Escolas do Paraná já têm 50% dos funcionários terceirizados

Números mostram que, em 2022, governo gastava R$ 114 milhões a mais por ano com terceirizações

Quase quatro anos depois da aprovação da lei que extinguiu cargos na administração estadual, metade do quadro de funcionários de escolas já está terceirizado em todo o Paraná, segundo levantamento feito pelo APP-Sindicato. De acordo com educadores, além de aumentar a rotatividade de profissionais nas escolas, a terceirização custa no mínimo R$ 114 milhões a mais por ano aos cofres públicos, conforme estimativa feita pelo sindicato no fim de 2022. Os funcionários são responsáveis por funções como preparação de merenda, zeladoria, inspetoria, serviços gerais e serviços administrativos.

Aprovada pela Assembleia Legislativa do Paraná durante a pandemia do coronavírus, no dia 29 de abril de 2020, a lei estadual 20.199 extinguiu uma série de cargos da administração pública, entre eles os de Agente Educacional I e Agente Educacional II, do Quadro dos Funcionários da Educação Básica (QFEB). À medida que se aposentam, os funcionários selecionados por meio de concurso público ou do PSS (Processo Simples Simplificado) são substituídos por profissionais contratados por empresas. Os lotes com os Núcleos Regionais de Educação são disputados pelas empresas em pregões eletrônicos.

Segundo o APP-Sindicato, ainda há no quadro do estado 7.374 agentes de nível I e 7.467 de nível II, um total de 14.841 servidores. Já o número de terceirizados chega 14.737. Os cargos mais ocupados por terceirizados quando a pesquisa foi concluída, no dia 5 de março, eram os de servente de limpeza, com carga de trabalho de 40 horas semanais (4.352), e de assistente administrativo, também com 40 horas semanais (3.270).

“O funcionário de escola hoje não é só quem serve cafezinho ou quem faz a limpeza. É aquele que abre a escola, acolhe os alunos e o professores. A profissionalização é muito importante e o funcionário terceirizado muitas vezes não tem esse vinculo com a escola”, diz a diretora de Funcionários do APP-Sindicato, Elizabete Almeida. “Até porque o salário do terceirizado é menor que o do profissional concursado”.

Em dezembro do ano passado, o governador Ratinho Jr. (PSD) sancionou a lei que aumentou o salário inicial do Agente I de R$ 1.129,12 para R$ 2.066,29, segundo a Agência Estadual de Notícias. O vencimento inicial de um Agente II passou de R$ 1.693,66 para R$ 4.064,77. Com a progressão de carreira e a depender do número de horas trabalhadas, o salário de um Agente I pode ultrapassar os R$ 6 mil, conforme o Portal de Transparência do governo, e o de Agente II pode ser superior a R$ 9 mil.

Já o contrato firmado entre o governo e uma das empresas prestadora de serviços, firmado neste ano para atuar em Núcleos de Educação de 14 municípios, prevê o repasse, à empresa, de R$ 3.210,14 por merendeira com carga de 40 horas semanais, por exemplo. No caso de uma servente de limpeza com carga de 40 horas, o repasse é R$ 3.821,87. O valor total pago às empresas é a soma dos repasses por funcionário, mas não há garantia um valor mínimo para os trabalhadores.

Durante uma entrevista na campanha pela reeleição, em 2022, Ratinho Júnior disse que o estado gastava muito com ações trabalhistas e funcionários que tiravam licença médica sem estarem doentes. Em 2019, o gasto com os contratados via PSS foi de R$ 314 milhões, valor que saltou para R$ 532 milhões três anos depois (69% a mais). Segundo o governador, o estado tinha um custo de 30% maior com a contratação via PSS por causa de funcionários “que apresentavam atestados médicos, e, na sua grande maioria, não estavam doentes”. Ele disse ainda que “o estado estava perdendo todas as ações trabalhistas”.

“Se os funcionários fossem contratados pelo PSS, a economia seria R$ 114 milhões por mês, com base no cálculo feito em 2022. Sem contar que os CNPJs vivem mudando, sempre temos problemas para encontrar as empresas”, afirma Bete Almeida. Segundo ela, há uma grande rotatividade de profissionais. “O funcionário concursado, quando assume um padrão em uma escola, sabe que vai ficar ali. Ele cria vínculo com a escola. O terceirizado não, ele está sujeito a uma grande rotatividade”.

Pressão

Ex-funcionária terceirizada em uma escola na região metropolitana de Curitiba, Gabriela Sena, de 40 anos, disse ter sofrido pressões e enfrentado acúmulo de funções em seu dia a dia. “Comecei como inspetora com carga de 20 horas semanais, mas a diretora me passou para o administrativo com 40 horas. Era para ela ter uma escrava durante 40 horas, para fazer tudo que ela mandasse. Eu tomava conta de alunos no laboratório e alegavam que isso era função administrativa. Ia para a biblioteca, ficava três horas com a turma na quadra de esportes, se precisasse eu lavava pratos”.

Gabriela conta que recebia cerca de R$ 600 mensais quando tinha o padrão de 20 horas semanais e que o salário passou para aproximadamente R$ 1,6 mil quando a carga horária dobrou. A seleção para o cargo durou menos de 10 minutos, segundo ela. “Fui indicada por um colega do meu filho. A empresa pediu meu currículo e fiz uma entrevista, mas a grande preocupação deles era com a minha pressão arterial ou se eu conseguia levantar o braço. Não levam nossa qualidade em consideração”.

Pressões, indicações e transferências faziam parte da rotina da escola, relata a ex-funcionária. “Tem muitas vítimas de assédio moral e de abuso de poder das diretoras. E também tem a superproteção”, relata Gabriela. “Muitas pessoas foram demitidas depois de passar por cirurgias de emergência. A empresa liga para a escola e demite por telefone, no outro dia já tem alguém no lugar. Dificilmente algum terceirizado completa dois anos na empresa. Quando tive problemas, fui transferida”.

O deputado estadual Professor Lemos (PT) diz que atualmente é difícil fazer um levantamento preciso dos locais em que cada empresa atua no estado, pois há Núcleos de Educação com mais de uma terceirizada. “O quadro de terceirizados vai gradativamente crescendo, porque os concursados vão saindo e faz tempo que não tem concurso. Hoje são 14 empresas que fornecem funcionários. O governador repassa o dinheiro público para essas empresas contratarem”.

Lemos avalia que a lei 20.199 deveria ser revogada. “É uma situação muito grave. O trabalho não tem continuidade, o funcionário não cria vinculo com a comunidade escolar e não se sente um educador”, diz o deputado. “Isso prejudica a formação dos estudantes. A escola não é só o professor, o funcionário também é um educador. O terceirizado, além de ter um salário menor, não tem segurança e não tem carreira”.

Além dos cargos de Agente Educacional I e II, a lei 20.199 extinguiu do quadro funcional do estado os cargos de Promotor de Saúde Fundamental, Assistente de Farmácia, Auxiliar de Enfermagem, Desenhista Industrial, Desenhista Técnico, Inspetor de Saneamento, Técnico Administrativo, Técnico de Contabilidade, Técnico de Informática, Técnico de Manutenção, Técnico de Radiologia, Técnico de Conservação e Restauro, Técnico de Construções e Topógrafo.

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2 comentários em “Escolas do Paraná já têm 50% dos funcionários terceirizados”

  1. Seguindo o pensamento do Prof Lemos um trabalhador na Escola é um Educador, quer o Estado queira ou não. Precisamos encontrar um jeito de comportar o funcionário terceirizado junto com os funcionários de carreira sem perder os saberes de ambos. Ex. Jardinagem não é uma função que precise de concurso, pode-se terceirizar essa função, mas portaria é lugar de pessoas que acolham os Alunos e que estes sintam segurança. A Escola não é um Shopping onde as pessoas vão passear, elas estão ali para completarem a formação de “Cidadão”.

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