Por farsa do homeschooling, Ratinho e deputados conservadores mobilizaram a máquina pública

Lei do ensino domiciliar, que TJ declarou inconstitucional, tomou tempo e recursos dos três Poderes para nada

Exatamente um ano antes das eleições, no dia quatro de outubro de 2021, a máquina estatal do Paraná foi mobilizada para um anúncio. Num tablado, ao lado de deputados e do secretário de Educação, Renato Feder, o governador Ratinho Jr. (PSD) discursou afirmando que mais uma vez o estado saía na frente. Graças à aprovação pela Assembleia, ele podia sancionar o projeto que autorizava o homeschooling no Paraná. O ensino domiciliar, uma das pautas favoritas das famílias conservadoras, passaria a ser realidade aqui.

Era uma farsa. Qualquer um com acesso à Constituição (ou ao Google) saberia dizer que aquela lei valia tanto quanto uma promessa de campanha. Era consultar um advogado recém-formado e ele diria: isso não se sustenta nem aqui nem na China. Mas o aparato legal do governo fez que não viu e deixou o governador vender o peixe como se fosse fresco.

Nessa segunda (21), como era evidente que aconteceria, o Tribunal de Justiça declarou a lei inconstitucional, surpreendendo um total de zero pessoas. Agora provavelmente haverá recursos legais, choro e ranger de dentes: tudo para a plateia. No fundo, os deputados que propuseram a ideia sabiam (ou deviam saber) desde o começo que esse seria o final da história.

Deputados, ao contrário do que muita gente pode acreditar, não são burros. Como um deles costumava dizer, o mais bobo ali enganou uns 30 mil. O problema muitas vezes é o contrário: eles são espertos demais.

No caso do ensino domiciliar, a ideia partiu do esperto deputado Marcio Pacheco. Mas quando viram o potencial para agradar milhares de famílias de classe alta, virou uma festa. No total, 37 deputados assinaram a proposta. Parecia aquele projeto escolar que um aluno faz e todo mundo assina para ficar com a nota. O número de autores foi tão grande que nem precisava votar a ideia: a não ser que metade dos signatários votasse contra a própria ideia, estava aprovado.

A oposição ainda avisou que nem fazia sentido, pediu para tirar o texto de votação. Mas não: puseram a máquina todinha em movimento. Votação na CCJ. Votação no plenário. Discursos na tevê estatal. Entrevistas em todos os jornais. Apartes. Aplausos. Abraços pro pessoal da minha região. Deus salve esta nação.

Ao final, comemoraram a vitória da farsa como se fosse um gol: tinham emplacado seus nomes em todos os jornais, com ajuda da numerosa assessoria de imprensa da Assembleia; o rosto com o dedo em riste discursando contra a educação que forçava as crianças a ir para a escola. Se fossem pagar o tempo que conseguiram em rádios, tevês, jornais e sites, teriam de pagar milhões.

No final, os deputados da direita, que tanto reclamam do peso do Estado, mobilizaram os três Poderes, gastaram tempo de servidores e recursos do erário para promover sua fraude antiestatal. Agora farão cara de tristonhos e injustiçados. Mas no fundo conseguiram exatamente o que queriam: discurso para a campanha que começa daqui a poucos meses – assim conseguirão assegurar mais quatro anos no ar-condicionado da Assembleia para lutar contra o Estado.

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