejada por um tira boçal, era definitiva. Qualquer um podia ser arrolado como subversivo pago com o ouro de Moscou. Um bando de traidores da pátria e ponto final.

Jornalistas na mira

Ainda do depoimento de Milton Ivan Heller: final de janeiro/início de fevereiro de 1964. No Sindicato dos Jornalistas do Paraná, vitória acachapante da chapa dos ditos subversivos, com mais de 80% dos votos. Euforia (agora vamos!), jornalista deve ser bem pago, etc. Veio o golpe em 31 de março e, nos primeiros dias de abril, o presidente eleito Milton Cavalcanti, toda diretoria e conselho fiscal foram cassados por ordem do general Alberto Massa, recém-nomeado delegado regional do Trabalho. A ordem era não mexer com os sindicatos apelegados, mas destituir e processar os agitadores. Estes eram os portuários de Paranaguá, os bancários, além dos jornalistas. Foi um vexame total, pois a junta governativa era formada por “cabeças” da chapa derrotada. Dois deles, inclusive, enviaram um ofício ao comando da 5.ª Região Militar, dedurando como comunistas atuantes os membros da diretoria deposta e outros jornalistas.

A praça e o palácio

Sempre vale citar Norberto Bobbio. Filósofo, historiador do pensamento político, escritor e senador vitalício italiano, tinha ampla capacidade de produzir escritos concisos, lógicos e, ainda assim, densos. Para ele, a distinção entre revolução e golpe de Estado “corresponde muito bem à oposição, tão frequente na linguagem comum e, ao mesmo tempo, tão incisiva, entre praça e palácio, que permite somar à dimensão temporal também a espacial: a revolução se faz na praça, como a da Bastilha; o golpe de Estado, dentro do palácio”.

Para Bobbio, revolução deve ser entendida como a ruptura entre o velho e o novo, que marca a descontinuidade do curso da história. Não há de se estranhar a história das interpretações da revolução como transformação radical, uma transformação não somente do sistema político ou do sistema social, mas até da natureza humana. Nesse sentido, a revolução “tende ou deveria tender para a criação de um novo homem”.

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