“Suspeitos” escapa dos crimes comuns no teatro para crianças

Peça na mostra Guritiba prova que dá para fazer espetáculos "bem maneiros" para o público infantil e ainda ganhar aplausos dos adultos

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“Suspeitos” começa com dois detetives tentando desvendar o sumiço de um quadro do pintor francês Pablo Compasso. Os investigadores – com panca de nascidos em filmes noir e criados no meio da galerinha do “Prédio Azul” – apostam para ver qual desvendará antes o mistério do suposto roubo da tela “A Megera Indomável”.  Entre outras sacadas engraçadas, até um extraterrestre aparece na trama. 

Realmente, a história da peça escrita por Denise Crispun é bem divertida. Ainda bem, pois eu “arrastei” para a plateia um menino de sete anos e corri os riscos envolvidos nisso. Na competição com videogames, redes sociais e streaming, todo convite diferente tem grandes chances de virar uma luta. Venci. Ele foi de má vontade, mas foi. E, com dois minutos de peça, estava hipnotizado. Até pensei em fazer alguma provocação como vingança pela manha, mas fui desencorajada pelos olhinhos fixos no palco.

Suspeitos espetáculo infantil Festival de Teatro
Pablo Compasso e sua assistente. (Foto de: Lina Sumizono/Divulgação)

Sobre os motivos do encantamento, a resposta foi “é tudo bem maneiro”. Para o meu filho, uma das melhores cenas da peça foi aquela em que o pintor tenta falar amordaçado e depois sai amarrado, enquanto as gargalhadas rolam soltas na plateia. Mais tarde, com o menino já fora do teatro, veio a epifania: “Dava para escapar antes porque ele conseguia ir pulandinho”. Ponto para a arte, ele ficou curtindo a peça tempos depois do fim. 

No ranking dos momentos preferidos, tem outra cena protagonizada por Saulo Rodrigues, que entrou no elenco em 2022, após a primeira temporada on-line do espetáculo, em 2021. É quando o detetive, vivido pelo ator, domina a plateia ao trocar um verso de “Desenrola, bate, joga de ladinho” por “chora Curitiba”, fazendo uma dancinha inspirada nas que bombam no TikTok. Pronto, a galerinha vai ao delírio e se motiva para, em coro, dedurar mais uma patacoada do investigador para outra personagem no palco. 

Sacou a pista no início do parágrafo anterior sobre Rodrigues interpretar maravilhosamente mais de um papel? É a palavrinha “outra”, e os outros atores também mandam muito bem fazendo vários papéis. Carol Machado (das novelas “Top Model” e “Vamp”) e Alcemar Vieira (que ainda dirige o espetáculo) provam que os pequenos sabem reconhecer talentos quando o texto está na ponta da língua e o corpo ensaiadíssimo. No final, até os meio tímidos estão empolgados para pedir fotos com os três, que se multiplicam em nove personagens. 

Suspeitos o espetáculo infantil Festival de Curitiba
Extraterrestre Arcanjo Alfa (Foto de: Lina Sumizono/Divulgação)

Houve outros pontos altos, como a aparição do alienígena que “parece aquelas bolas de festa cheia de coisinhas que brilham como espelhos”. Porém, endosso algumas reclamações quase unânimes entre as crianças e os pais. A primeira é que “o quadro de projeção podia ser maior”, pois a moldura dourada, que faz todo o sentido para o resto da peça, cortava as imagens que já não estavam lá grandes coisas (projeções vêm sendo um problema recorrente em peças diferentes). A segunda diz respeito ao palco altíssimo do Teatro Bom Jesus, não teve almofada que resolvesse a diferença de altura e muitos perderam – ao menos – os pés das cenas. Em um espetáculo infantil, sempre vai ter criança nas primeiras filas da plateia.

Um olhar adulto

Até que se prove o contrário, todos os espetáculos são suspeitos. Não no mau sentido, quem leva os filhos ou agregados no teatro espera ter bons momentos com a gurizada. Só que tem um mundo de pistas falsas por aqui, com muitas produções precárias ou livremente inspiradas em desenhos animados, mas que não ficam nem lá, nem cá (certamente um punhado de narizes de palhaço e outras dúzias de varinhas de condão foram arremessados em minha direção agora, contudo, é preciso encarar a realidade para crescer). 

A sensação de ganhar a aposta com “Suspeitos” é muito boa, porque é um infantil que não cai na chatice, nem mergulha no coitadismo. É um teatrão para os pequenos, bem produzido e divertido. Não é apelativo apesar do “desenrola-bate” do TikTok, aquilo é um momento que puxa outras coisas, e ainda consegue falar de arte sem virar “palestrinha”. 

Fora isso, o espetáculo carioca é cheio de referências, o que talvez justifique o infantojuvenil como indicação, têm até sacadas que acertam diretamente nos pais. Entre essas, uma me levou a uma investigação: precisava saber os nomes de quem fez as vozes em off na peça (informação que não aparece na sinopse do Festival de Curitiba). Então encontrei provas que confirmaram minhas suspeitas: Diogo Vilela e Antônio Pedro Borges (as mães e os pais devem conhecer os nomes).

“Suspeitos”

O espetáculo faz duas apresentações no festival nos dias 1º e 2 de abril na mostra Guritiba do Festival de Curitiba. No próximo sábado (8) e domingo (9), será apresentada a peça “Papelê – Uma aventura de papel”. Para outras informações sobre a programação, visite o site do evento ou clique aqui.

Colaborou Leonardo de Melo Ogassawara.

Leonardo de Melo Ogassawara com o elenco de “Suspeitos”. (Foto: Luciana Nogueira Melo/Plural)

Sobre o/a autor/a

1 comentário em ““Suspeitos” escapa dos crimes comuns no teatro para crianças”

  1. Iderley Alexandretti

    Oi, permita-me discordar mas a peça por ser da mostra principal poderia ser melhor, levo minha filha desde os dois anos (ela tá com 8 hoje) e frequentei muita peça infantil no Lala, no Zé priguiça, no teatro do pia, no barracão encena, no colégio sesi, no Regina Vogue e por aí vai e esta “suspeitos” minha filha olhou pra mim e disse: “vamos embora, tá chato”.
    Um zorra total infantil num palco, humor fraco, roteiro mais fraco ainda, não vi as crianças rirem. Tem grupos infinitamente melhores que mereciam estar naquele palco bom.
    Palhaço Alípio, madame Virgulina, Triole e por aí vai

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