Após 20 anos de idas e vindas, PT e Requião selam união para tentar voltar ao poder

Dois anos depois de deixar a prisão, ex-presidente volta nesta sexta-feira a Curitiba para oficializar a filiação do ex-governador ao partido e fortalecer candidaturas

Mais de dois anos depois de deixar a sala transformada em cela na Polícia Federal em Curitiba, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva volta à cidade, desta vez em uma situação bem diferente. Líder nas pesquisas de intenção de voto para a corrida presidencial deste ano, Lula estará nesta sexta-feira (18) na capital paranaense para oficializar a filiação de Roberto Requião ao PT, partido pelo qual o ex-governador deverá voltar a disputar o Palácio Iguaçu. A cerimônia será às 18 horas, na Expo Unimed, no Mossunguê.

A filiação garante um palanque de peso para Lula no Paraná e sela uma aliança iniciada há duas décadas. Os dois venceram juntos a eleição de 2002, quando o petista foi eleito presidente pela primeira vez. Requião, que era filiado ao PMDB, derrotou Alvaro Dias (então no PSDB) na disputa pelo governo do estado, na chamada “onda vermelha” que ajudou a eleger candidatos apoiados por Lula em todo o país. Ao longo do mandato, Requião passou a criticar a política econômica do governo.

A relação ficou abalada em 2006, quando ambos disputaram a reeleição (e foram reeleitos). Requião chegou a formalizar uma aliança com o PSDB, partido do principal adversário de Lula na disputa presidencial, Geraldo Alckmin — que no Paraná tinha uma aliança com o candidato do PDT ao governo, Osmar Dias. A Executiva Nacional do PSDB anulou a aliança com o PMDB paranaense e Requião declarou apoio a Lula somente uma semana antes da eleição, após Lula pedir votos para o peemedebista.

Mas a cena que correu o Brasil foi outra, registrada oito meses antes daquela eleição. Em fevereiro de 2006, eles se encontraram no Palácio do Planalto e um dos temas da conversa foi o programa de incentivos à produção de combustíveis a partir de fontes alternativas — como as sementes de mamona. Diante das câmeras, Requião não pensou duas vezes e colocou algumas sementes na boca. “Isso é mamona, pô”, alertou Lula. “Você sabe que isso tem uma toxina que não pode comer.”

Em entrevista publicada no ano passado em seu canal no YouTube, Requião negou que tenha engolido as sementes. “Eu brincava com mamona. O Paraná já foi o maior produtor de mamona do mundo”, disse. “No Colégio Estadual do Paraná, eu levava um canudinho de bambu, abria a cápsula da mamona e aquelas bolinhas eu punha dentro para soprar na orelha dos colegas sentados na frente. Aquilo foi uma piada.”

Requião com Lula em 2016: mamona (Reprodução/YouTube)

Com mamona ou não, Requião também trocou acusações com a candidata do PT ao governo em 2014, Gleisi Hoffmann — hoje presidente nacional do partido. Os dois acabaram derrotados por Beto Richa (PSDB). Requião acusava o PT de traição, por ter apoiado a candidatura de Gustavo Fruet (PDT) para a prefeitura de Curitiba em 2012, e afirmava que o partido havia traído a presidente Dilma Rousseff. Os casos de corrupção também entraram na mira do senador.

Gleisi Hoffmann respondeu com questionamentos a respeito da evolução patrimonial do adversário e pediu para a militância petista cobrar explicações. O PT do Paraná chegou a emitir uma nota oficial em que questionava os valores, declarados por Requião à Justiça Eleitoral, referentes a um veículo e a um título do Clube Curitibano.

Frente de partidos

Nesta quinta-feira (17), Gleisi Hoffmann comemorou a chegada de Requião e lembrou que os dois se conhecem desde a década de 1980. “Para nós do PT, em particular para mim, é alegria muito grande receber o amigo e companheiro Roberto Requião no PT. O conheço desde a década de 80. Sempre teve lado. Firme, decido, defende o povo e a soberania do país. Será um grande movimento pelo Brasil e pelo Paraná”, publicou Gleisi no Twitter.

Lula, segundo o site do PT, disse que a filiação do ex-governador do Paraná faz parte da estratégia do partido de reunir lideranças de peso para enfrentar a extrema direita em todo o país.

“Nós precisamos fazer um grande movimento contra a extrema-direita no Brasil e o Requião é a pessoa mais preparada no Paraná para vencer essa batalha conosco. É só assim que a gente vai conseguir resgatar o país e o Paraná para o nosso povo novamente.”

Lula, pré-candidato do PT à Presidência.

Requião deixou o MDB em agosto. Pelo partido, ainda chamado PMDB, foi eleito deputado estadual em 1983, prefeito de Curitiba em 1985, três vezes governador e duas vezes senador. Desde que anunciou sua desfiliação, vinha dizendo que pretende formar uma grande frente de partidos para enfrentar o governador Ratinho Junior (PSD) nas eleições deste ano. Especulou-se que iria para o PSB, o PCdoB, o PT ou o PDT, mas o ex-senador chegou a declarar que tem “grife própria” e não depende de partidos.

“Nós estamos participando de uma frente, de um movimento que vai modificar essa realidade submissa do Brasil diante dos interesses do muito ricos e do grande capital”, disse Requião ao anunciar sua filiação ao PT. “Analisando a conjuntura política eu não tenho mais dúvida nenhuma, o caminho é esta federação, esta frente organizada pelo PT.” O ex-governador disse ainda que defende “um programa factível, sem extremismos, mas sem a covardia de uma aliança com o capital financeiro”.

Segurança reforçada

A Polícia Militar terá um esquema especial de segurança na região do Mossunguê nesta sexta-feira e em locais de possíveis confrontos entre manifestantes contrários e favoráveis a Lula. Nas redes sociais, apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e do ex-juiz Sérgio Moro afirmam que a cidade terá atos contra a presença do petista e pedem para os manifestantes jogarem ovos. A revista Veja afirmou que uma “tocaia” está sendo organizada para o ex-presidente em grupos de apoio a Bolsonaro no Whatsapp.

No sábado (19), Lula vai a Londrina para visitar o assentamento Eli Vive, do MST, onde vivem 501 famílias. Requião e Gleisi deverão participar. O diretório do PT no Paraná também teria preparado um esquema especial de segurança para a passagem do ex-presidente pelo estado.

Prisão e acampamento

Lula reencontrará Curitiba dois anos e quatro meses depois de deixar a prisão, na Superintendência da Polícia Federal, no bairro Santa Cândida. Líder nas pesquisas de intenção de voto para a disputa presidencial de 2018, o petista se entregou à Polícia Federal em 7 de abril daquele ano e passou 580 dias preso, em função da condenação no processo que investigava o suposto recebimento de propina por meio de um apartamento tríplex no Guarujá (SP). Lula chegou à noite, de helicóptero, e a Polícia Militar usou bombas de gás para dispersar os manifestantes.

Apoiadores do ex-presidente montaram um acampamento no bairro Santa Cândida, o que levou a prefeitura de Curitiba a pedir na Justiça a desocupação das ruas. Os manifestantes então alugaram terrenos na região e permaneceram acampados. Eles chegaram a relatar episódios de ameaças e agressões. Logo após a prisão, no dia 28 de abril, duas pessoas ficaram feridas depois de um desconhecido atirar contra o acampamento.

Lula foi solto no dia 8 de novembro de 2019, um dia após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter considerado a prisão em segunda instância inconstitucional. No dia 15 de abril do ano passado, o STF anulou as decisões da Justiça Federal de Curitiba contra o ex-presidente, em quatro processos derivados da operação Lava Jato.

Além da condenação no caso do tríplex, proferida pelo então juiz Sérgio Moro, em julho de 2017, o petista havia sido condenado pela juíza Gabriela Hardt no processo sobre o sítio de Atibaia (SP), em fevereiro de 2019. A suspeita era que Lula também havia recebido o imóvel como propina. As penas eram de 9 anos e 6 meses de prisão, no primeiro processo, e de 11 anos e 12 meses no segundo. Com as anulações, Lula voltou a se tornar elegível.

O acampamento Lula Livre, no bairro Santa Cândida. Foto: Joka Madruga/PT-PR.

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1 comentário em “Após 20 anos de idas e vindas, PT e Requião selam união para tentar voltar ao poder”

  1. Ariel Augusto Gavlak

    Errata: em 2002 Álvaro Dias era do PDT, que ainda sob o comando de Brizola apoiou Lula no segundo turno, deixando Álvaro e Serra em uma situação delicada, sem poderem unir forças no estado.

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