A Copa mais politizada da História?

A escolha de Catar como país-sede está envolta em polêmicas

Após o povo brasileiro sentir toda a tensão das eleições, agora temos a Copa do Mundo para testarmos mais uma vez a força de nossos corações. Pela primeira vez sediada no final do ano, devido ao clima quente catari durante o meio do ano, a Copa, como sempre, está em volta de questões políticas, desde a escolha do Catar como país-sede e seus desenrolamentos até a indisposição de parte da torcida brasileira para com o Neymar. Vamos abordar um pouco dessas questões na nossa coluna de hoje, pois política e futebol andam lado a lado.

A escolha de Catar como país-sede está envolta em polêmicas, primeiro pelo país ser um ditadura teocrática, com inúmeras denúncias de desrespeitos em direitos humanos: a criminalização da homossexualidade; o tratamento desumano frente aos trabalhadores, levando a um alto índice de mortalidade durante as obras preparatórias para o evento, segundo o Comitê de Organização da Copa do Mundo e o governo do Catar, o número de mortos chega perto de 500, mas com os números coletados pelo jornal britânico The Guardian, o número de mortos chega a 6.500, sendo em sua grande maioria vindo de países como Índia, Nepal, Bangladesh e Sri Lanka.

A polêmica aumentou com a chegada dos torcedores e algumas proibições impostas a eles, como a proibição da demonstração de afeto em público; a vedação da venda de cervejas com álcool nos estádios, e seu consumo apenas permitido em locais fechados ou nas FIFA Fan Fests, isso causou um descontentamento da Budweiser um dos patrocinadores oficiais da FIFA; e principalmente a proibição da utilização de símbolos LGBTQIA+. Essa última causou dois fatos até o momento da escrita desta coluna, como a utilização pela FIFA de censura contra a seleção alemã pela possibilidade do capitão utilizar sua braçadeira com as cores LGBTQIA+, e a invasão de campo por um torcedor com a bandeira e uma camiseta que estampava em sua frente um pedido ajuda à Ucrânia, atualmente em guerra com a Rússia, e em sua parte de trás uma demonstração de apoio às mulheres iranianas. Todas essas restrições impostas pelo governo catari foram acatadas pela FIFA, a exemplo de quando a instituição ameaçou punir a Dinamarca por querer utilizar uniforme todo preto em luto por aqueles trabalhadores mortos para construir o evento.

Como de praxe, temos confrontos de seleções com histórico de tensões geopolíticas, principalmente no Grupo B: Inglaterra, Irã, Estados Unidos e País de Gales. Nele podemos destacar um exemplo: a questão Estados Unidos e Irã, dois Estados em constante atrito, principalmente após o atentado de 11 de setembro em Nova York, mesmo não sendo cometido pelo Estado Iraniano, o então presidente George W. Bush categorizou o Irã junto ao Iraque e Coreia do Norte como um eixo do mal, e articulou o apoio estadunidense à forças categorizadas como insurgentes no Irã, através de envio de armas, treinamento e suprimentos. Entretanto, nas duas primeiras rodadas, a seleção do próprio Irã se recusou a cantar o hino nacional como forma de protesto e apoio às manifestações que buscam expandir os direitos das mulheres no país.

Outra tensão no grupo B se apresenta entre as seleções que fazem parte do Reino Unido, pois a Inglaterra no século XVI anexou o País de Gales a seu território, mesmo com o passar dos séculos, parte da população galesa não se identifica como britânica. Até mesmo no grupo do Brasil podemos encontrar uma tensão geopolítica entre Sérvia e Suíça, principalmente devido a jogadores suíços nascidos ou descendentes diretos de familiares oriundos da região de Kosovo, território que fez parte da Albânia e tem uma população de maioria albanesa, e atualmente parte da Sérvia – considera-se ainda a possibilidade do embate entre a seleção sérvia com a croata numa eventual quartas-de-finais, cabe salientar que o estopim para a guerra dos bálcãs que culminou no fim da Iugoslávia foi uma briga de torcida entre os ultras do Dínamo de Zagreb, da Croácia, com a do Estrela Vermelha, da Sérvia.

A nossa seleção também está tendo sua cota de polêmicas, seja no campo futebolístico com a convocação de Daniel Alves, ou no campo político, com parte dos torcedores se demonstrando poucos dispostos com a participação de Neymar devido a seu apoio a Jair Bolsonaro durante as eleições e sua promessa de comemorar um gol marcado fazendo 22, número do candidato na urna.

Outra polêmica aconteceu durante o jogo Brasil contra Suíça, onde a câmera durante um momento quem que filmava um torcedor fantasiado acabou por também filmar o filho do presidente e deputado federal Eduardo Bolsonaro, isso deixou os manifestantes golpistas descontentes, pois afirmam que enquanto sofrem com chuva, calor e frio, ele está no Catar aproveitando do bom e do melhor. Por outro lado, virou material de gozação por aqueles contrários ao atual governo.

Mas esta não é a única Copa do Mundo marcada por alto teor político em sua edição, inclusive em relação ao seu país anfitrião. Já na sua segunda edição, em 1934, a FIFA concedeu à Itália de Mussolini a incumbência de hospedar o campeonato e uma das exigências do país era de que todas as seleções deveriam fazer a famosa saudação romana durante os hinos nacionais, ademais, o ditador fascista foi uma figura presente nos jogos, inclusive para pressionar que a sua seleção conquistasse o campeonato e provasse a sua “superioridade”. A edição de 1978 foi outra, sob a ditadura militar do “diablo de Argentina” Videla, já despertava ira em muita gente, a ponto de um grupo militante francês ter criado Comitê de Boicote à Copa da Argentina (COBA), a pintura de faixas pretas nas traves dos gols por parte dos clubes como forma de protesto, assim como a seleção neerlandesa, vice-campeão para a anfitriã, terem virado de costas na entrega das medalhas feita pelo próprio ditador argentino.

Diante de diversos fatos aqui narrados, é impossível afirmar a teoria furada de que futebol e política não se misturam. Muito pelo contrário, às vezes há simbioses entre os temas, seja para o bem, seja para o mal. Mesmo que a dupla Caio Ribeiro e Tiago Leifert não concorde, o esporte, de forma geral, sempre foi instrumentalizado para a expressão de indivíduos, populações, comunidades e governos para a sua causa e imagem.

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