Interferências humanas podem ter causado a presença de microcrustáceos na água de Ponta Grossa

A proliferação pode ter sido causada pela desestabilização do ecossistema do Alagados

Em outubro de 2021, a população de Ponta Grossa teve uma surpresa ao abrir a torneira da, própria casa e encontrar microcrustáceos na água. Desde então, muitas são as dúvidas do porquê desta proliferação, aparentemente repentina, e de como os invasores passaram pelo sistema de tratamento da Sanepar até chegar à água dos moradores da região dos Campos Gerais.

A partir dos primeiros registros e inúmeras reclamações, a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) iniciou uma série de procedimentos e monitoramentos nos locais para conter a situação, que se estendeu por uma semana. O diagnóstico preliminar concluiu que os microcrustáceos não ofereciam riscos à saúde humana, mas que “a proliferação foi causada pela desestabilização do ecossistema da Represa [de Alagados], tendo como possíveis causas, a escassez hídrica, variação de volume do manancial, impactos do uso e ocupação do solo e interferência antrópica [por interferência humana]”, informou a companhia em nota.

“Tem uma série de impactos acontecendo, e não é só em Alagados, mas em diversos rios, represas e bacias do Paraná. Impactos como eutrofização, falta de mata ciliar, agrotóxicos na água e solo, talvez o aquecimento também”, explicou Marcos Pileggi, doutor especialista em microbiologia ambiental e genética, que juntamente com a equipe do Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná – SIMEPAR, e em conversa paralela com a Sanepar, montou três grupos formados por áreas da biologia evolutiva, engenharia ambiental e geografia, para iniciar os estudos e conversas sobre o caso. O professor também acrescentou que seria ótimo que as prefeituras das cidades da região se envolvessem nos projetos.

Questionada sobre o posicionamento da prefeitura e da Secretaria de Meio Ambiente, a assessoria informou que a concessionária responsável foi notificada para elaborar plano de ação e demais soluções. “A prefeitura também participou da investigação realizada para encontrar a origem do problema”, defenderam-se. 

“Tem uma série de impactos acontecendo, e não é só em Alagados, mas em diversos rios, represas e bacias do Paraná. Impactos como eutrofização, falta de mata ciliar, agrotóxicos na água e solo, talvez o aquecimento também”

Marcos Pileggi, doutor especialista em microbiologia ambiental e genética.

Não é de hoje

Conforme demonstrado nos estudos, os impactos no ecossistema vêm ocorrendo há bastante tempo na região, e um dos fatores mais determinantes a longo prazo, são as ações humanas. Atualmente, o Alagados possui 93 residências construídas em seu entorno, o que pode gerar grandes degradações, caso não haja fiscalização e sejam tomadas as devidas medidas com urgência. 

Mara Bandeira, proprietária de uma casa no entorno da represa desde 2000, conta que não estava na região durante o período em que foi detectada a presença de microcrustáceos na água, mas acredita que algumas medidas devem ser tomadas para que situações assim não ocorram mais. “Primeiro, proibir a plantação no entorno. Segundo, verificar se todas as casas estão com a parte de esgoto devidamente cuidadas. Os vizinhos que eu conheço, tem toda essa questão legalizada, mas acredito que tem casa que a fossa higiênica é muito perto da água”, explicou. Perguntada sobre a fiscalização no local, a proprietária disse não ter conhecimento. “Sei apenas que as vezes embargam construções que estão próximas da água”, disse.

A responsável por Alagados

Segundo a Companhia Paranaense de Energia (Copel), responsável pela gestão do Lago de Alagados, a existência e permanência de residências, mansões e do Iate Clube podem contribuir para eventuais desequilíbrios ambientais. “O uso e ocupação do solo é uma questão essencial a ser observada, visto que tem relação direta com atividades realizadas no entorno do corpo hídrico e com a conservação da vegetação nativa”.

Até o fechamento da matéria, o presidente do Iate Clube de Ponta Grossa não respondeu os questionamentos sobre os possíveis impactos ambientais na região.

Segundo a Sanepar, a bacia do Rio Pitangui é uma área de usos múltiplos e necessita estabelecer parcerias e compartilhamento de responsabilidades, a fim de viabilizar as ações para a segurança da água do manancial.

Entre essas divisões de responsabilidades estão os serviços realizados pela Copel.  Em resposta aos questionamentos sobre o monitoramento do tratamento da água, a Copel afirmou que esta incumbência é exclusiva da Sanepar. “A Copel realiza outros monitoramentos no local em atendimento à legislação aplicável à empresa enquanto concessionária de geração de energia, entre eles o monitoramento da qualidade da água que acompanha parâmetros físico-químicos e biológicos. Os resultados desse monitoramento são enviados periodicamente ao Instituto Água e Terra (IAT).”, respondeu a assessoria de imprensa da Copel.

Devido ao período de exposição da população aos microrganismos e as consequências ambientais relacionadas, o Ministério Público do Paraná (MP-PR) abriu inquérito para investigar as causas do problema.

Diante das obrigações mútuas entre as empresas em preservar a qualidade da água, e por consequência, da vida dos moradores de Ponta Grossa, e para também dar uma resposta e segurança à população, a Sanepar se comprometeu a iniciar análises e um grupo de estudos sobre a Bacia Hidrográfica do Rio Pitangui, onde fica a represa do Lago de Alagados.

Já a Copel informou que participa de grupos que discutem a questão ambiental e hidrológica da região de Alagados, entre eles, o Comitê Gestor de Alagados e o Comitê de Bacia do Tibagi, e que tem participado, ainda, de reuniões coordenadas pela Sanepar.

No entanto, tudo ainda está em fase de negociações. Conforme apurado pela reportagem, no momento estão sendo feitas as tratativas junto às prefeituras de Ponta Grossa, Castro, Carambeí, Conselho Municipal de Ponta Grossa, além do Instituto Água e Terra (IAT), Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR) e Copel para comporem um grupo de proteção à bacia.

Também houve a informação de que a Sanepar formalizou junto à Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), um convite para estabelecer um convênio para o desenvolvimento do Plano de Segurança da Água na bacia do Pintangui/Reservatório Alagados, que poderá ter a indicação de uso de recursos do Fundo Azul, para apoiar com financeiramente os projetos e ações de recuperação, proteção e conservação dos mananciais de abastecimento.

Devido ao período de exposição da população aos microrganismos e as consequências ambientais relacionadas, o Ministério Público do Paraná (MP-PR) abriu inquérito para investigar as causas do problema e o presente processo está em fase de investigação.

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