Você acredita em pesquisas eleitorais?

Polêmica ganhou força com relatório de deputada que propõe censura às pesquisas nas vésperas das eleições e com declaração de Jair Bolsonaro contra a confiança nos dados

Se pesquisas definissem eleição, não precisaríamos votar. A máxima ajuda a separar o que é intenção de voto do que é o resultado de uma eleição. Uma pesquisa de opinião, baseada em amostragem, é um retrato do momento. Assim, não é de se estranhar que os dados apresentem resultados diferentes do que se efetiva na urna. Daí porque o assunto sempre foi polêmico.

Nesta semana o Congresso Nacional discute se as pesquisas podem ou não ser divulgadas na véspera das eleições, além da exigência do “acerto” nos resultados eleitorais. A mudança é proposta em um relatório apresentado pela deputada federal Margarete Coelho (PP-PI) ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e gerou reações de institutos de pesquisa e entidades do meio.

As pesquisas recentes para presidente, apontando Lula à frente de Bolsonaro na disputa de 2022, colocou mais lenha na fogueira. Apoiadores de Lula demonstram entusiasmo com os dados e fazem questão de divulgar o resultado. Já os partidários de Bolsonaro e ele próprio questionam a validade das pesquisas.

Afinal, podemos acreditar nas pesquisas?

A resposta não é simples. Os cientistas políticos concordam que o processo de pesquisa tem lacunas e que é necessário aprimorá-lo, mas defendem a aplicação e a divulgação dos dados. 

Luiz Domingos, cientista político e professor da PUC e da Uninter, lembra que a pesquisa é probabilística. Isto é, apresenta um quadro provável. De todo modo, segundo ele, as críticas às pesquisas tendem a transformar um problema técnico em um problema ideológico.

Em um artigo publicado na revista Compolítica, o pesquisador da UFSC João Kamradt traz resultados de um trabalho em que analisou 302 candidatos a governo do estado em pesquisas e comparou com resultados eleitorais em 2014.  Desse total, 93 estiveram fora da margem de erro, o que representa 30,7% de “erros” nas pesquisas. Esse dado é bastante superior aos 5% indicados pelos institutos de pesquisa.

Por que as pesquisas “erram”?

Alguns fatores contribuem para a imprecisão das pesquisas, como os votos dos indecisos, o tempo entre a realização da pesquisa e a divulgação, a mudança de voto do eleitor não tão convicto, os recursos utilizados pelas campanhas na reta final, a circulação de informações em redes sociais ou meios de comunicação, entre outros aspectos contextuais.

No âmbito da execução das pesquisas, é possível listar outros problemas. Uma delas está na metodologia que utiliza as amostras probabilísticas. Nesse formato, são ouvidos indivíduos que representam certos grupos sociais. Esta seleção do perfil ouve um eleitor que pertence a um grupo, mas cujo voto não é necessariamente o mesmo de outro perfil do mesmo grupo. Eis o problema que pode indicar um erro amostral.

Assim, o problema não está na quantidade de pessoas consultadas. Hoje, para que se obtenha uma margem de erro de 2 pontos percentuais em uma pesquisa, o que é considerado baixo e aceitável, é necessário ouvir 2.100 brasileiros, aproximadamente. O problema está, portanto, na maneira como a amostra é montada. Para não falarmos dos dados do IBGE utilizados para amostragem que estão defasados há 21 anos. O último censo foi em 2010.

Ricieri Garbelini, da IRG Pesquisa, diz que pesquisas realizadas por institutos diferentes em um mesmo período, a respeito de um mesmo pleito eleitoral, podem apresentar diferenças. Isso ocorre, porque pode haver uma variação na fórmula utilizada. “Cada instituto tem uma metodologia”, diz ele. O problema maior, segundo ele, está nos usos que se faz das pesquisas, e na divulgação, que geralmente inclui apenas os dados dos grandes institutos.

Boa parte dos problemas de confiabilidade das pesquisas foram resolvidos com o controle das pesquisas pelo Tribunal Superior Eleitoral que, aliás, é exemplar. O procedimento garante a verificabilidade dos dados obtidos e da metodologia aplicada. A fraude pode ocasionar multa e prisão dos responsáveis.

Voto útil?

Basear o voto nas pesquisas não é um problema para a democracia. Faz parte do jogo eleitoral. Grande parte dos eleitores escolhem em quem votar a partir do quadro eleitoral apresentado pelos institutos de pesquisa e divulgado pelos meios de comunicação. Quantos já votaram em um candidato para não deixar o outro vencer porque as pesquisas indicavam a vitória do adversário?

Com mais acertos do que erros, as pesquisas brasileiras são importantes instrumentos para o eleitor. O que não justifica o uso desonesto ou a censura às pesquisas. Infelizmente a polêmica não caminha por aí. Se os políticos não acreditassem que as pesquisas têm o poder de decidir o voto de parte do eleitorado, o tema não estaria na pauta do Congresso.

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