Analfabetismo entre pretos no Paraná cai, mas ainda supera índice entre brancos

Entre gênero, também há desigualdade. Hoje, a cada 10 paranaenses que não sabem ler nem escrever, seis são mulheres.

A taxa de analfabetismo entre pessoas pretas ou pardas, com 15 anos ou mais de idade, continua em queda no Paraná, mas ainda segue relativamente maior que a de brancos, mostram dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A leitura é de que, apesar do avanço, a desigualdade nas salas de aula está longe de ser um desafio superado no estado, inclusive sob a perspectiva de gênero. Hoje, a cada 10 paranaenses que não sabem ler nem escrever, seis são mulheres.

As informações são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) temática de Educação, referente a 2022, divulgadas no dia 7 pelo IBGE.

O levantamento mostra que, entre a população preta e parda do Paraná, a taxa de pessoas que não sabem ler nem escrever vem caindo nos últimos anos: de 7% em 2016 chegou a 5,6% no ano passado. Contudo, continua próxima ao dobro da encontrada entre os paranaenses brancos, estimada em 3,1%. Trata-se do maior índice relativo entre os estados no Sul. Em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, respectivamente, o contingente de não letrados é de 3,6% e 4,3% entre a população local de pretos ou pardos.

Se consideradas faixas de idade superiores, menos beneficiadas por políticas de acesso escolar fortalecidas nas últimas décadas, o impacto da desigualdade racial na educação se mostra ainda maior. Entre adultos pretos ou pardos de 40 anos ou mais, 10,8% são analfabetos, ante 5,3% de brancos. Com relação à população idosa, a disparidade é de 22,6% de pretos que não sabem ler nem escrever, enquanto entre brancos a taxa é 10,4%. A taxa de analfabetismo do IBGE deriva da razão entre o número de pessoas de determinada faixa etária que não sabem ler e escrever um recado ou bilhete simples no idioma que conhecem e o total de pessoas dessa mesma faixa etária.

“Mesmo com os avanços, a desigualdade se mantém. Então, não podemos tratar como uma questão histórica já resolvida porque os números mostram que, mesmo entre os mais jovens, ainda existe exclusão. A redução houve, ela é importante, mas não suficiente para dizer que tem de fato uma tendência de acabar com a desigualdade ou para dizer que isso não é mais um problema”, diz Ana Lorena de Oliveira Bruel, professora no Departamento de Planejamento e Administração Escolar da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e especialista em educação e desigualdades.

Outras variáveis avaliadas também reforçam a importância do debate sobre a desigualdade estrutural no sistema de ensino do Paraná. De acordo com a pesquisa, estudantes pretos somam hoje, em média, 9,2 anos de estudo, enquanto brancos chegam a 10,6 anos.

A média para ambas as populações definidas por cor e raça é ainda menor que a nacional, a qual também é desproporcional (10,9 anos para brancos e 9,4 anos para pretos) e atesta um cenário generalizado da persistência da desigualdade no acesso à educação.

“Uma coisa é certa. Se a desigualdade se mantém mesmo com as ações que têm sido realizadas, isso significa que a própria escola continua produzindo barreiras para permanência e acesso. Embora o ensino fundamental hoje esteja quase universalizado, quem está fora da escola é a população preta ou parda, a mais pobre, a da periferia, e isso mostra que as desigualdades continuam existindo e precisam ser enfrentadas”, acrescenta a docente da UFPR.

Desigualdade de gênero

O Paraná chegou em 2022 com 356 mil pessoas de 15 anos ou mais sem saber ler ou escrever. Destes, 144 mil são homens e 211 mil são mulheres, entre uma população de universo quase equivalente. A estimativa atual é de 4,73 milhões de mulheres e 4,52 milhões de homens no estado nesta faixa etária.

Isso faz com que a taxa de analfabetismo entre mulheres com mais de 15 anos no estado seja de 4,7%, e a de homens, 3,2%. O índice é inverso à média do país, em que, de modo geral, o maior contingente de analfabetos está entre homens.

Todos os estados do Sul e Sudeste têm comportamento semelhante, ou seja, em que o grupo de mulheres tem a maior taxa de analfabetos – Norte, Nordeste e Centro-Oeste, ao contrário. Ainda assim, é no Paraná que está a maior diferença na taxa por gênero em prejuízo às mulheres. Em São Paulo, por exemplo, a taxa de analfabetismo entre pessoas do sexo feminino é de 2,4%, e masculino, 2%. Em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, respectivamente, as taxas são de 2,4% e 1,9%; e 2,6% e 2,4%.

Para Bruel, passos mais largos em direção à superação do desafio da desigualdade nas escolas precisam ser guiados por iniciativas mais amplas. Propostas de políticas intersetoriais, que garantam acesso ao mercado de trabalho, à renda mínima e à moradia adequada, por exemplo, ajudariam a diminuir os indicadores que prejudicam pretos, pobres e mulheres. Trabalhos conjuntos entre estado e municípios – entes responsáveis por etapas distintas de ensino – também deveriam ganhar mais relevância, assim como a discussão de políticas afirmativas para a educação básica.

“Ao contrário do ensino superior, a educação básica tem pouca experiência com políticas com essas características. Assim como temos poucas políticas pensadas para o enfrentamento do racismo no interior das escolas, que é algo que, de fato, provoca a saída do aluno do sistema de ensino. É muito comum vermos nas explicações oficiais de baixa frequência justificativas pautadas em questões individuais, como falta de interesse, reprovou e não quis continuar, quando, na verdade, precisamos pensar a partir do sistema de ensino. Se um aluno não está na escola é porque as condições não estão sendo dadas”.

Recentemente, o enfrentamento à desigualdade educacional foi classificado pela Comissão de Educação do Senado Federal como prioridade na elaboração do novo Plano Nacional de Educação (PNE), que definirá metas e estratégias para o período de 2024 a 2034. A audiência levou em conta estudos e levantamentos recentes que mostram o desequilíbrio de infraestrutura e investimento em escolas de bairros de população de maioria negra em comparação com os de maioria branca.

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