Wes Ventura, o músico moldado pela Boca Maldita

Natural de Barretos (SP), foi nas ruas de Curitiba que Wes Ventura passou a exercer a profissão de músico

Quem me recebe no portão é a pequena Goiaba, uma vira-lata adotada há dois anos pelo músico de rua, Wes Ventura. Ela corre por entre o gramado do vasto terreno, no qual casas de madeira se distribuem em uma espécie de condomínio. Conto oito grandes araucárias no jardim: é aqui, em meio ao verde da grama e das árvores, que o músico Wesley Aparecido Ventura Crispe, de 25 anos, mora com sua companheira, Catarina Bertúlio, no Pilarzinho. 

Wes em meio ao verde do quintal da casa que divide com a companheira, no Pilarzinho. Crédito da foto: Ana Justi

Natural de Barretos, no estado de São Paulo, Wes mudou-se para Curitiba há cerca de três anos, quando passou a exercer a profissão de músico em definitivo. Artista desde cedo, as primeiras composições começaram ainda na cidade natal, quando tinha entre 13 e 14 anos. Os versos iniciais, hoje vistos pelo músico como ‘toscos’, por falarem de uma passado juvenil, cantam: “Sentado calado no meu canto / Andando sozinho por outros bandos / Pessoas me fazem chorar / Crio brinquedos em minha memória / Faço minha vida com outras histórias”. 

Primeira canção composta aos 14 anos

A ligação com a música vem desde cedo, seja pelas memórias do avô – violeiro das festas de Santos Reis – ou pelos dias gastos sentado sozinho no quarto com o violão. “Nunca imaginei que eu cantasse, mas sempre amei isso com tanta força… Sempre quis cantar pras pessoas, viver disso”, conta ao lembrar que aprendeu os primeiros acordes no violão com videoclipes de bandas de metal.

O que começou na adolescência, no calor do interior de São Paulo, virou profissão nas terras frias de Curitiba. Por iniciativa de um amigo, Wes adotou a capital paranaense como sua morada – deixou em Barretos a família, o passado trabalhando como servente de pedreiro, a casa e a moto. “Larguei tudo e vim.”, relembra.

No início eram os covers, em um bar já extinto, que ajudavam nas contas. Depois vieram as apresentações nos ônibus. “Cheguei com a minha cabeça em Curitiba formada, de que eu não ia trabalhar com mais nada além de ser músico”, conta. A estratégia era simples: dentro dos ônibus e terminais, a dupla vinda, de Barretos, mesclava músicas autorais a sucessos como Back to black, de Amy Winehouse, e Sujeito de sorte, de Belchior. Com a fiscalização da prefeitura pressionando as performances no transporte público da cidade, a saída foi recorrer às ruas.

“Tocar na rua pra mim é respirar. Quando eu tocava na rua eu me sentia livre de verdade”, declara Wes. A última apresentação na XV, lugar que mudou a sua vida, aconteceu no dia 12 de julho desse ano, e acabou na 1.ª Companhia do 12º Batalhão da Polícia Militar, no Centro. Junto com um colega, Wes foi detido e teve instrumentos apreendidos após uma denúncia de perturbação do sossego. Cinco viaturas atenderam à ocorrência.

Foi em meio ao calçadão de petit-pavê que o tão esperado reconhecimento veio – quando passou a ser abordado e conhecido por suas músicas autorais. Para o músico, o sucesso não está vinculado à fama ou à riqueza, mas à liberdade: “Só queria ser eu, estar cantando na rua. Me sentia vivo e sabia que estava fazendo algo bom para as pessoas”, relata. É do contato, e da troca com os outros, que Wes tira sua satisfação pessoal. Saber a diferença que sua música pode fazer no dia de alguém é o que conta – além das histórias que escuta.

A canção Cantei, andei, tardei foi inspirada na história de um homem com quem Wes conversou na rua

Hoje, Wes tira o sustento da noite, tocando em bares do Batel à Trajano Reis, e não se prende a rótulos: blues, música brasileira, crítica social, canções de amor… Tudo é jogo no processo contínuo de busca no qual o músico se vê: “Sou um ponto de interrogação”, pontua. Mesmo sem data, o futuro promete o primeiro álbum. Enquanto a gravação não sai, a melhor forma de escutar o músico que foi forjado no calçadão da Boca Maldita, é esbarrar com sua música pelos bares da noite curitibana e claro, pelo Facebook ou Instagram.

Sobre o/a autor/a

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

O Plural se reserva o direito de não publicar comentários de baixo calão, que agridam a honra das pessoas ou que não respeitem níveis mínimos de civilidade. Os comentários são moderados por pessoas e não são publicados imediatamente.

Rolar para cima