Podcast: Independência, modos de usar

Podemos imaginar tantas coisas que precisam acontecer para, aí sim, desfilarmos comemorando esse dia

Há três dimensões sobre a Independência que podem render excelentes reflexões para as crianças e os jovens: a primeira dimensão , evidentemente, é a histórica. Há vária perguntas incríveis para discutir na escola, em casa, nas praças ou enquanto o desfile não acaba. Por exemplo: Por que a independência do Brasil foi proclamada por um nobre português e não pelos próprios brasileiros? Por que dizem que a  independência foi a independência do Brasil e dos brasileiros mas  ela não libertou os escravos? Por que a independência foi em todo o Brasil mas  várias províncias se revoltaram contra ela? Por que proclamamos uma República para nos livrar da monarquia e a data cívica mais importante do país ainda exalta a figura de um monarca?

A segunda dimensão é a simbólica. E outras perguntas podem ser feitas para provocar pensamentos na meninada. Destaco um exemplo: A semana da Pátria é uma semana para comemorar o quê: Nossa soberania? Nossa vivência comum? Nosso passado de glórias? Nossa civilização invejada pelo mundo afora? Nossas conquistas científicas ou esportivas? Nosso índices econômicos e sociais? Afinal, por que há um feriado e o que pretendemos sentir em nossas almas quando tremula a bandeira e quando ouvimos os acordes de nosso hino?

Aliás, curiosamente e não sem um tanto de ironia, a música de nosso hino foi composta para homenagear a deposição do imperador D. Pedro I, o mesmo que proclamou a independência e depois fechou com a força das armas a primeira constituinte do país; reprimiu com a violência de tropas mercenárias os movimentos contestadores no Pará, Maranhão, Piauí e Bahia; envolveu o país em uma guerra idiota com a Argentina pela posse de um território que nunca nos pertenceu; afundou a economia em uma crise que faliu o Banco do Brasil; mandou espancar jornalistas que o criticavam, matando um deles, Líbero Badaró. Além de colocar dentro de casa a própria amante e bater na própria esposa. Daí o povo não aguentou e o pôs para correr. E foi então que se compôs uma música para não esquecer do que acontece com os governantes autoritários e insensíveis. Esta é a música do Brasil. Nosso hino.

Há, por fim, uma última dimensão: a utópica. Podemos conversar sobre o 7 de setembro imaginando um país independente de miséria, violência, ignorância. Podemos imaginar um país independente da sordidez dos corruptos e da canalhice dos traficantes. Podemos imaginar um país independente da destruição da floresta e da poluição das águas. Podemos imaginar tantas coisas que precisam começar a acontecer para que, aí sim, desfilarmos, como cordão de carnaval, comemorando esse dia. Por enquanto há apenas tristes e constrangedoras  homenagens oficiais para marcar uma data que não habita os corações e almas dos brasileiros.

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