Tio Sam – as aventuras e desventuras

Decantado e temido, o Tio Sam surgiu em 1812, virando um pretenso xerife do mundo, mas nasceu de maneira prosaica graças a uma espécie de marmita

“Os países não têm amigos, têm interesses” – a afirmativa é atribuída a Charles de Gaulle, embora haja quem ressalte que a frase tenha a paternidade disputada por outros líderes. Mas, a rigor, tanto faz, já que é definitivamente arrasadora em todos os sentidos. Assim, depois de curtir o Plural, leitura diária, há quem, para manter a outra leitura, a semanal, tenha comprado o exemplar desta semana da Carta Capital – ela igualmente de leitura mais do que recomendável.  

E temos na capa, em caixa alta (letras maiúsculas), um título arrasador (alguém do desgoverno bolsonarista vai querer corrigir: arrasador é com Z!):  

TIO SAM FRACASSOU  

– O império de Biden paga pelas mentiras da guerra ao terrorismo e entrega o Afeganistão ao seu destino.  

Na foto, ocupando toda a capa, a comemoração popular quando da chegada do avião da U.S. Air Force que, depois, levaria à morte aqueles que, não conseguindo um espaço para poder embarcar, tentaram escapar se agarrando nas asas e no trem de pouso do aparelho. Havia no aeroporto de Cabul centenas de afegãos em pânico com a volta do Talibã ao poder.  

Talibã – Grupo extremista que surgiu há quase 30 anos; governou o Afeganistão de 1996 até a invasão norte-americana, em 2001.  

Interior de avião cargueiro americano cheio de civis retirados do Afeganistão. Foto: Jake Helgestad/Guarda Nacional.

Tio Sam (do inglês Uncle Sam) é a personificação nacional dos Estados Unidos e um dos símbolos nacionais mais famosos do mundo. E que virou uma espécie de xerife do mundo. O nome foi utilizado primeiramente durante a guerra anglo-americana de 1812, mas só ganhou a forma escrita em 1870. E ele é geralmente representado como um senhor de autêntica fisionomia rígida com cabelos brancos e barbicha. Há fontes que apontam uma semelhança do rosto de Tio Sam com o do presidente Andrew Jackson, outras com o do presidente Abraham Lincoln. O Tio Sam é representado vestido com as cores e elementos da bandeira norte-americana – por exemplo, uma cartola com listras vermelhas e brancas e estrelas brancas num fundo azul, e calça vermelha e azul listradas.  

Um soco histórico  

Com o passar do tempo o cognome tornou-se cada vez mais popular, até que a revista americana Punch (soco) o batizou como símbolo estadunidense. O folclore diz que o Tio Sam foi criado por soldados americanos no norte de Nova Iorque, que recebiam barris de carne com as iniciais U.S. (de United States, Estados Unidos) estampadas. E os soldados teriam brincado, dizendo que as iniciais significariam Uncle Sam (Tio Sam), uma referência ao dono da companhia fornecedora da carne, Samuel Wilson, de Troy, estado de Nova Iorque.  

Com um rosto alheio  

O Congresso reconheceu Samuel Wilson como inspirador da figura do Tio Sam em 1961. E Tio Sam foi mencionado na literatura pela primeira vez em 1816, no livro alegórico The Adventures of Uncle Sam in Search After His Lost Honor, de autoria de Frederick Augustus Fidfaddy, e também faz referência a Samuel Wilson. Em 1870, o cartunista Thomas Nast fez o desenho de Tio Sam baseado no rosto de Abraham Lincoln.  

Em 1917, o artista James Flagg o desenhou em um cartaz com o dedo em riste e a frase I Want You for U.S. Army (“Eu Quero Você para o Exército dos EUA”). A encomenda partiu das Forças Armadas, para recrutar soldados para a Primeira Guerra Mundial (28 de julho de 1914 – 11 de novembro de 1918). E ele teve como inspiração um cartaz de Lord Kitchner, feito 3 anos antes do Tio Sam. Kitchener era Secretário de Guerra da Grã-Bretanha quando estourou o conflito.  

Um plano de conquista  

Tio Sam chega ao Brasil é o título de um livro do historiador Gerson Moura, que trata da “ostensiva campanha de penetração cultural norte-americana no Brasil desencadeada no início dos anos 40”. Foi uma época em que, gradativamente, “o american way of life passou a ganhar espaço na sociedade brasileira, graças a um cuidadoso plano de conquista”. Esse plano fazia parte da estratégia dos Estados Unidos de promover a cooperação interamericana e a solidariedade hemisférica, enfrentar o desafio do Eixo e consolidar-se como grande potência. A campanha teve início com a propagação dos “valores pan-americanos” durante as conferências interamericanas. O passo seguinte foi a criação, em agosto de 1940, de uma super/agência de coordenação dos negócios interamericanos, sob a chefia de Nelson Rockefeller, chamada Office of the Coordinator of Inter-American Affairs (OCIAA). Essa iniciativa diferia dos programas de colaboração já em funcionamento por estar diretamente vinculada ao Conselho de Defesa Nacional dos Estados Unidos.  

PS: e, hoje, com o desgoverno federal, vale lembrar (e lamentar) a afirmativa de Juraci Magalhães, em 1964, quando embaixador em Washington: “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”.  

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