STF decide que só uma mãe em relação homoafetiva terá licença-maternidade

A criação de uma política interna nas empresas sobre igualdade de gênero e parentalidade é essencial

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o Tema 1.072 sobre a possibilidade de concessão de licença-maternidade à mãe não gestante, em união estável homoafetiva, cuja companheira engravidou após procedimento de inseminação artificial. A decisão foi tomada no julgamento, no dia 13/03/2024, do Recurso Extraordinário (RE) 1211446, com repercussão geral.

O caso específico tratava de uma servidora pública, mãe não gestante, que possuía uma companheira que é trabalhadora autônoma e ambas convivem em união estável homoafetiva. No caso a companheira (autônoma) engravidou após o procedimento de inseminação artificial. A discussão seria se a servidora poderia usufruir da licença-maternidade.

O STF decidiu que no caso de uma união homoafetiva entre mulheres, uma das mães terá o direito à licença-maternidade e a outra à licença-paternidade. Se a pessoa que engravidou tenha utilizado o benefício da licença-maternidade, a companheira poderá usufruir da licença-paternidade.

Esse julgamento é problemático, pois envolve um debate muito mais profundo e que exige um estudo não somente do caso específico de uma relação homoafetiva de mulheres e a inseminação artificial.

Há a necessidade que os tribunais e o legislador se atentem às diversas conformações familiares que existem hoje para poder trazer a sociedade uma resposta adequada.

Relembro que a licença-maternidade e a licença-paternidade são institutos muito diferentes: a licença-maternidade é de 120 dias e, ainda, gera a estabilidade desde a descoberta da gravidez até cinco meses após o parto; enquanto a licença-paternidade é de cinco dias e não é possível a demissão dentro deste período.

Veja-se que, por exemplo, no caso de uma relação homoafetiva entre dois homens, não há uma definição. Há alguns casos em que se concedeu a licença-maternidade para um membro do casal, mas apesar desse tema ter sido debatido no julgamento, não foi definido.

Há diversas lacunas nessa temática, como a larga diferença entre o tempo de licença-maternidade e paternidade. Além disso, o fato de impor-se uma lógica de homem-mulher para uma relação homoafetiva reforça diversos estereótipos e não contribui para os reais objetivos desses institutos.

Vejam que dentro de uma relação homoafetiva, uma das pessoas terá que escolher quem será o “pai” e quem será a “mãe”, o que vai contra a própria natureza dessas relações e da própria identidade das pessoas.

Ao fim, ao invés de ampliarmos o debate e aprofundarmos para a compreensão de uma licença-parental que poderia possibilitar um acordo entre o casal e suas diversas conformações hoje, permanecemos reforçando dois institutos que se demonstram incompatíveis com as vivências atuais nas relações homoafetivas e heterossexuais também.

A discussão paralela sobre a ampliação da licença-paternidade (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão – ADO 20, no STF) também é um alerta de que o caminho não é a manutenção desses dois institutos. E sim, o desenvolvimento de uma licença-parental que propicie uma forma de equilibrar a participação de todos os genitores em todas as conformações familiares.

Destaco que esse será um grande desafio tanto para as trabalhadoras como para as empresas, pois há mais dúvidas do que respostas. A criação de uma política interna nas empresas sobre igualdade de gênero e parentalidade é essencial para poder lidar com essas situações.

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