Estados Unidos da América, Israel, Argentina, França, Portugal, Ucrânia, Rússia, Itália, Canadá, Arábia Saudita, Japão, Polônia, China, Austrália, Nova Zelândia, Uruguai, Finlândia e Suécia, estes são apenas alguns dos diversos Estados que reconheceram o resultado da eleição presidencial brasileira até o atual momento que escrevemos essa coluna. Diante de tal cenário, este texto abordará sobre esse reconhecimento da comunidade internacional para com o resultado das nossas eleições e o que isso pode sinalizar sobre os próximos passos das relações internacionais brasileiras.
Na contramão do comportamento do futuro ex-presidente brasileiro que logo após as eleições presidenciais estadunidenses de 2020, demorou 38 dias para parabenizar o atual mandatário norte-americano por vencer o seu aliado ideológico Donald Trump. Joe Biden demorou menos de uma hora para reconhecer os resultados da eleição e parabenizar Luiz Inácio Lula da Silva pela vitória, exaltando as eleições como confiáveis, livres e justas. Isaac Herzog, presidente de Israel, outro país que sempre esteve na boca do bolsonarismo, também reconheceu os resultados dizendo “recordamos com carinho sua visita a Israel durante seu mandato anterior”.
Emmanuel Macron, presidente da França, que teve a sua esposa desrespeitada por Bolsonaro, em menos de 15 minutos reconheceu o resultado do pleito, posteriormente divulgou um vídeo no qual faz uma ligação parabenizando o presidente eleito Lula de forma bastante amigável. Nesta mesma maneira, o presidente argentino viajou até Brasília e parabenizou pessoalmente o presidente eleito com um caloroso abraço.
A guerra entre Rússia e Ucrânia não impediu que ambos reconhecessem a vitória de Lula. Putin destacou a “grande autoridade política” do vencedor, já Zelensky congratulou o presidente eleito o considerando “um amigo de longa data da Ucrânia”. Outros membros do BRICS, no qual Rússia também faz parte, também reconheceram o resultado do pleito.
Mas o que o reconhecimento do resultado pela comunidade internacional pode nos dizer?
Primeiramente, fala-se muito sobre a preocupação com uma possível tentativa de golpe do derrotado Jair Bolsonaro, principalmente entre os estadunidenses que passaram por uma situação muito semelhante com Trump, quando este ao perder o seu mandato, tentou ao máximo desestabilizar as eleições, culminando na invasão do capitólio, casa do Poder Legislativo dos EUA em 6 de janeiro de 2021, o resultado foi de cinco mortes e mais de 138 agentes de segurança feridos. Portanto, conforme os discursos de Jair Bolsonaro começavam a tentar criar um ambiente similar, os senadores estadunidenses aprovaram, por unanimidade, uma recomendação para que seu país cortasse todas as relações com o Brasil caso houvesse a execução de um golpe. É importante lembrar que os EUA é o segundo maior parceiro comercial de nosso país.
Em segundo lugar, é o reconhecimento do fim da atual política externa, caracterizada pelo auto isolamento, que causou não apenas danos na imagem do Brasil, mas também nos impôs perdas econômicas. É relevante lembrarmos das diversas negociações comerciais entre Mercosul e União Europeia, iniciadas no final dos anos 90 e “concluídas” em 2019, que subiram no telhado por conta das anti-políticas ambientais acompanhadas do aumento do desmatamento e grandes incêndios florestais,
transformando o Brasil de um líder para um “pária” global no combate ao aquecimento global, pauta cada vez mais relevante no hemisfério norte, em especial na Europa. Este evento simboliza o enfraquecimento do Mercosul, o afastamento da política Sul-Sul – fortalecida no governo Lula, da qual tinha como objetivo transformar o Brasil como grande líder dos países emergentes e pobres no sistema internacional -, assim como outras diversas escolhas, seja o afastamento de parceiros econômicos históricos, como Argentina e Estados Unidos (após eleição de Biden), e a aproximação com países com governos de extrema direita e sem relevância comercial, como a Hungria, nos deixaram cada vez mais
isolados.
A figura do ex-chanceler Ernesto Araújo, tal qual Dom Quixote lutando contra moinhos de vento, combateu o que chamava de pautas “globalistas”, o que representa muito bem o momento pelo qual nossa política exterior passou. O ministro chegou a declarar que preferia fazer o Brasil “se tornar pária” por “defender a liberdade” do que se render ao “globalismo”. Bom, podemos dizer que esteve muito perto de atingir seu objetivo, mas a “reserva de prestígio” da nossa história internacional ajudou a remediar os estragos, seja a participação de nossos pracinhas na Segunda Guerra Mundial lutando contra o nazismo; a importante atuação, através da figura de Oswaldo Aranha, na criação do Estado de Israel; e a liderança do movimento internacional contra subsídios agrícolas. Com uma reeleição do atual presidente, dificilmente o passado conseguiria nos ajudar novamente a não se isolar mais.
Faz apenas dois dias do resultado da eleição enquanto escrevemos este texto, mas até o momento, Lula foi convidado pelo presidente do Egito para comparecer no COP-27 e a Noruega já demonstrou ter interesse em retornar com o apoio financeiro para o Fundo Amazônico. Em meio a construção deste cenário pós-bolsonarismo, é notável os primeiros sinais de que o Mundo aguarda ansiosamente quais serão as ações para proteção da Amazônia sob o novo governo. Na América do Sul em específico, o Mercosul vê a possibilidade de novamente se tornar uma das prioridades da agenda da política externa brasileira. Enquanto isso, nós brasileiros, assim como para as demais pastas, aguardamos ansiosamente o anúncio de quem será o Chanceler escolhido para trilhar o longo e árduo caminho da reconstrução, e a comunidade internacional parece estar disposta a deixar esses quatros anos de insensatez para trás.
Sobre o/a autor/a
Jorge Marques Schlichting
Bacharel em Relações Internacionais, mestrando em Ciência Política pela UFPR, pesquisador vinculado ao Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais (NEPRI-UFPR), sócio e cofundador da Helênica Agência Política.