Coisas do dia a dia, na rotina do trabalho. Meio esbaforido, um sujeito pega um táxi em Curitiba e, antes de fechar a porta, é curto e grosso:
– Toca pra Almirante Tamandaré!
Embora calejado no exercício diário da profissão, o motorista fica meio nocauteado.
– Almirante Tamandaré?
– Isso mesmo, Almirante Tamandaré.
– Impossível. São 15 quilômetros, a gasolina tá no mico e não conheço um caminho mais curto.
– Não, não… é pertinho. Três ou quatro quadras daqui…
– Ah, sim, perfeito, agora entendi. O senhor quis dizer rua… Rua Almirante Tamandaré, é aqui mesmo, bairro Juvevê.
O melhor caminho
Fim do expediente, o taxista tratou de matar a charada. Ou o outro lado da charada: quem foi o tal do almirante, merecedor de muitas e muitas homenagens. Gaúcho da vila de São José do Norte, Joaquim Marques Lisboa (1807-1897) ingressou na Marinha e participou como combatente de todas as chamadas batalhas do Império: as guerras da Independência, da Confederação do Equador, a Guerra do Rio da Prata (também conhecida como Guerra contra Oribe e Rosas, disputa entre Argentina, Uruguai e Brasil pela influência do Paraguai na região do Rio da Prata) e a guerra do Paraguai. E por aí chegou ao posto de almirante, o mais alto da carreira, tendo sob seu comando diversas esquadras, até virar Patrono da Marinha do Brasil.
E o dia de seu nascimento, 13 de dezembro, virou o Dia do Marinheiro, em homenagem a quem comandou a Marinha em diversas ações no país e no exterior. Salvou pessoas, tripulações e navios, dando sempre exemplo de heroísmo e espírito humanitário. O nome do hoje município de Almirante Tamandaré do Sul foi sugerido por um expedicionário da Guerra do Paraguai, que participou da medição de áreas onde começou a colonização e o loteamento que, anos mais tarde, se tornaria a vila de Almirante Tamandaré.
Desde a infância
Joaquim Marques Lisboa era filho de Francisco Marques, patrão-mor do porto do Rio Grande. E sempre acompanhava o pai. Assim, entrava nos navios e conversava com os marinheiros. Aos 7 anos viu seu pai viajar para o Rio, com seu irmão, Manuel, que Iria tentar uma vaga na Academia Real dos Guardas-Marinhas. Com a influência de um parente, o Conselheiro Lisboa, Manuel foi matriculado na Academia.
Já o sonho de Joaquim de ingressar na Marinha só se concretizaria no dia 7 de setembro de 1822, com a Independência do Brasil – e, com ela, a urgente necessidade de tripulantes para formar uma nova esquadra e combater movimentos armados contra a independência, resguardando a soberania da (imensa) costa brasileira. Nada menos do que 10.959 km de extensão.
Guerra? Ele era voluntário
Como se previa, nas províncias da Bahia, Maranhão, Pará e Piauí, os portugueses, fiéis à sua pátria, iniciaram movimentos armados contra a Independência, que entrariam para a história como “Guerra de Independência”. No dia 4 de março de 1823, Joaquim apresentou-se como voluntário ao comandante da fragata Niterói, o inglês radicado no Brasil John Taylor. No dia 29 de abril, a fragata deixaria o porto do Rio e se encontraria com as outras que tinham zarpado 2 dias antes.
E o futuro Almirante Tamandaré tomou parte nas operações em Salvador e Itaparica. A fragata Niterói, inclusive, perseguiu embarcações portuguesas e conquistou o que seria classificado de uma grande vitória. De volta ao Rio de Janeiro, em dezembro de 1823, Joaquim matriculou-se na Academia da Marinha, iniciando também um curso de inglês, onde se tornaria amigo de Francisco Manuel Barroso, que viraria almirante e barão do Império.
Um mergulho real
A vida desse marujo, de aventuras navais de construção do Brasil, foi resgatada em uma obra do escritor Alcy Cheuiche, Editora L&PM, com a biografia romanceada desse herói nacional. Título: O Velho Marinheiro. E traz um episódio: certa vez, salvou Dom Pedro II, que caiu de uma prancha ao desembarcar depois de uma travessia da Baía de Guanabara, após visitar a Ilha das Enxadas. “Foi um acontecimento tão inusitado ver o rei mergulhando com roupa e tudo e o almirante tirando o monarca pelos braços de dentro d’água, que circulou uma quadrinha”:
Sua majestade no Arsenal
Caiu n’água e foi ao fundo,
E todos os peixes gritaram:
Viva D. Pedro segundo!
E continuava:
Logo, vivo como um peixe,
Não se deixou cair à ré,
Do pouco bondoso banho
Tirou-o Tamandaré.