Barros lucrou R$ 2,8 mi com lotes que comprou com propina por intermediar negócios com a Copel, aponta MP

Valor equivale ao que ficou com o deputado após venda dos terrenos onde ele teria aplicado o dinheiro ilegal, conforme denúncia do MPPR

Os lotes comprados pelo deputado federal Ricardo Barros (PP) em meio a um suposto esquema de lavagem de dinheiro com propina recebida de um processo da Copel, companhia de energia do Paraná, renderam pelo menos R$ 2,8 milhões de lucro. Os cálculos foram feitos com base na denúncia feita pelo Ministério Público do Paraná (MPPR) contra o parlamentar.

Agora réu na Justiça Eleitoral, o paranaense, ex-ministro da Saúde no governo Temer e líder de Jair Bolsonaro na Câmara, nega os episódios e diz que tudo não passa de um “espetáculo político”. O processo corre em segredo de Justiça determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas o Plural teve acesso ao dossiê da denúncia.

Ele é acusado de ter recebido R$ 5,1 milhão da Galvão Engenharia por agilizar junto a diretores e funcionários da Copel a compra de duas usinas eólicas da empreiteira pela estatal. Os fatos denunciados pela Promotoria da Justiça Eleitoral ocorreram entre 2011 e 2014, quando Barros era secretário da Indústria, Comércio e Assuntos do Mercosul do Paraná, e se desenrolaram a partir da delação de Eduardo Queiroz Galvão e Jean Alberto Luscher de Castro, executivos da Galvão.

As investigações apontam que o deputado usou contratos frios e o nome de empresas dos quais era sócio para esconder a origem do dinheiro ilegal recebido do grupo de engenharia. O equivalente a R$ 1,55 milhão teria sido entregue em espécie dentro de um flat em São Paulo por um executivo da empreiteira, José Ubiratan Queiroz. Outra quantia – R$ 3,5 milhões – aparece diluída em forma de doação eleitoral feita ao diretório nacional do Partido Progressista e repassada ao parlamentar, que em 2014 deixou o governo Beto Richa para voltar a concorrer a deputado federal. Ele foi eleito.

Parte dos valores recebidos em São Paulo, sustenta a promotoria, foi lavada na compra e venda de lotes em empreendimentos imobiliários de Maringá e região, terra natal da família Barros.

Com base nos valores detalhados na denúncia, o Plural calculou que Barros lucrou quase R$ 1,7 milhão com a posterior transferência dos terrenos onde, segundo a denúncia do MP, foram empregadas quantias do dinheiro ganho como propina da empreiteira. O valor é resultado do total recebido com as vendas dos lotes (cerca de R$ 4,78 milhões) menos o que foi investido (aproximadamente R$ 3,08 milhões).

Do investimento, 1,1 milhão foi do montante de R$ 1,55 milhão supostamente repassado pela Galvão no esquema ilegal. Ou seja, considerando que ele não teria tirado esse valor do próprio bolso, o rendimento seria ainda maior, chegando a R$ 2,8 milhões.

Fim da picada

De acordo com a denúncia, ao menos R$ 619,2 mil da propina foram direcionados ao loteamento batizado de Jardim Azaleia, uma região cinco minutos distante do centro de Maringá.

O nome de Barros não está ligado aos documentos formais do empreendimento, mas papeis e arquivos apreendidos em setembro de 2020 pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do MPPR, indicam a existência de um contrato de gaveta que garantiria 18,57% da parte do negócio para o político. O trato foi feito com a verdadeira proprietária do loteamento, a maringaense New Center Construções, de Elio Alves Pereira, empresário próximo à família do parlamentar e que também foi denunciado pelo MPPR.  

O terreno foi comprado, sem qualquer irregularidade, por R$ 2,6 milhões de proprietários de um restaurante chamado Fim da Picada. Pelas investigações, Barros, representado pela MRC Incorporadora, da qual era sócio, ficou com oito lotes. Um mapa da divisão do empreendimento obtido pelo Plural a partir das redes sociais da New Center mostram que o terreno foi dividido em 38 partes.

Os negócios fechados em áreas de Barros renderam quase 1,72 milhão – sem descontar impostos.

A denúncia não chega a uma conclusão exata de quanto o deputado investiu nos lotes, mas um documento apreendido indica que teria havido um adiantamento no valor de R$ 615,8 mil e há constatação de que, com a suposta propina, foram acrescentados outros R$ 619,2 mil: R$ 219,2 mil para quitar uma dívida ativa do terreno que impedia a conclusão do contrato de compra e venda pela New Center e outros R$ 400 mil pagos, em uma parte, diretamente a Elio e Pereira, e outra parte depositada na conta da imobiliária.

De outra parcela de R$ 400 mil recebida pelos executivos da Galvão, Barros teria aplicado R$ 300 mil para quitar débitos de um terreno de R$ 1,4 milhão negociado de maneira independente no mesmo loteamento. A compra foi feita em nome da empresa International Bilingual School, do qual era sócio. Para evitar chamar a atenção, ele teria fracionado o depósito em montantes de R$ 150 mil, em agências diferentes, mas no mesmo dia. Após quitado, o terreno foi vendido pela empresa de Barros por R$ 3,05 milhões.

Além disso, a promotoria denunciou o paranaense por lavagem de dinheiro em outro empreendimento mantido informalmente com Elio Alves Pereira, da New Center Construções. O acordo também seria resultado de um contrato frio, o qual garantiria ao deputado 50% do direito sobre o negócio por R$ 450 mil. Parte deste valor, R$ 200 mil, teria sido pago com dinheiro de propina.

No antigo perfil da New Center Construções no Facebook, que não é mais usado embora ainda esteja no ar, a imobiliária tratou o Residencial Azaleia como um dos principais empreendimentos da empresa. Aos clientes eram oferecidos lotes residenciais variando de 380 a 472 metros quadrados. Planilha obtida pelo Ministério Público mostra que Barros concentro terrenos de 423 metros quadrados e 672 metros quadrados.

Nesta terça, o deputado respondeu à reportagem negando todas as acusações.

“Auditorias independentes realizadas mostraram ausência de dano ao erário na compra do parque eólico. O próprio delator reconhece que a venda foi abaixo do preço. Não houve tráfico de influência”, diz trecho nota encaminhada pela assessoria de imprensa do parlamentar.

A resposta ressalva que a denúncia foi protocolada no dia 13/10, mesmo dia em que a Câmara votava a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 5/21 proposta para alterar a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), polêmica entre os promotores.

Apesar de não citar os esquemas sustentados pelo MPPR, o deputado defendeu que os depósitos citados “são lícitos e estão declarados no meu imposto de renda ou das minhas empresas” e que “as aquisições também estão declaradas”. Quanto à doação eleitoral feita pela Galvão, ele disse ter sido um repasse “lícito” e “espontâneo”. “ Os valores foram distribuídos a vários candidatos que concorreram na eleição de 2014. A mim, foi destinado menos de 20 % do valor total, como reconhece o próprio MP eleitoral”.

“Repudio o ativismo político do MP, o vazamento de informações sigilosas e a criminalização das doações oficiais. Provarei mais uma vez a minha boa fé, como já provei em outras acusações do Ministério Público”, finaliza no texto.

A reportagem não conseguiu contato com a Galvão e, consequentemente, com os delatores Eduardo Queiroz Galvão e Jean Alberto Luscher de Castro, executivos da companhia, nem com Delmo Sérgio Vilhena, que aparece como uma espécie de operador do esquema.

Contatado por meio da New Center Construções, Élio Alves Pereira não retornou ao pedido de esclarecimento feito na tarde desta terça-feira.

A Copel não respondeu se reconhece tráfico de influência nas negociações das eólicas e respondeu às denúncias com nota encaminhada em agosto do ano passado a seus acionistas. O conteúdo foi formulado depois que portais adiantaram a existência de uma investigação envolvendo Barros e o processo de compra da estatal.

O texto diz que a diretoria atual, que não conta com nenhum membro do período investigado, “tomou, de imediato, as seguintes medidas: (i) informou os órgãos estatutários da Companhia sobre os fatos; (ii) recebeu do Conselho de Administração da Copel a aprovação, em setembro de 2019, para a constituição de comissão de investigação, a qual ainda está em andamento, com membro externo independente; (iii) informou os órgãos de controle externo e autoridades competentes; e (iv) solicitou ao STF acesso aos autos do processo para se informar do seu inteiro teor. Apesar de reiteradas solicitações, até o presente momento, não foi disponibilizado o acesso ao teor dos autos. Cabe informar, também, que o valor referente à multa tampouco foi depositado na conta da Companhia. A Copel tem interesse no esclarecimento do episódio, bem como na apuração e providências de acordo com a justiça brasileira”.

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