Prefeitura continua sem plano de abrigo para famílias expulsas do Campo do Santana

Membros do MTST fizeram um protesto em frente ao Paço Municipal, mas foram impedidos de entrar

No dia 10 de janeiro, 360 policiais militares se reuniram na sede do 13º Batalhão, em Curitiba, para cumprir uma ordem judicial de reintegração de posse no Campo do Santana. No local, cerca de 400 famílias ocupavam a área de 1,8 hectare com barracas de lona ou madeira. Foram retiradas e estão à própria sorte.

De acordo com o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), desde o despejo, a prefeitura de Curitiba ainda não prestou nenhum apoio aos cidadãos até agora. Na quinta-feira (19), um grupo esteve no Centro Cívico para cobrar Rafael Greca (PSD), mas foi impedido de entrar pelos seguranças.

Algumas pessoas foram para casa de parentes, outras para garagens e tem gente que ainda não sabe o que fazer. A Fundação de Ação Social (FAS), da prefeitura, deveria ter apresentado um plano de realocação das famílias antes mesmo da remoção autorizada pela Justiça, mas até agora isso não foi feito.

Em Curitiba, o déficit habitacional é de 50 mil moradias, de acordo com a Companhia de Habitação Popular (Cohab). Há mais de 450 áreas de ocupação na cidade, muitas sem condições básicas de higiene, esgoto e energia elétrica precária.

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A maioria das pessoas que estava na ocupação Povo Sem Medo, na estrada Delegado Bruno de Almeida chegou até lá por não ter como pagar aluguel. Quando eles ocuparam o terreno, em junho, grande parte das pessoas ainda sofria os reflexos da crise econômica e sanitária causada pela pandemia da covid-19.

Segundo o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), cujo levantamento é feito pela Fundação Getúlio Vargas, o acumulado do ano para alta dos aluguéis ficou em 5,45% entre dezembro de 2021 e dezembro de 2022.  

Uma sucessão de fatores que só piora por causa das políticas habitacionais do governo do Paraná e da prefeitura de Curitiba, que patinam. Em âmbito estadual, o “Casa Fácil Paraná”, que é desenvolvido em parceria com o Governo Federal deve entregar 45 mil moradias nos “próximos anos”. O número não supre o déficit nem da capital. Curitiba, por sua vez, tem 400 imóveis populares disponíveis para financiamento.

Reintegração

Entre as 6h e as 9h30 do dia 10 de janeiro, quem estava morando na ocupação Povo Sem Medo pôde tirar seus pertences. Numa tenda da FAS, funcionárias cadastravam as pessoas desabrigadas. Também acompanhavam a ação da Polícia Militar, a Guarda Municipal, Conselho Tutelar, Poder Judiciário e representantes da empresa proprietária do terreno, a Construtora Piemonte.

A construtora, além de mobilizar trabalhadores para desmontar os barracos, também forneceu água e alimentação para quem estava envolvido na reintegração. As informações constam no auto de reintegração de posse, assinado por oficiais de Justiça.

frente da ocupação com faixa "despejo zero"
Antes da reintegração de posse: despejo zero | Foto: Aline Reis/Plural.

O documento também diz que havia ao menos 250 pessoas desde o início da reintegração. Um morador idoso e transplantado se negou a sair do barraco quando a demolição – na qual foram empregados três tratores – já havia começado. Ele foi retirado após conversar com os oficiais de justiça, porém não há confirmação do local onde foi abrigada esta pessoa.

Toda ação da reintegração de posse durou cerca de 20 horas. Praticamente um dia inteiro, contudo, até a tarde de sexta-feira (20), a FAS ainda não havia apresentado o plano para realocar as famílias, de acordo com a Defensoria Pública Estadual (DPE), que acompanha o caso.

Parlamentares reagiram

No dia do despejo, o vereador Angelo Vanhoni e os deputados Ana Júlia e Renato Freitas, todos do PT, foram até o Campo do Santana.

Todos tentaram intervir para que ao menos os cidadãos pudessem ter onde ficar. Embora os três tenham falado com os moradores, trecho do auto de reintegração afirma que “[é] importante destacar sobre a participação do deputado estadual sr. Renato Freitas, o qual, assim que chegou ao local, começou a proferir palavras de ordem desconexas aos fatos incitando os ocupantes. Em nenhum momento procurou qualquer autoridade presente ou Oficial de Justiça para saber o teor da decisão judicial”.

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Ao Plural, o petista declarou que foi até o local a pedido dos moradores e que desde o início da ocupação acompanha o caso. “A mesma lei que determinou o despejo dos moradores é também a lei que impõe condições para esse despejo. E uma delas é que a prefeitura providenciasse o acolhimento dessas famílias num lugar digno, o que, de fato, não ocorreu”, disse. Sobre as falas citadas no documento, o parlamentar afirmou que queria animar os moradores a lutar pelo direito constitucional à moradia.

Busca de soluções 

Na Câmara Municipal de Curitiba, existe uma Frente Parlamentar de Estudos sobre a Regularização Fundiária, que é presidida pelo vereador Dalton Borba (PDT).

pessoas posando para foto em São Paulo
Dalton Borba fez visita técnica a moradias populares em São Paulo | Foto: Divulgação

Na última semana, ele participou de uma visita técnica, para conhecer os projetos de autogestão em moradia desenvolvidos na cidade de São Paulo. Os projetos inspecionados foram empreendimentos executados na modalidade de autogestão em moradia, e  executados pela União Nacional por Moradia Popular (UNMP). 

Os projetos e empreendimentos de moradia popular foram executados em áreas da prefeitura de São Paulo, que posteriormente foram doadas para associações e cooperativas de moradia popular, por meio de uma licitação pública, sendo contemplada a associação que apresentar o melhor plano de gestão.

“As associações contratam todo o serviço da construção, os profissionais que trabalham na obra, pedreiros e ajudantes, e fazem a cotação e a compra de todo o material, conseguem parcerias com empresas de material de construção, descontos, e assim conseguem construir as moradias num preço bem inferior ao de mercado. Assim, as famílias que estão cadastradas no programa conseguem ter acesso a casa própria, pagando uma prestação em torno de 30% a 40% do valor do salário mínimo”, explica Borba.

A FAS, em nota, informou que “prestou atendimento a 123 famílias que estavam no local e, desse total, duas famílias aceitaram ser encaminhadas para uma unidade de acolhimento parceira e três homens foram acolhidos por uma casa de passagem do município. As demais famílias optaram por ir para casa de parentes ou retornar às cidades de origem com apoio da empresa proprietária do terreno.”

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