Para usar canabidiol paciente enfrenta obstáculos

Acesso ao medicamente sai caro e depende de médicos dispostos a receitá-lo

O uso do óleo de canabidiol no tratamento de inúmeras doenças no Brasil já é parte do cotidiano brasileiro. A substância foi retirada da lista de itens proibidos no país pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2015, depois de uma batalha judicial liderada por familiares de pacientes. O acesso ao medicamento, porém, não é tão simples. A reportagem do Plural foi verificar como um paciente comum pode ter acesso ao medicamento e descobriu que pode ser fácil, desde que se possa pagar (caro) por isso.

O primeiro empecilho no caminho é a própria comunidade médica. A reportagem do Plural tentou conseguir que um médico credenciado de dois planos de saúde receitassem o uso do medicamento para tratar um paciente com Transtorno de Ansiedade já em tratamento com antidepressivos. Ambos listaram falta de estudos conclusivos no uso do remédio e o seu alto custo para não receitá-lo.

No entanto, a reportagem encontrou diversas clínicas e serviços online que encaminham potenciais pacientes diretamente a médicos já dispostos a fazer a prescrição. Usando um desses serviços o paciente paga a consulta particular com o médico indicado e saí com a prescrição em mãos.

No caso do paciente acompanhado pelo Plural, o médico apenas o alertou de que o remédio não é seguro em caso de gravidez. Também solicitou que os antidepressivos já utilizados pelo paciente fossem mantidos, assim como o acompanhamento com o psiquiatra do plano de saúde durante os seis meses de introdução da nova medicação.

Em alguns casos, o Plural apurou, a prescrição médica inclui também a aprovação da Anvisa, o segundo documento obrigatório para comprar óleo de canabidiol legalmente no Brasil. O preço por esse serviço varia de R$ 250 a R$ 500 pela consulta que pode ser presencial ou online, via videoconferência.

Com a documentação em mãos, o paciente chega ao terceiro empecilho na busca do tratamento: o preço. Dependendo da concentração do óleo indicado, o frasco pode custar de R$ 300 a R$ 2500. Isso porque ainda há poucos laboratórios autorizados a produzir produtos a base de CBD no país. Até pouco tempo, apenas um – a Prati-Donaduzzi – tinha produtos disponíveis à venda nas farmácias brasileiras.

Hoje cerca de dez empresas tem 18 produtos autorizados na Anvisa, alguns são produzidos fora do país e vendidos aqui. Com a falta de concorrência, o preço sobe.

Outra opção para os pacientes é a compra do óleo junto a associações de pacientes. Líderes da briga judicial que culminou com a liberação da venda do óleo no país, algumas dessas associações também possuem autorização para produzir o medicamento, quem vendem para associados. Isso significa que o paciente precisa se associar para comprar o produto, o que inclui o pagamento de anuidade e a burocracia adicional atrelada a associação.

Por fim, o paciente pode recorrer a importadoras autorizadas, que compram o medicamento principalmente nos Estados Unidos e entregam, via Correio, na casa do paciente no Brasil. Em alguns casos essa opção acaba sendo mais barata. A importação, o Plural apurou, muitas vezes inclui o pagamento antecipado pelo medicamento e, em alguns casos, a compra do lote relativo a todo tratamento de uma única vez.

No caso do paciente acompanhado pelo Plural, seis meses de medicamento custariam R$ 3.395,75 pagos à vista ou parcelados no cartão de crédito. Entre a compra e a entrega do medicamento há um prazo de cerca de 40 dias, que inclui a compra, envio para o Brasil e processo de liberação alfandegária do medicamento.

O que é canabidiol? E para que serve?

O canabidiol ou CBD é um composto químico da cannabis sativa, uma planta que é mais popularmente conhecida por maconha. Ao contrário do THC – outro composto da cannabis – o CBD não tem efeito alucinógeno, mas atua sobre o sistema nervoso. Pesquisas científicas apontam um potencial terapêutico no tratamento de doenças que afetam esse sistema, mas os maiores avanços em estudos clínicos se refere ao uso da substância no tratamento de crises convulsivas.

Além da epilepsia, o CBD tem sido estudado no tratamento de depressão, ansiedade, fibromialgia, autismo e muitas outras doenças ou condições. O aumento de pesquisas sobre o composto é resultado de uma mudança de postura da comunidade científica em relação a substâncias psicoativas. No Brasil, porém, enquanto o uso do CBD está liberado, a maconha permanece ilegal. O plantio dela, porém, é parte fundamental da produção de compostos com CBD e THC para uso medicinal.

Políticos pela cannabis

A relação entre droga ilegal e medicamento acaba colocando o uso do canabidiol no meio do tiroteio ideológico promovido por grupos políticos que promovem pautas morais nas eleições. Por outro lado, o potencial terapêutico colocou nas fileiras de quem luta para facilitação do acesso ao medicamento políticos com pouca experiência com causas progressistas, como o deputado federal Luciano Ducci (PSB), relator do projeto que legaliza o plantio de cannabis para fins medicinais e industriais no Brasil.

O projeto de Lei 399/15 foi aprovado pela Comissão Especial em 2021, mas não foi para votação em plenário ainda por causa do risco de ser vetado pelo atual presidente, Jair Bolsonaro (PL).

Ducci disputa esse ano a reeleição para a Câmara. Além dele, o lobby da cannabis medicinal no Paraná também conta com outros dois apoiadores na eleição para a Assembleia Legislativa: o atual deputado estadual pelo PDT, Goura e a vereadora de Curitiba, Maria Letícia (PV), candidata a deputada estadual este ano.

Mercado ilegal

Enquanto para a compra legal de canabidiol ainda há barreiras e burocracia, no mercado ilegal o paciente enfrenta preço menores, mais opções de produtos, mas incertezas. A disponibilidade de produtos que alegam ser a base de CBD e/ou THC em sites de venda é significativa. Além do óleo, o cliente disposto a pagar o preço tem acesso a cosméticos, cremes e outros produtos com os compostos.

Esses produtos, porém, muitas vezes são de vendedores individuais, sem garantia de origem nem de qualidade. Um médico ouvido pelo Plural disse conhecer situações em que embalagens de produtos importados foram vendidas contendo óleos genéricos, sem nenhum valor terapêutico. Outra situação é a diluição do óleo original sem controle de qualidade.

Como o tratamento com canabidiol é individual e depende da concentração do óleo para determinar a dose ideal, a falta de qualidade do óleo utilizado pode comprometer os resultados obtidos. O uso do óleo tem inúmeros efeitos colaterais que podem ser minimizados com a alteração da dose utilizada, mas isso depende da confiabilidade do óleo usado.

Entre os principais efeitos colaterais estão sonolência e diarréia, mas são listados também insônia, irritabilidade, dor de cabeça, agitação, entre outros.

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